Esquerda é muito menos ativa que direita na internet
Foto: Cristiano Mariz
Além do desafio de conseguir uma base governista no Congresso, o governo Lula 3 se vê diante de um combate ainda mais desfavorável: o poder da oposição no mundo digital. Monitoramento da Genial/Quaest revela que os deputados federais e senadores da oposição são mais influentes nas redes, produzem mais conteúdos e são mais curtidos e compartilhados do que os governistas.
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A pesquisa mostra que, dos dez deputados com poderio no ambiente virtual, oito são bolsonaristas. Nikolas Ferreira (PL-MG) encabeça a lista. O único governista no “top 10” é André Janones (Avante-MG), tido como protagonista da estratégia de redes da campanha do presidente Lula.
No Senado, a oposição ao governo petista é ainda mais forte: os dez nomes com mais força digital são apoiadores de Jair Bolsonaro (PL). Entre eles estão o primeiro colocado, Cleitinho Azevedo (Republicanos-MG), famoso por vídeos com denúncias na internet; e Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do ex-presidente.
O PL, sigla de Bolsonaro, domina as primeiras colocações das listas. Seis dos dez deputados, e cinco dos dez senadores, são filiados ao partido. Das fileiras do PT, a primeira a aparecer no ranking é a presidente da legenda, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), na 27ª posição.
Entre os senadores, o petista melhor posicionado é Humberto Costa (PE), no 14º lugar. Outros governistas bem posicionados são o deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP), em 12º, e o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), em 15º.
O ranking foi elaborado pela Quaest a partir de 152 variáveis — que incluem número de seguidores, curtidas, comentários, compartilhamentos e buscas — coletados de Facebook, Instagram, Twitter, YouTube, Google e Wikipédia. A partir desses dados, o estudo elaborou o Índice de Popularidade Digital (IPD), que mede a relevância virtual dos parlamentares.
Segundo esse indicador, o bloco de oposição na Câmara tem IPD médio de 17,3, enquanto os governistas estão em 15,2. Já no Senado, a diferença é ainda maior: a média do IPD dos oposicionistas é de 23,4, contra 16,9 dos lulistas.
Autor do levantamento, o cientista político e diretor da Quaest, Felipe Nunes, avalia que esses dados apontam para um cenário no qual o governo Lula terá dificuldades de vencer a guerra de narrativas nas redes sociais. Ele acredita que a desvantagem digital pode atrapalhar o governo na comunicação de suas pautas.
— Os governistas têm o desafio de melhorar sua estratégia digital, montar estruturas e canais de distribuição de seus conteúdos. Porque, se a oposição resolver atacar o governo nesse ambiente, ele vai ter muita dificuldade em se defender. Imagina todos esses soldados atacando ao mesmo tempo? — questiona Nunes.
Ainda segundo o levantamento da Quaest, uma das principais estratégias dos bolsonaristas para movimentarem suas redes é a criação de polêmicas contra agendas do governo. No período analisado pela pesquisa, entre 2 de fevereiro e 28 de março, a publicação de maior engajamento foi de Nikolas Ferreira, sobre o episódio em que ele usou uma peruca na tribuna da Câmara para fazer uma provocação e um discurso transfóbico no Dia da Mulher.
Nikolas, por outro lado, acredita que o amplo domínio da direita nas redes mostra que o Brasil é de maioria conservadora, alinhada com os princípios e valores desses parlamentares. Além disso, ele se defende da crítica de que usa polêmicas como estratégia:
— Na verdade esse governo que gera polêmica atrás de polêmica. E eu como oposição não posso ficar calado. Se defender a vida desde a concepção, defender que banheiro de mulher tem que ser frequentado por mulher, se tudo isso for ser polêmico, então continuarei sendo polêmico.
A artilharia digital dos bolsonaristas também deve criar problemas para o governo nas comissões parlamentares, onde situação e oposição costumam protagonizar embates. O estudo da Quaest apontou que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a com maior poder da Câmara, possui apenas Janones como governista com força nas redes. Ele terá a tarefa de sozinho tentar equilibrar digitalmente os opositores ao governo da CCJ, que têm forte poder de atuação conjunta na internet.
Janones defende que para a esquerda sair da lona na batalha digital ela precisa rever suas estratégias e começar a atuar de forma organizada e sincronizada no meio digital. Ele argumenta que o governo do presidente Lula ainda não conseguiu fazer com que sua base tenha objetivos em comum nas redes.
— A principal estratégia é centralizar a distribuição de pautas e missões para a militância. Eu fiz isso na campanha do presidente Lula, mas agora é impossível uma única pessoa sozinha fazer isso durante quatro anos de governo. Eu tenho meu mandato e preciso trabalhar, não posso só cuidar das redes — afirma Janones.
Na mesma linha, a pesquisadora de Comunicação Política da PUC-Rio Leticia Capone avalia que a esquerda acaba ficando em desvantagem na guerra digital por trabalhar suas agendas online de forma fragmentada. Já canais da direita e extrema-direita formam ecossistemas que atuam em sincronia, o que facilita a projeção de alcance e a promoção de suas pautas.
— É possível perceber uma articulação e uma coordenação entre tais canais e perfis (da direita), que vai desde um alinhamento de pauta, agenda mais relacionada ao factual, até a projeção de um alvo em comum, que passa a ser tratado, de forma consistente, como inimigo — analisa Capone.