Novo diz que vai “dialogar”com Lula
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Presidente do Novo, partido que elegeu só três deputados neste ano, Eduardo Ribeiro afirma em entrevista ao GLOBO que a sigla será uma “oposição programática” ao governo Lula, mas que isso não impedirá que ajude a aprovar projetos do presidente eleito desde que sejam “alinhados ao que o Novo pensa”.
O partido ficou retido na cláusula de barreira depois do fraco desempenho eleitoral. Ribeiro culpa pelo fracasso a polarização e a falta de prefeitos e vereadores do partido. A reeleição do governador Romeu Zema (Novo-MG) é algo, no entanto, que comemora, e faz questão de refutar eventual saída do mineiro do partido, já avaliando Zema como um nome competitivo para presidente em 2026, mas não descartando apoiar outra candidatura de direita.
O partido, que tem 31 mil filiados, agora busca ampliar o número de vereadores, atualmente 30, nas eleições de 2024 e estruturar coligações, tanto para o pleito municipal, quanto para o geral de 2026.
Como o senhor avalia o resultado do Novo nas urnas?
Não fomos bem no Legislativo. Tínhamos uma expectativa de crescer as bancadas estaduais e a federal. Não foi o que aconteceu. Fomos vítimas da polarização. Mas conseguimos uma ótima reeleição em Minas Gerais com o governador Romeu Zema no primeiro turno, que se consolida como uma grande liderança nacional.
Qual foi o erro do partido?
Todos os partidos que optaram por não entrar na polarização logo no primeiro turno sofreram do mesmo mal. Agora é trabalhar para reconstruir as bases. Eu atribuo também como um erro estratégico do partido no passado de não ter expandido nas eleições municipais de 2020. Acabamos ficando sem base. Pensando no futuro, uma das nossas estratégias é tentar uma grande capilaridade para as eleições de 2024, já pensando também nas eleições de 2026.
E qual vai ser a estratégia do partido para conseguir aumentar o número de prefeitos ou vereadores?
Ficamos surpreendidos com a quantidade de pessoas se filiando e nos buscando para ser candidato a vereador e a prefeito. O Novo passou por um processo nos últimos dois anos de perda de filiados e nos últimos dois meses conseguiu segurar (O partido estava perdendo filiados desde junho de 2019, quando tinha 47 mil filiados. Em agosto de 2022, registrou 30,5 mil filiados, e atualmente está com 31 mil).
Houve desfiliações após a declaração de João Amoêdo de que ele votaria em Lula para presidente?
Houve, mas temos desfiliações desde sempre. Não teve picos de desfiliações.
E como o senhor vê a suspensão do João Amoêdo?
Como sou membro do diretório nacional, que é o órgão recursal se o João eventualmente vir a ser condenado e recorrer, eu vou ter que julgar. Então ficaria imprudente fazer um comentário (sobre a suspensão). Mas o João se afastou muito do partido. Ele adotou um tom de comunicação que acabou desagradando muita gente no partido. A impressão que se passava é que ele fazia uma oposição ao próprio partido e isso afastou ele dos dirigentes. O problema nunca foi fazer oposição ao (presidente Jair) Bolsonaro, muitas pessoas do partido faziam. A reação das pessoas, dos lideranças do partido, dos mandatários, não foi única exclusivamente em função do voto ao Lula. Mas ninguém esperava que ele fosse declarar o voto no Lula, porque parecia incoerente. Ele sempre criticou o Lula e o PT durante todos esses anos no mesmo tom que ele criticava o Bolsonaro. Esperava-se um voto nulo ou algo do tipo. Pegou muita gente de surpresa. Mas certamente foi a gota d’água de um conjunto da obra. Esse desgaste não é de agora, é lá de trás.
O partido havia liberado o voto dos filiados. O senhor avalia que a orientação do Novo então era ou anular, ou votar em branco, ou votar no Bolsonaro?
