Governo não sabe como se relacionar com blocão de lira
Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
A configuração de forças dentro da Câmara dos Deputados gerou um novo retrato da composição do cabo de guerra que se instalou nas últimas semanas. Na avaliação de políticos e de especialistas, o fato de o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), ter articulado a composição do maior bloco da Câmara, como uma postura de reação à formação do outro blocão há duas semanas, evidencia que o peso de sua mão nas decisões e até no controle da Casa já foi maior.
Lira tomou conta do jogo entre 2021 e 2022 durante o governo Jair Bolsonaro por meio da base do Centrão aliado do ex-presidente, formado por PL, PP e Republicanos. À época, integrantes da oposição (hoje governo) reclamavam que o deputado alagoano ‘tratorava’ a pauta da Câmara para favorecer a gestão de Bolsonaro. Mesmo assim, Lira teve apoio do governo Lula no começo da atual Legislatura e foi reeleito com 464 votos — um recorde —, contando com o apoio de siglas que partiam da esquerda com PT e a Federação PT/ PCdoB/PV até as alas “raiz” e bolsonarista do PL.
Na última quarta-feira, o presidente da Câmara demonstrou seu poder e influência ao formar o segundo bloco partidário — um “superbloco” com 175 deputados federais, o maior da Casa Baixa. O bloco do qual o parlamentar faz parte é formado por PP-União Brasil-PDT-PSB-Solidariedade-Avante -Patriota- e a Federação PSDB/Cidadania. O primeiro blocão se consolidou há duas semanas e, até então, era o maior da Câmara. A composição que aglutinou MDB-PSD -Republicanos-Podemos-PSC soma 142 deputados federais e fez um rearranjo na Casa. Se antes o PL tinha a maior bancada com 99 e a Federação PT/PCdoB/PV ficava em segundo com 81, os dois partidos que mais representavam a polarização Lula-Bolsonaro acabaram ficando para trás e hoje fazem parte do grupo “sem bloco”.
Mais do que uma aliança, regimentalmente a formação dos blocos obriga que as legendas que o compõem funcionem como um partido só. Na prática, isso traz alterações em questões normativas da Casa, como tempo de liderança para fazer posicionamentos em Plenário e orientar votos em proposições Legislativas. No blocão, » TAÍSA MEDEIROS » RAPHAEL FELICE Presidente da Câmara formou o 2º bloco partidário na Casa, o maior da Casa Baixa. O 1º blocão se consolidou há duas semanas, com 142 deputados o escolhido para liderar foi Fábio Macedo (Podemos-MA), no superbloco, o líder foi o governista Felipe Carreras (PSB-PE).
O primeiro bloco formado teve o argumento de “pavimentar governabilidade” do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), disse Carreras na ocasião. O deputado, que é próximo a Lira, reitera que sua missão será a de “promover o diálogo e as pontes entre os diferentes para viabilizar a construção de um projeto de país onde o povo saia ganhando”. “Vamos respeitar as divergências e garantir a governabilidade e a convergência dos Poderes que o país precisa para se desenvolver”, completou, em conversa ao Correio.
Sobre a composição do bloco, Carreras explicou que foi uma construção democrática com as legendas. “O PSB e o PDT são base do governo e se tornaram elementos essenciais para a consolidação do bloco. Foi uma construção democrática. O PSB e o PDT têm uma relação histórica tanto a nível nacional quanto regional, e temos boa convivência com os partidos de centro. Caminhamos com o Solidariedade e com o Avante como aliados de primeira hora pela eleição da chapa Lula e Geraldo Alckmin.
Mas o fato de se tratar de um grande grupo político gera questionamentos de como poderá funcionar, na prática, a negociação com o Executivo. O deputado federal Celso Russomanno (Republicanos -SP), vice-líder do blocão formado pela base de Lula, diz que, por sua experiência, grandes blocos não dão resultado.
“Nunca vi blocos grandes surtirem resultado para o governo, pelo contrário. É muito mais difícil convencer e negociar. É mais fácil negociar com os líderes de cada partido, aí se tem 20, 30 deputados. Desse jeito o convencimento fica muito mais difícil. O consenso já é um negócio totalmente maluco dentro do partido, imagina num bloco heterogêneo como esse”, argumentou. Apesar disso, o parlamentar diz entender a necessidade da criação do grupo, uma vez que a base governista na Câmara não tem tornado possível o andamento das pautas. “Vamos ver se agora com os blocos a coisa começa a andar.”
co”, capitaneado por Arthur Lira no último dia 12, dias após a oficialização do primeiro. A ação foi vista nos bastidores como uma demonstração do medo de perder seu poder de barganha internamente, apesar da excelente votação que o reconduziu à presidência da Casa. Diante das hipóteses ventiladas, Lira chegou a dizer que “se diverte com as narrativas”.
