Tornozeleira eletrônica é ineficaz
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As investigações da Policia Civil do DF sobre a tentativa de explosão de uma bomba no Aeroporto de Brasília, na véspera de Natal, teve como um dos executores Wellington Macedo de Souza, bolsonarista que foi assessor do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos na gestão da atual senadora Damares Alves (Republicanos-DF). Souza, que já se tornou réu na ação penal que apura a tentativa de atentado, segue foragido, apesar de, na época, usar a tornozeleira eletrônica, equipamento que, em conjunto com imagens de segurança, confirmou a presença dele na instalação da bomba.
Preso em setembro de 2021, sob a acusação de articular e financiar atos antidemocráticos no 7 de Setembro daquele ano, Wellington de Souza alegou que estava apenas realizando “cobertura jornalística” de forma independente, e acabou solto por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), com a condição de seguir monitorado por tornozeleira.
O caso de Souza evidencia que, mesmo um investigado ou um preso em liberdade condicional, não é monitorado de forma eficaz pelas forças de segurança do país. Diferentemente dos filmes policiais norte-americanos, quando um réu monitorado sai do perímetro permitido, a interceptação não ocorre em tempo real. A lei do Brasil funciona de forma diferente, apontam especialistas.
Segundo o professor de direito penal e conselheiro da OAB/DF Marcus Gusmão, a diferença da realidade do Brasil com o que acontece no cinema se dá em função da legislação brasileira, que diz que o descumprimento de medidas alternativas não configura a prática de crime, o que impede a prisão em flagrante nesses casos.
“No Brasil, isso acontece mais por uma questão legislativa do que técnica, já o sistema adotado nos Estados Unidos é muito eficiente, pois o descumprimento das medidas é crime. Isso autoriza a prisão em flagrante do cidadão que as descumpre. Acontece que, no Brasil, nós não temos a mesma sistemática, a lei daqui diz que, se você descumprir as medidas poderá ter a sua prisão decretada, mas isso depende de análise judicial”, aponta Gusmão.
O professor explica que, quando um preso em liberdade provisória ou qualquer monitorado por tornozeleira eletrônica descumpre as regras de onde pode circular, é gerado um relatório do sistema de monitoramento, que é enviado à Justiça, que cria um novo processo, chamado de incidente, para que essa pessoa apresente sua defesa.
Segundo servidores do Judiciário, mesmo em estados bem equipados, entre o descumprimento do perímetro pelo monitorado, a geração dos relatórios pelos governos estaduais e a criação do “incidente processual” que deve solicitar ao monitorado que apresente defesa, há, em média, um período de dois meses para que o juiz possa decidir sobre a troca de medidas alternativas pela decretação da prisão.
De acordo com os dados da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Distrito Federal (Seape), o órgão monitora, hoje, 1.542 pessoas. Dessas, 460 estão envolvidos com os ataques de 8 de janeiro contra as sedes dos Três Poderes, número que representa cerca de 30% de todos os monitorados do DF. E apenas 12 são naturais do DF.
Com a conversão das prisões realizadas nos acampamentos golpistas pelas medidas alternativas de monitoramento eletrônico, diversos vídeos foram postados em redes sociais com envolvidos retornando aos seus estados e exibindo o equipamento eletrônico como troféu do que chamam de “resistência”. Uma das golpistas, ao voltar para casa, ainda no desembarque do Aeroporto de Cuiabá, gravou um vídeo divulgado nas redes sociais, em que mostra o equipamento e diz que “a guerra não acabou”.
O GDF tem contrato com a empresa UE Brasil Tecnologia para fornecimento e operação de 5 mil dispositivos de monitoramento que custam aos cofres distritais cerca de R$ 12 milhões por ano. O custo de manutenção e gerenciamento dos dispositivos de monitoramento dos 460 golpistas liberados do Complexo Penitenciário da Papuda e da Penitenciária Feminina do DF (Colmeia) ficaram ao cargo do Centro Integrado de Monitoração Eletrônica (Cime), órgão do GDF que instala e monitora dos equipamentos.
Na instalação do dispositivo pelo Cime, é feito o cadastro das áreas em que o monitorado fica autorizado a circular pela decisão judicial, cabendo também ao centro o registro de decisões que alterem essas áreas além da comunicação quanto ao descumprimento dos perímetros estabelecidos.
É do GDF a responsabilidade pela instalação e monitoramento da tornozeleira de Wellington Macedo de Souza, um dos réus no atentado a bomba no Aeroporto de Brasília.
A Seape informou que os contratos de serviços de monitoramento estão disponíveis no site de transparência do órgão e que não comenta casos particulares. A EU Brasil Tecnologia confirmou manter contratos com diversas unidades da Federação, mas informou que, por questões de sigilo, não pode comentar sobre o funcionamento do sistema.