Garimpeiros fazem debandada desesperada de terras yanomamis

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Foto: Reprodução

Garimpeiros que atuavam ilegalmente na Terra Indígena Yanomami, em Roraima, tentam deixar o local, sem sucesso. À coluna, dois deles afirmaram que o clima é de desespero —causado pela falta de transporte, de informações e, agora, também de comida.

Pessoas que trabalhavam na região e desistiram de esperar por resgate ou algum meio de transporte estão andando pela floresta para tentar chegar até Boa Vista (RR). A distância percorrida varia, já eles estão espalhados em 400 pontos. Muitos pedem socorro.

“Tem gente querendo ajudar, mas não vai porque tem medo de ser pego”, conta um dos interlocutores da coluna, que enviou áudios de duas pessoas que estão em áreas de garimpo. Nenhum deles será identificado por medo de retaliação.

Eles afirmam que, no grupo do qual fazem parte, há muitas mulheres que trabalham no apoio à atividade no local —e não diretamente no garimpo ilegal.

Nas últimas semanas, o governo federal anunciou o controle do espaço aéreo, a maior presença de agentes públicos e uma operação de retirada de garimpeiros da terra yanomami, que ainda não tem data confirmada oficialmente.

Essas medidas levaram a uma mobilização de invasores do território —alguns deles acreditam que a operação já começou e fazem críticas. Essa operação [do governo] está sem pé nem cabeça. Eles tinham que primeiro anunciar um prazo de retirada, permitir a saída do garimpeiro, porque tem locais que são de difícil acesso, que nem varação consegue fazer.”

Na região, o termo varação significa a saída, a pé, pela floresta —a viagem dessa forma a caminho de Boa Vista é cercada de riscos e pode durar até quatro semanas, segundo apurou a coluna.

Onde fica a terra Yanomami - Arte/UOL - Arte/UOL

Os garimpeiros afirmam ainda que não têm recursos para alimentação em viagens tão longas e que muitos dos que atuam na região estão com malária.

Sem aeronave, sem comida para o povo, se não tomar uma atitude, vai morrer muita gente. Tem de mandar [voo] em cada clareira para tirar os garimpeiros.”

O nome mais cobrado por eles é o do governador de Roraima, Antônio Denarium (PP), que sempre se manifestou a favor da atividade de garimpo, teve voto de garimpeiros, mas agora teria “largado” o grupo no meio da selva. Um dos homens que enviou áudio à coluna cobra que o Estado “monte uma logística” com o governo federal.

Em nota, o governador de Roraima afirma que relatou a situação a ministros e “propôs ao governo federal que o auxiliasse no apoio para garantir a saída desses trabalhadores que se encontram em área de garimpo e que escolheram sair daquela região de forma espontânea e pacífica.”

O UOL procurou o Ministério da Defesa e aguarda retorno.

Quem tinha mais recursos deixou a área antes da criação da zona de exclusão de voos, que impede a chegada de aeronaves clandestinas. Além disso, com a alta da procura, o preço dos voos legais explodiu na região.

Já quem teve acesso a barcos tem feito viagens pelos rios, mas em embarcações superlotadas —e nem todos conseguiram uma vaga nesse tipo de transporte.

“O garimpeiro também é ser humano, ou é só índio [sic] que é que é, e o garimpeiro não?”, questionou um deles. Outro diz que a situação “a cada momento piora”. Ele relata que 50 garimpeiros “entraram em desespero” e decidiram caminhar até a capital de Roraima.

A palavra índio era usada pelos colonizadores portugueses para se referirem de forma genérica à população nativa do que é hoje o território americano. Já indígena quer dizer originário e rompe uma ideia depreciativa associada ao termo índio, segundo explicou ao UOL Daniel Munduruku, doutor em educação pela USP e pós-doutor em linguística pela UFSCar.

Além da distância, outro problema, segundo ele, é que pode haver conflitos entre garimpeiros e indígenas. O homem cita a passagem dos fugitivos pela Serra do Querosene onde, de acordo com ele, há indígenas isolados que já enfrentaram garimpeiros. “É uma tragédia anunciada.”

Uol