Bolsonaristas usam Janja para justificar móveis sumidos
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Em um novo round da guerra de narrativas que mobiliza apoiadores do presidente Lula (PT) e de Jair Bolsonaro (PL), o mobiliário do Palácio da Alvorada se tornou fonte de trocas de acusações entre os dois lados. Petistas acusam o antigo governo de “sumir” com móveis e ter deixado a residência oficial da Presidência em mau estado de conservação. Em resposta, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro rebateu as acusações do governo, e bolsonaristas vêm criticando o gasto de quase R$ 200 mil de Lula com cama e outras peças para o Alvorada.
A controvérsia em torno dos móveis do Palácio começou já na primeira semana da gestão Lula, em janeiro. Na ocasião, a primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, abriu pela primeira vez a residência presidencial após a saída de Bolsonaro e mostrou à GloboNews os problemas de conservação no local.
Nas cenas, foram exibidas infiltrações, janelas quebradas, danos em tapetes e sofás rasgados, entre outras avarias. Ainda na visita, Janja afirmou que em alguns cômodos, como numa sala de estar, não havia móvel algum.
— Ainda não sei dizer o que aconteceu. Se os móveis que estavam aqui eram de propriedade da família e foram levados. Mas, possivelmente, antes havia móveis. Preciso saber onde estão, em que estado estão. Estamos fazendo esse levantamento — apontou Janja em janeiro, acrescentando que não tinham sido encontrados registros dos itens do Alvorada possivelmente movidos ou retirados do palácio.
Três meses após o episódio, veio à tona que o governo federal gastou R$ 196.770 com apenas seis peças de móveis para a decoração da suíte presidencial do Alvorada. Os itens mais caros foram o sofá, que tem um mecanismo para reclinar cabeça e pés, por R$ 65.140; e a cama, por R$ 42.230. Ambas as peças são revestidas de couro italiano 100% natural com tratamento exclusivo para evitar ressecamento, segundo dados obtidos pela Folha de S. Paulo via Lei de Acesso à Informação.
No mesmo dia em que dados sobre a compra foram tornados públicos, a Secretaria de Comunicação (Secom) divulgou que dos 261 móveis do Palácio da Alvorada dados como desaparecidos no início do ano, 83 ainda não haviam sido localizados (32%). O estado precário da residência presidencial foi a justificativa apresentada pelo órgão para as compras feitas pelo novo governo.
Porém, o alto preço dos móveis, considerados de luxo, entraram na mira da oposição. Bolsonaristas passaram a criticar o governo e pedir explicações. Na Câmara dos Deputados e no Senado, requerimentos feitos pelo partido Novo cobram explicações do ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), sobre a compra que ocorreu sem licitação.
Um requerimento protocolado pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE) pediu a convocação de Costa no Senado para prestar esclarecimentos sobre os gastos. Nas redes sociais, o parlamentar bolsonarista usou o caso para ironizar o fato de um governo de esquerda fazer a compra considerada “luxuosa”.
“Toda essa extravagância sem licitação e às custas do pagador de impostos: você! Infelizmente, é uma inversão de valores, uma hipocrisia sem limites para quem diz se preocupar com o social”, diz um trecho da publicação de Girão.
No domingo, foi a vez de Michelle Bolsonaro se posicionar sobre o assunto. Nos stories de seu Instagram, ela afirmou que os móveis pertencentes à União estariam num depósito do Alvorada. Ela disse ainda que só teria retirado itens privados do local:
— Esses móveis estão ou no depósito 5 do Palácio da Alvorada ou no depósito da Presidência. Existem esses depósitos, com várias cadeiras, sofás, mesas, quadros, e você pode fazer esse rodízio. Quando a Marcela Temer me apresentou o Alvorada, em 2018, ela me falou dessa possibilidade e da possibilidade de eu trazer os meus móveis da minha casa e poder utilizá-los no Alvorada.
Michelle buscou ainda reforçar a imagem de que ela e o ex-presidente são “pessoas simples”, umas das estratégias do clã Bolsonaro, dizendo que até os lençóis utilizados durante os quatro anos teriam sido levados de sua casa no Rio de Janeiro.
Ainda na rede social, Michelle não citou nominalmente Lula ou Janja, mas fez uma ironia dizendo que “os que pregam a humildade, a simplicidade, não querem viver no simples”, e que estariam “zombando e brincando com o dinheiro do contribuinte”. Ela termina a publicação propondo ainda uma “CPI dos Móveis da Alvorada”.
O GLOBO questionou a Secom sobre as declarações de Michelle e pediu uma atualização sobre os imóveis do palácio que seguem desaparecidos, mas não houve resposta.