Tarcísio não nomeia líder radical na Alesp como queria Bolsonaro

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Foto: Taba Benedicto/Estadão

Em entrevista realizada no primeiro turno da eleição, o então candidato Tarcísio de Freitas prometeu a liderança de seu governo na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) a Altair Moraes (Republicanos). “Você já viu que não é segredo para ninguém que você vai ser meu líder de governo”, disse ao deputado em sabatina da Rádio Guardiã, em 2 de setembro. O parlamentar foi líder da sigla na Casa e representa uma ala mais próxima ao bolsonarismo raiz no partido. Altair, que também é pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, reforçou na mesma ocasião que assumiria o cargo, mas o governador recuou da promessa.

Após eleito, Tarcísio nomeou à liderança um deputado do Republicanos considerado moderado pelos pares, que não compunha o grupo mais influente do legislativo paulista e é figura popular na TV: Jorge Wilson, 59, o Xerife do Consumidor.

A mudança surpreendeu inclusive aliados que esperavam a nomeação de algum deputado mais consolidado no partido, que acumulasse experiência no trabalho de articulação ou maior proximidade com a Universal, que tem o Republicanos como seu braço político.

A escolha do novo líder foi tomada como um aceno ao centro de Tarcísio. O governador se equilibra entre a ala mais radical do bolsonarismo, que ajudou a elegê-lo, e o grupo de quadros do Centrão.

Ao Estadão, pessoas próximas de Tarcísio argumentam que a escolha de Wilson foi acordada com o presidente da sigla, o deputado federal Marcos Pereira. Também justificaram que o convite foi feito a Altair, mas que o deputado teria recusado para trabalhar internamente pelo partido e pela possibilidade assumir o cargo de liderança da legenda na Alesp.

Procurado, Altair Moraes disse apenas que pediu “um tempo ao governador” em relação ao comando do governo na Alesp.

Pelo tamanho da bancada, o Republicanos não ganharia espaço na negociação pela Mesa Diretora, e o avanço do PSD de Gilberto Kassab sobre posições-chave no governo coloca pressão para uma liderança forte do governo na Alesp.

Ainda assim, o partido avalia que deve permanecer com a vice-presidência da Casa. O nome mais cotado ao posto é o de Gilmaci Santos, atual líder da bancada. O movimento, assim, libera a liderança da legenda para Altair assumir.

Questionado se sua nomeação “blinda” Tarcísio da ala ideológica, Wilson alega que o governador não quer se despir do “bolsonarismo raiz”. Segundo ele, Tarcísio “não nega a sua origem” e vai precisar atender a todos os espectros políticos.

Wilson é católico e tem em seu gabinete como assessor o pastor Jefferson Julião, da Assembleia de Deus do Brás, onde Tarcísio esteve presente com o ex-presidente Jair Bolsonaro no segundo turno da campanha. O novo líder diz não ter pleiteado o cargo e atribui a indicação à relação que construiu na Casa. “Alguns deputados falaram do nosso nome. Quando sinalizaram, o governador entendeu e fez esse convite”, disse, pregando “diálogo democrático e suprapartidário” na Alesp.

O nome de Wilson não encontra forte resistência na nova bancada. Tomado pelos pares como um deputado de diálogo, ele circula bem na Assembleia, é carismático, tem poucos embates acumulados com outros parlamentares e defende a relação de sua atuação política com seu trabalho na TV.

Por outro lado, enfrentará desafios para aprovar projetos mais sensíveis na gestão. Apesar da maioria de 60 parlamentares que devem fazer base ao governo – dos 94 eleitos – temas como a desestatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) são vistos com cautela na Alesp. Ao Estadão, Wilson afirmou que o projeto depende de um estudo técnico que comprove melhora do serviço e benefício para o consumidor para sair do papel.

Wilson fez fama com o comando do quadro Xerife do Consumidor, do programa Balanço Geral da TV Record, em que é chamado para mediar desde disputas bancárias a brigas de condomínio.

