Dino quer segurança da capital federal como a dos EUA
Foto: Isaac Amorim/MJSP
O governo Lula pretende encaminhar ao Congresso várias medidas, chamadas de “Pacote da Democracia”, em resposta aos atos terroristas em 8 de janeiro. Entre as propostas, elaboradas pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, está a criação de uma Guarda Nacional permanente para proteger os prédios públicos federais de Brasília, o que provocou críticas de parlamentares, ex-autoridades do DF e especialistas.
A criação do efetivo será encaminhada em uma proposta de emenda à Constituição (PEC). O texto prevê a transformação da Força Nacional em Guarda Nacional, que terá a função de proteger os prédios da Esplanada e edifícios como os palácios da Alvorada e do Jaburu, além de sedes de ministérios que ficam fora do Eixo Monumental. Atualmente, a atribuição é da Polícia Militar do DF, mas a corporação está sob desconfiança do governo federal pela falha em conter os radicais que depredaram prédios dos Três Poderes.
O entendimento no governo é que houve sabotagem do comando da Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF), então chefiada por Anderson Torres — atualmente preso em um batalhão da PM no Guará. Segundo o ministro da Justiça, Flávio Dino, o relatório sobre os atos extremistas, a ser apresentado hoje pelo interventor federal, Ricardo Cappelli, mostra que não houve nenhum tipo de planejamento para conter os ataques.
Em coletiva de imprensa no Palácio da Justiça, Dino frisou que o governo não defende a federalização da segurança pública do DF, uma das medidas discutidas após o ataque. “A simetria que nós buscamos é muito similar ao que acontece em Washington D.C., onde você tem a convivência de uma polícia com a atuação de forças federais, por ser a capital dos Estados Unidos”, afirmou. “Aqui, do mesmo modo, essa Guarda Nacional ficaria restrita, segundo a nossa proposta, à atuação em algumas áreas do Distrito Federal, e o restante da segurança pública continuaria com o GDF”, acrescentou. Ele disse, porém, respeitar as propostas nesse sentido que tramitam no Legislativo e que a decisão caberá aos parlamentares.
Apesar da declaração de Dino, o alerta se acendeu em Brasília. O senador Izalci Lucas (PSDB) é um dos que discordam da medida. Na avaliação do parlamentar, as forças de segurança do DF já demonstraram, em outras ocasiões, que conseguem lidar com manifestações. “Criar uma Guarda Nacional para cuidar dessa estrutura no DF, acho um absurdo. Independentemente da circunstância, sempre vai precisar da atuação das forças de segurança do DF quando houver grande circulação de pessoas na Esplanada”, criticou. “Por mais que tenha a Guarda (Nacional), vai precisar do apoio do GDF. O Fundo Constitucional foi criado para isso, é a capital da República.”
O senador apontou que houve falhas generalizadas nos ataques. “Houve erro do governador? Houve, mas não justifica (a criação da Guarda Nacional). Não foi também só uma falha do GDF. Não faltou gente errando na parte de inteligência no GDF, nas Forças Armadas, na Abin (Agência Brasileira de Inteligência), no governo federal. Houve erro por todo o lado”, destacou. O parlamentar enfatizou que lutará incondicionalmente contra uma eventual alteração no Fundo Constitucional, caso a PEC tente modificá-lo.
Para o ex-secretário de segurança pública do DF e sociólogo Arthur Trindade, a regularização da Força Nacional é uma ação bem-vinda e necessária para o país, já que a instituição funciona apenas por decretos e portarias e paga os membros, cedidos pelos estados, por meio do Fundo Nacional de Segurança Pública em forma de diárias — nas palavras dele, uma organização importante, mas “frágil e cara”.
Na avaliação dele, porém, a destinação da Guarda Nacional não é necessária, porque a PMDF tem histórico de efetiva proteção dos Três Poderes. “Não me parece razoável destinar essa nova polícia para guardar a Esplanada. A PMDF tem duas grandes atribuições: uma é cuidar das cidades, policiamento ostensivo; e a outra é guardar os ministérios e outros espaços dos Três Poderes”, defendeu.
Segundo Trindade, “a corporação tem sempre uma tropa fixa preparada para isso”. “Não deu certo no dia 8 de janeiro porque houve negligência e omissão, mas a polícia tem uma tropa muito competente”, acrescentou.
Governador do DF entre 2015 e 2019, Rodrigo Rollemberg também defendeu que a proteção proposta por Dino já é cumprida, com excelência, pela Polícia Militar. “Entendo, como ex-governador, que a PMDF tem condições de garantir a segurança dos prédios públicos e das sedes dos Poderes da República, como sempre fez ao longo da história”, pontuou. “Tenho condições de dizer que a PMDF, bem comandada, tem condições de manter a ordem na área central de Brasília.”
O especialista em segurança pública Leonardo Sant’Anna também avaliou como positiva a atuação da PMDF em defender os Três Poderes e sugeriu uma reflexão ao governo federal sobre a real necessidade de uma nova polícia. “É preciso avaliar se realmente é necessário a criação da Guarda, dado ao histórico da PMDF, que não é arranhado. Historicamente, a polícia da capital já possui um batalhão diplomático e outras divisões que cumprem o objetivo”, opinou.
A solução, então, seria investir nas forças de segurança. “Se é preciso desse reforço, porque não trazer mais profissionais para uma instituição já existente, uma vez que o próprio Ricardo Cappelli (interventor federal) fez visitas às sedes da corporação e constatou que existe bastante capacidade nas polícias do DF?”, destacou.
As propostas foram redigidas pela equipe técnica do ministério e entregues por Dino, ontem, ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em reunião fechada no Palácio do Planalto. Os textos serão apreciados pelo chefe do Executivo, e o governo pretende enviá-los ao Congresso já em fevereiro, após o retorno das atividades legislativas.