Primeira dama do Acre comprou BMW com dinheiro público
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A Polícia Federal vê ‘indícios robustos’ de direcionamento e corrupção em contrato da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Regional do Acre para ‘decoração natalina’ em Rio Branco, em dezembro de 2020. Segundo os investigadores da Operação Ptolomeu, em sua terceira fase, os valores desviados em tal acerto foram usados para pagar R$ 110 mil de entrada de uma BMW X4 para a primeira-dama Ana Paula Cameli.
A PF crava que está ‘cabalmente comprovado’ o recebimento de R$ 10 mil em propina por Fernando Daniel, então diretor da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Regional do Acre, em troca do direcionamento do contrato de decoração natalina à empresa Atlas.
A empresa que fechou o contrato com o governo do Acre está no centro das investigações da Operação Ptolomeu – no último dia 9, quinta-feira, o Superior Tribunal de Justiça autorizou a terceira fase da operação que põe sob suspeita o governador Gladson Cameli.
Segundo a PF, há ‘quadro de evidente favorecimento’ da Atlas em diversos procedimentos e contratos milionários com várias secretarias estaduais do Acre.
A PF aponta ‘indícios claros de corrupção’ em conversas do representante da companhia com interlocutores que ocupam cargos do alto escalão no governo do Estado – secretários, diretores, presidente de autarquia e outros.
As investigações inicialmente se debruçaram sobre dois contratos que, de acordo com a PF, geraram mais de 70% do total empenhado pelo governo à empresa sob suspeita. Depois, os agentes chegaram ao contrato de decoração natalina.
Os primeiros acertos, com a Secretaria de Infraestrutura e a Secretaria de Educação e Esportes, ‘abriram janelas de oportunidades para que as outras secretarias/órgãos utilizassem o instituto da carona e contratassem a empreiteira sem a realização de certames licitatórios’, narram os investigadores.
A Polícia Federal suspeita do envolvimento de secretários e diretores que integraram as Secretarias de Infraestrutura e Esportes do Acre e foram realocados para os quadros da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Regional e da Secretaria de Saúde, ‘gerando caronas’.
Os investigadores da Ptolomeu explicam como se dava a ‘carona’ citando o contrato de decoração natalina da capital acreana em 2020. A fraude na contratação era operada em seu ‘nascedouro’, ainda na licitação, com o direcionamento do edital para a empresa Atlas.
A Ata de Registro de Preços foi usada no ano seguinte, em dezembro de 2021, pela Secretaria da Casa Civil, a Secretaria de Turismo, uma fundação vinculada ao Acre e pela prefeitura de Cruzeiro do Sul, no interior do Estado, visando a contratação da Atlas para prestação do mesmo serviço, indicam os achados da Operação Ptolomeu.
Assim, segundo a PF, a fraude licitatória levou a Atlas a receber quase quatro vezes o valor do primeiro contrato. “Ficou constatado que somente o contrato 048/2020 – SEDUR/SEINFRA gerou para a empresa ATLAS a dotação de R$ 3.994.030,80, sendo R$ 1.272.962,80 diretamente e R$ 2.271.068,00 indiretamente (através de ‘caronas’)”, assinala a PF.
Os investigadores apontam que tal cenário vai ‘absolutamente ao encontro’ do que afirmou o representante da empresa ao então diretor da Secretaria de Desenvolvimento Urbano em troca de mensagens sobre a planilha de composição de custos para elaboração do edital da licitação. ‘(…) na hora que eu termino as composições aí é show, serve pra todos, entendeu?”, afirmou o primeiro.
Ao detalhar as tratativas mantidas entre o então diretor da Secretaria Fernando Daniel e o representante da Atlas Rudilei Soares de Souza, o ‘Rudilei Estrêla’, a PF cita caso em que o primeiro teria intercedido em favor do empresário na Secretaria de Fazenda do Acre.
Segundo a Operação Ptolomeu, o servidor público obteve informações de que o ‘próprio governador criou o processo de pagamento’ e então informa que haveria a ‘liberação de forma tempestiva’ à empresa.
Para os investigadores, o ocorrido é um ‘denso indício’ de que Cameli ‘tinha interesse direto nas negociações’ que se davam entre Fernando Daniel e ‘Rudilei Estrêla’.
Ainda de acordo com os autos da Operação Ptolomeu, esse mesmo pagamento serviu de lastro para transferência realizada a uma outra empresa de ‘Estrêla’, para liquidar a entrada na BMW X4 – de R$ 520 mil – comprada pelo governador.
A Polícia Federal diz que, no caso, o pagamento do Estado à Atlas foi processado no dia 8 de dezembro. A empresa contratada pelo poder público por sua vez repassa 85% do valor, R$ 310 mil, a uma outra companhia de ‘Rudilei Estrêla’. No dia seguinte, esta faz uma transferência para a concessionária Xapuri Motors, no valor de R$ 110 mil, para cobrir a entrada da compra da BMW.
Os investigadores anotam que a compra do veículo já havia sido detalhada em um relatório anterior da PF, citando ‘provas cabais’ envolvendo o governador, a primeira-dama e a concessionária. No entanto, a corporação observa que ainda havia a lacuna sobre a origem dos recursos usados por ‘Rudilei Estrêla’ para o pagamento da entrada da BMW, em razão de sua empresa não ter receita própria.
“Essa lacuna acaba de ser preenchida com a demonstração de que os recursos utilizados possuem origem direta na contratação da Atlas, por meio de processo licitatório direcionado e execução de pagamentos com interferência direta de Fernando Daniel, com anuência do governador (segundo Fernando Daniel, a ordem para pagar a empresa foi criada pelo próprio Gladson, o que indica inexplicável urgência e prioridade no trâmite do procedimento)”, pontuou a PF.
Ainda segundo a corporação, poucas horas depois de encontro com o governador, no dia 10 de dezembro de 2020, ‘Rudilei Estrêla’ fez a transferência de R$ 110 mil para sua empresa e cede o crédito em favor da primeira-dama, Ana Paula Cameli.
A representação pela terceira etapa da Operação Ptolomeu cita dados que, segundo os investigadores, demonstram a transferência realizada pela empresa de ‘Estrêla’ para a conta bancária da concessionária e a respectiva cessão dos créditos à primeira-dama, compradora formal do carro.
Quanto a terceira etapa da Operação Ptolomeu foi aberta, no último dia 9, quinta-feira, o governador Gladson Cameli negou vínculos com a organização que se teria apossado de contratos ilícitos em sua administração.
A respeito das ações da Operação Ptolomeu, promovida pela Polícia Federal, o governador do Acre, Gladson Cameli, tem a declarar que:
a. Essa é mais uma etapa da operação de mesmo nome. Com o andamento do processo, o governador confia que tudo será apurado e esclarecido;
b. Mais uma vez, o governador se coloca à disposição das autoridades, colaborando com mais essa etapa das investigações;
O governador reafirma o seu apoio e confiança na Justiça, para que a verdade sempre prevaleça.