O deputado federal Afonso Motta (PDT-RS), vice-líder do partido e membro do “superbloco”, afirmou, ao Correio, que a formação do grupo tem caráter exclusivamente parlamentar, e que terá função, ainda, de ampliar a governabilidade e isolar os radicalismos. “São mais de 170 parlamentares, que vão garantir mais espaços nas comissões e relatorias de matérias importantes, como pode ser o caso das MPs (medidas provisórias), e garantir uma pauta no Plenário com mais efetividade. Sendo o maior bloco da Câmara, vai contribuir decisivamente para a governabilidade, isolando os radicalismos e as obstruções sem qualquer fundamento”, explicou.
Com receio de que a reação de Lira pudesse travar a articulação com a Câmara, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PT-PR), chegou a procurar os presidentes do PDT, Carlos Lupi, e do PSB, Carlos Siqueira, para sugerir a formação de um bloco de esquerda com o PT. Os partidos acabaram aderindo ao “superbloco”, deixando os partidos dos extremos, como PT e PL sem composição suficiente para lançarem outro grupo.
Os parlamentares não acreditam que a organização dos blocos deve aumentar ou diminuir o poder de Lira. Para o deputado Danilo Forte (União-CE), membro do “superbloco”, o poder do presidente da Câmara é forte de qualquer forma. “Ele é quem determina a pauta, as relatorias mais importantes, ele é que determina o andamento do Congresso Nacional. A qualquer momento também tem uma condicional que é única: só ele que pode abrir um processo de impeachment. O poder do presidente da Câmara não é só em função do quantitativo dos partidos da base ou dos partidos que estão nos blocos de apoio, mas pela própria estrutura do processo legislativo e do poder determinado pela Constituição”, defendeu à reportagem.
Outras duas grandes forças na Casa são o PL, com 99 deputados e a Federação PT/PCdoB/PV, com 80. Apesar de terem ficado para trás na quantidade de parlamentares na Casa Baixa, sobretudo no ano de 2023, os partidos ainda possuem grande poder de influência dentro da Casa. O PL, por exemplo, terá o relator-geral do Orçamento, o deputado Luiz Carlos Motta (PL-SP), enquanto o PT tem o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o deputado Rui Falcão (SP), a mais importante da Câmara
O líder petista na Câmara, deputado Zeca Dirceu (PR), tem um entendimento semelhante ao do deputado Afonso Motta, de que os blocos são rearranjos internos dentro da Casa e que não vão atrapalhar e nem ajudar ao governo ou a qualquer partido.
“Isso não é a favor do governo, não é contra o governo, não é a favor, não é a favor do PL e nem é contra o PL, não é a favor do PT e nem contra o PT. Uma maneira que já é corriqueira que os partidos têm para preservar os seus espaços. Alguns partidos não estavam satisfeitos com o tamanho dos espaços que vinham ocupando”, disse.
“É um rearranjo que tem muito a ver com uma questão mais interna do que com relações externas. A gente teve uma prova hoje de maturidade. Por exemplo, os dois blocos já estão firmados, mas nenhum dois blocos quis se impor regimentalmente, e até poderia fazer, na hora dessa decisão da relatoria do Minha Casa Minha Vida, da relatoria do Bolsa Família, por exemplo”, concluiu Dirceu.
Embora Lira e o grupo de MDB e PSD tenha trocado cortesias e gentilezas após a formação dos grupos, nos bastidores ocorreu uma clara disputa de forças e, sem a aderência do PL e a ida de Republicanos para o blocão, Lira buscou legendas de esquerda, o PSB e o PDT, para conseguir tornar sua formação suprapartidária a maior da Casa.
Quando Lira foi reeleito presidente da Casa Baixa com 464 votos, em um megabloco que reuniu desde partidos de esquerda como PSol e a federação PT/ PCdoB/PV até as duas alas do PL, a “raiz” e a bolsonarista, a votação volumosa na abertura da legislatura trouxe a impressão de que Lira iria matar toda a articulação da Câmara no peito como fez durante sua gestão anterior no governo Jair Bolsonaro.
Apesar de Lira e o governo guardarem uma boa relação, Lula queria reduzir o controle do deputado sobre a Câmara e, com a rejeição do PL e seus 99 deputados a entrar em alas partidárias, o presidente da Câmara precisou correr para permanecer com os dois braços apoiados sobre a mesa.