Decisão de Moraes desmoraliza Justiça Militar
Foto: Rosinei Coutinho/STF
A determinação do ministro Alexandre de Moraes de transferir ao Supremo Tribunal Federal (STF) os julgamentos de militares eventualmente envolvidos nos atentados que culminaram com a depredação da sede dos três poderes provocou indignação na Justiça Militar.
A decisão deve fazer com que pelo menos oito apurações preliminares que estavam sendo feitas pelo Ministério Público Militar (MPM) devem ser transferidas para o Supremo, de acordo com fontes ouvidas reservadamente pela equipe da coluna. Esses casos tramitam sob sigilo.
Para integrantes do STM e do MPM ouvidos pela equipe da coluna, a decisão de Moraes é uma “afronta”, por demonstrar que o Supremo não confia na Justiça Militar. “Está um clima de velório”, resumiu um observador.
A decisão de Moraes foi uma resposta a um pedido da Polícia Federal, que indicou possível participação e omissão de militares do Exército Brasileiro, responsáveis pelo Gabinete de Segurança Institucional e pelo Batalhão da Guarda Presidencial (BGP).
Em sua decisão, Moraes disse que cabe ao STF cuidar dos inquéritos que investigam os crimes de abolição do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, atos terroristas, ameaça e incitação ao crime. “A competência do Supremo Tribunal Federal não distingue servidores públicos civis ou militares, sejam das Forças Armadas, sejam dos Estados (policiais militares)”.
“A Justiça Militar não julga crimes de militares, mas sim crimes militares. Nenhuma das hipóteses definidoras da competência da Justiça Militar da União está presente nessa investigação”, escreveu Moraes.
Não é a interpretação dos integrantes da Justiça Militar ouvidos pela equipe da coluna.
“O Planalto é área sob jurisdição militar. Portanto, o militar do Batalhão da Guarda Presidencial que foi omisso na preservação do patrimônio público cometeu um crime militar”, disse à equipe da coluna um integrante do MPM. “No mínimo, Moraes não confia na Justiça Militar. É uma afronta.”
Para um ministro do STM, a decisão de Alexandre de Moraes deixa um duro recado para a Justiça Militar.
Um magistrado com bom trânsito na Praça dos Três Poderes resume assim a situação: “Moraes suprimiu a competência da Polícia Judiciária Militar para investigar. Eles (o STF) não gostam da Justiça Militar, e não confiam nela”.
Na avaliação de um interlocutor de ministros do STM, a decisão de Moraes também reverbera o antigo incômodo de magistrados civis com a própria existência de uma Justiça Militar, que parte dos integrantes da Justiça civil consideram imprópria.
O deslocamento da competência, na avaliação destes magistrados, esvazia o tribunal e reforça, indiretamente, os argumentos para o fim desse ramo da Justiça.
Além disso, especialistas em direito militar avaliaram sob reserva que não há jurisprudência de crimes potencialmente cometidos por militares no 8 de janeiro no STM. Isso porque os crimes de golpe de Estado, terrorismo e abolição violenta do Estado de Direito não são previstos no Código Penal Militar.
A crise de confiança em relação aos militares, no entanto, não é exclusiva do Supremo. A suspeita de omissão e até de sabotagem na proteção do Palácio do Planalto no 8 de janeiro levou à demissão do comandante do Exército, Júlio Cesar de Arruda, e a uma série de exonerações no Gabinete de Segurança Institucional (GSI).