Segurança do DF temia mais parada gay que atos golpistas
Foto: Luís Nova/Especial Metrópoles
Documentos elaborados pela Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal antes de manifestações em Brasília apontam planejamento mais firme contra atos LGBTs, passeata estudantil e Marcha da Maconha do que na contenção de protestos antidemocráticos. Orientações sobre a dimensão das ameaças e a condução de possíveis presos, por exemplo, não aparecem no planejamento anterior à tentativa de golpe em 8 de janeiro.
O Metrópoles analisou seis Protocolos de Ações Integradas (PAIs) produzidos pela SSP entre 2022 e 2023, sendo três envolvendo manifestações com pautas que atingem o Estado Democrático de Direito, contra o resultado das urnas, e outras três amparadas pela Constituição. Chama a atenção a ausência de um tópico específico de planejamento nos documentos relativos aos atos bolsonaristas.
Enquanto o PAI de atos públicos com a Marcha da Maconha e Parada Gay contém um campo de “observações diversas”, com orientações sobre o nível da ameaça da manifestação e o que fazer em caso de necessidade de prisões, esse quesito “some” dos protocolos relativos aos protestos contra o resultado das urnas.
Ou seja, o documento de inteligência da SSP que preparou todos os órgãos do Governo do Distrito Federal antes da manifestação de 8 de janeiro não informava a probabilidade de ameaças ou qual o procedimento para encaminhamento de possíveis detidos. Mas até o PAI elaborado para controlar a 23ª Parada do Orgulho LGBT de Brasília, em 3 de julho de 2022, vinha com o alerta de “ameaças de grande impacto”.
Outro exemplo de planejamento mais rígido está no plano para a segurança do 44º Congresso da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), que ocorreu entre 12 e 15 de maio de 2022. O evento reuniu estudantes de ensino fundamental, médio, técnico e pré-vestibular. Os documentos da SSP apontaram “probabilidade de ameaças de impacto mediano, em detrimento das intercorrências verificadas em manifestações anteriormente realizadas no mesmo local e pelo mesmo público previsto”.
Havia também a orientação para condução de “possíveis presos relacionados ao evento” à 5ª Delegacia de Polícia (Área Central). Os estudantes fizeram uma passeata na Esplanada. Outro protesto pacífico no mesmo local foi a “Marcha da Maconha – Planta Livre no SUS”, em 8 de junho de 2022.
Para essa manifestação, a SSP também previu “probabilidade de ameaças de impacto mediano”, citando “intercorrências verificadas em manifestações anteriores de mesma denominação e/ou características”.
A diferença do tratamento da Secretaria de Segurança Pública para os diferentes atos foi percebida pelo deputado distrital Gabriel Magno (PT), durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga atos antidemocráticos. O parlamentar apontou a ausência das observações mais rígidas em manifestações bolsonaristas e questionou o depoente da última quinta-feira (23/3), o ex-secretário da SSP Júlio Danilo.
“Esse tópico desaparece. Não constam essas observações diversas, como qual a probabilidade de ameaça e o que fazer caso tenha prisões. Não me parece que a Secretaria tratou essas manifestações como outra qualquer. Teve uma diferença gritante e flagrante”, afirmou.
Júlio, porém, disse que sempre tratou manifestações de forma igual durante o período em que atuou como secretário. A SSP foi questionada sobre o tema pela reportagem, mas não respondeu. O espaço segue aberto.