“Problema no elevador gera bate boca”, “Louras de amor! Será que deu certo?” e “Alimentos vencidos, crime contra o consumidor” são alguns dos títulos com milhares de visualizações de seus vídeos no YouTube, que reproduzem cenas do canal.

O período eleitoral o obrigou a se afastar do programa, mas ele planeja retorno em breve e diz que o trabalho na TV “não tem incompatibilidade” com a atuação na liderança. Em terceiro mandato na Alesp, Wilson atuou principalmente com a proposta de pautas em defesa do consumidor, e criou escritórios em pontos da grande São Paulo, onde diz levar o atendimento à ponta.

Wilson tem longa trajetória política e argumenta que sua atuação na TV nunca teve objetivos eleitorais. O atual deputado foi candidato em seguidas eleições desde 2004, quando tentou ser vereador pelo PP, em Guarulhos Em 2006, concorreu a deputado estadual e declarou um patrimônio de R$ 604 mil. Ele voltou a tentar ser vereador em 2008 e depois deputado federal em 2010, sempre pelo PP. Após passagem pelo PSD, só foi eleito em 2014, quando estava filiado ao PRB (antigo Republicanos) e assumiu na urna a alcunha de Xerife do Consumidor. Entre 2009 e 2014, chefiou o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Procon-SP.

Em 2016, também tentou ser prefeito de Guarulhos, segundo maior município de São Paulo, que virou seu reduto político. Os laços que possui na cidade lhe renderam uma boa relação com o atual prefeito, Gustavo Costa (PSD), o Guti, que aparece ao seu lado em repetidas ocasiões e entregas na cidade.

Wilson diz não influenciar o primeiro escalão do secretariado do município, e nega que tenha indicado a filha, Vanessa Aldrey, ao cargo que hoje ocupa na Subsecretaria de Políticas para Mulheres, com salário bruto de R$ 15,5 mil, segundo o portal da transparência do município. “Ela trabalha e continua trabalhando. Se é cargo de comissão ou não, é prerrogativa do prefeito, se está lá é porque merece estar trabalhando”, afirmou.

Já os filhos do deputado seguiram a carreira do pai. Jorge Wilson Filho (Republicanos) também atua na área de defesa do consumidor e é vereador em São Paulo – assumiu o cargo após a nomeação de Sonaira Fernandes (Republicanos) para a Secretaria de Políticas para a Mulher; e Johnny Willian é apresentador de TV.

O perfil combativo, ao menos na TV, o aproximou do deputado federal Celso Russomanno, também do Republicanos, que se projetou na política com quadros parecidos no SBT e na Record. Russomanno esteve em eventos públicos ao lado de Tarcísio principalmente ao longo do segundo turno da campanha, período em que também se intensificaram as divulgações de Wilson a favor do então candidato.

Russomanno foi o maior doador individual de campanha do novo líder de governo, com R$ 320 mil transferidos, e esteve com Wilson em reuniões oficiais na Secretaria da Justiça de São Paulo. O novo líder nega que o deputado federal influenciou a escolha de Tarcísio.

 

Sua candidatura também foi uma aposta do Republicanos. O diretório nacional enviou R$ 500 mil para bancar a campanha, segundo maior valor transferido entre os deputados estaduais eleitos pelo partido em São Paulo. Ele ainda recebeu outros R$ 346 mil do diretório estadual da legenda. O atual patrimônio declarado de Wilson é de R$ 2,2 milhões.

A campanha milionária lhe rendeu dois pareceres contrários à aprovação de suas contas assinado pela Coordenadoria de Contas Eleitorais e Partidárias do Tribunal Regional Eleitoral em São Paulo e deferidos pela Procuradoria Regional Eleitoral. O órgão detectou gastos eleitorais irregulares que ultrapassam R$ 444 mil reais, 46,6% das despesas contratadas em campanha. A área técnica afirma que o candidato não apresentou informações de prestadores, como o contrato de prestação de serviços e comprovantes de pagamentos. Wilson diz que toda a documentação solicitada foi juntada em tempo hábil e que acredita na decisão e na “transparência da justiça”.

Estadão