Hoje nós temos o partido basicamente dividido em duas alas: aqueles que queriam votar no Bolsonaro para tirar o PT e aqueles que não votavam no Bolsonaro, nem em Lula de jeito nenhum. Daí a surpresa de ver o João declarar voto ao Lula, que certamente representa uma porção muito, mas muito pequena do partido. A imensa maioria, quase 100%, ou votou no Bolsonaro ou anulou o voto.
Tanto o Novo como o PSDB, que defendem o liberalismo econômico, diminuíram o tamanho das suas bancadas, enquanto outras siglas da direita cresceram. O liberalismo econômico, atrai votos? Ou uma sigla de direita no Brasil precisa dessas bandeiras morais para conseguir eleitores?
Ainda vamos precisar acompanhar o decorrer dos próximos anos para entender um pouco melhor o cenário. Mas acho que existe espaço para o liberalismo. Não vamos abrir mão do que defendemos por causa de uma questão conjuntural de uma eleição. É um projeto de longo prazo.
Há quem avalie também que essa redução do Novo e do PSDB se deu por conta desse vínculo entre deputados ou filiados com o bolsonaroismo, O que o senhor pensa disso?
Todo mundo tem sua própria narrativa. Agora você vê também até mesmo lideranças e candidatos do Novo que saíram do partido com esse diagnóstico, também não se elegeram. Então acredito que não tinha espaço mesmo. Não tinha espaço para, em eleição tão popularizada, querer construir algo que fosse critico aos dois (Lula e Bolsonaro).
O partido não ultrapassou a cláusula de barreira e, apesar de não usar o fundo eleitoral, o Novo vai ficar sem o tempo de TV e sem espaço para debates. O Novo avalia se fundir a outro partido para voltar a ter esses recursos?
Não, não está nos planos fazer uma fusão. Nós entendemos a necessidade de outros partidos acabarem se fundido, mas entendendo ser mais para uma questão de financiamento de fundo partidário que não é algo que impacta o Novo. Os nossos filiados e doadores mantêm uma contribuição por mês que consegue manter o partido. Com relação ao tempo de TV e espaço para debates, isso de fato é um impacto. Mas eu acho que nós quebramos um dogma no partido que foi a coligação em Minas Gerais. Esse modelo pode ser transportado para as eleições municipais e para as eleições de 2026, para que nós possamos ter tempo de TV e espaço nos debates.
Qual será a relação com o governo Lula?
O Novo já se colocou como oposição, deixando claro que não é uma posição sistemática, é uma oposição programática. Dado que o PT é muito diferente do Novo a tendência é discordarmos de muita coisa. Só que evidentemente se vier algo que concordemos, não vamos fazer oposição, vamos ajudar a aprovar, porque o Brasil está acima de qualquer diferença.
Então vai haver uma possibilidade de diálogo com o governo Lula?
É difícil falar que não vai haver diálogo porque parece que você está fazendo uma oposição sistemática. Vai depender muito da situação na Câmara, mas é evidente que se vier qualquer projeto alinhado ao que o Novo pensa, uma boa reforma tributária por exemplo, não vamos fazer oposição, vamos trabalhar para que isso aconteça.
O senhor falou que Romeu Zema saiu fortalecido dessa eleição. Ele é um nome competitivo para disputar a presidência em 2026?
Certamente. Não é fácil ganhar uma eleição em Minas Gerais, ele fez um ótimo governo e conseguiu construir uma coligação que lhe dará um apoio na Assembleia, que nós não tínhamos. E Zema já declarou abertamente que fica no partido e vai ajudar o Novo se reerguer no Legislativo. E agora não existe a menor possibilidade de irmos para uma campanha majoritária nacional de novo sem uma coligação. E aí vai depender das costuras com outras lideranças que queiram aglutinar. Existem outras lideranças do campo da direita, da centro-direita, que também saíram fortalecidas dessa eleição. Tem o Tarcísio (de Freitas, eleito governador de São Paulo), tem o (Sérgio) Moro (eleito senador pelo Paraná), tem o Eduardo Leite (reeleito governador do Rio Grande do Sul) que devem em algum momento sentar para conversar.