Procurador bolsonarista defende golpe abertamente
Foto: Reprodução
Protagonista de um vídeo com ataques às instituições e ao sistema eleitoral compartilhado por Jair Bolsonaro na noite desta quarta-feira, Felipe Marcelo Gimenez, procurador no Mato Grosso do Sul, tem histórico de proximidade com a família do ex-presidente. Em 30 de maio de 2021, por exemplo, Gimenez participou de uma transmissão ao vivo conduzida pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro. No encontro, o procurador foi apresentado pelo filho de Jair como “provavelmente a pessoa que mais entende” de temas como “urnas eletrônicas” e “voto auditável”.
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O vídeo compartilhado no Facebook por Bolsonaro — que acabou apagado cerca de duas horas depois, já em meio às repercussões sobre o conteúdo — foi postado dois dias depois dos ataques aos três Poderes por apoiadores do ex-presidente em Brasília. O material recuperava uma entrevista concedida por Gimenez a uma rádio sul-mato-grossense após o resultado do segundo turno da disputa presidencial. Na ocasião, ele afirmou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi “escolhido pelo serviço eleitoral e pelos ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral” e levantou dúvidas sobre a lisura do pleito, prática recorrente no histórico do procurador.
No Twitter, onde soma 17,5 mil seguidores, e no Instagram, plataforma na qual 10,3 mil usuários acompanham suas postagens, Gimenez faz menções ao ideólogo Olavo de Carvalho e tem como um dos assuntos favoritos o estímulo à descrença no sistema eleitoral. “A ordem institucional foi destruída pelo Judiciário eleitoral e constitucional. A prevaricação do Senado sustenta o estado de anomia. O regime democrático foi extinto. O povo não tem poder para escolher representantes. Apenas a Força pode restabelecer os princípios. Não se omitam”, escreveu no dia 19 de dezembro.
Já em 12 de novembro, Gimenez conclamou bolsonaristas a “permanecerem na frente dos quartéis”. Uma semana antes, diante da falta de evidências sobre fraudes nas urnas eletrônicas, o procurador alardeou: “Nós, o povo, não temos que provar nada! Quem escondeu a contagem dos votos que deve provar que não roubou!” No mesmo dia, ele também fez a seguinte postagem de teor golpista: “O sistema vai cair! Continuem pressionando! Não parem! Agora não tem mais volta! Engrossem o movimento!”.
Nos últimos dias, Gimenez vem concentrando a artilharia na prisão de bolsonaristas radicais envolvidos com os atos terroristas na capital federal. “O campo de concentração em Brasília é tortura. Prisão de pessoas que estavam acampadas em área pública, o que não é crime nem na Coreia do Norte. A ditadura da foice, martelo e picaretas não tem limites”, disse na segunda-feira seguinte à invasão e depredação do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e da sede do Supremo Tribunal Federal (STF).
O procurador compartilhou ainda um vídeo com um trecho do programa apresentado pelo ultraconservador Tucker Carlson nos Estados Unidos. Ao tratar do episódio em Brasília, a atração de extrema-direita propagou informações falsas sobre duas supostas mortes no ginásio da Polícia Federal para onde cerca de 1.200 extremistas foram levados. Não há nas redes de Gimenez nenhuma crítica ou recriminação sobre as cenas de vandalismo e violência vistas na Praça dos Três Poderes.
Nesta quarta-feira, o portal “G1″ revelou que Gimenez é investigado pela Corregedoria da Procuradoria-Geral do Estado (PGE) do Mato Grosso do Sul por conta do compartilhamento de informações falsas e ataques ao sistema eleitoral. “A PGE esclarece também que o procurador Felipe Gimenez não representa e não fala em nome da PGE e que não ocupa nenhuma função ou cargo de chefia, nem tem assento no Conselho Superior eleito ou qualquer outra instância deliberativa da Instituição”, informou o órgão ao site. Procurado pelo GLOBO, o procurador não respondeu ao contato.
Especialistas ouvidos pelo GLOBO acreditam que Bolsonaro pode enfrentar problemas na Justiça por ter compartilhado o vídeo da entrevista do procurador. As hipóteses vão desde a incitação a outras infrações até crime contra a honra. Essa avaliação, no entanto, não é unânime. Alguns dos juristas consultados consideram que não há um crime específico na postagem, apesar de contribuir para um cenário de instabilidade política.