Ibaneis e general têm versões opostas para 8/1

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Foto: Cristiano Mariz

Alvo de investigações sobre o 8 de janeiro, autoridades do Distrito Federal e do Exército apresentaram versões conflitantes sobre a desmobilização de acampamento que reuniu golpistas em Brasília. Em depoimentos à Polícia Federal, o governador Ibaneis Rocha (DF) e integrantes da Secretaria de Segurança dizem que o esvaziamento das cercanias do Quartel-General foi “frustrada” por militares. Já o então chefe do Comando Militar do Planalto, general Gustavo Dutra, alegou que apenas suspendeu uma operação distrital de repressão ao comércio ilegal.

Por meses, em frente à sede do Exército, apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro fizeram uma vigília. Lá, pediram uma intervenção militar e a anulação das eleições — em meio às barracas, circulavam ambulantes. Do mesmo local, saíram golpistas para os ataques às sedes dos três Poderes.

Em depoimentos à PF, Ibaneis e os coronéis da PM Jorge Naime e Fábio Augusto, então comandante da corporação, relataram que foram impedidos de esvaziar totalmente o local no 29 de dezembro de 2022 — três dias antes da posse presidencial.

A informação foi rebatida por Dutra, em oitiva ocorrido na quarta-feira. Segundo pessoas que acompanharam o depoimento, o general afirmou que a operação citada pelo governador e os oficiais visava apenas a retirada dos vendedores ambulantes do Setor Militar Urbano (SMU).

O militar entregou aos investigadores o Protocolo de Ações Integradas 215/2022, assinado pela Secretaria de Segurança Pública do DF. O documento fala em “ações de enfrentamento ao comércio irregular na Avenida do Exército e Adjacências da Praça dos Cristais”— o local é o mesmo onde foi erguido o acampamento.

À PF, Ibaneis afirmou que foi definida a data de 29 de dezembro para o “procedimento de remoção”. “Mas este foi sustado logo no início por ordem do comando do Exército”, diz transcrição do depoimento do governador. Não há menção à informação de a ação tratar-se da retirada de camelôs.

O depoimento mais incisivo contra os militares foi de Naime, ex-chefe do Departamento Operacional da Polícia Militar (DOP). Ele contou que teve uma reunião com autoridades da secretaria e o general Gustavo Dutra para “efetuar a retirada das pessoas do acampamento”, o que ocorreria antes da posse.

“Posteriormente, chegou a informação que o general Dutra, por ordem do comandante do Exército, havia suspendido a operação”, disse o policial militar, na oitiva. Segundo Naime, ocorreram ainda “outras reuniões com esse objetivo, mas o Exército frustrou todos os planejamentos e tentativas”.

Já Fábio Augusto declarou que a corporação chegou a mobilizar cerca de 500 policiais militares, “mas o Exército entendeu que era melhor fazer essa desmobilização utilizando seus próprios meios”.

À PF, o general Dutra argumentou que suspendeu a operação de retirada dos ambulantes porque o episódio poderia provocar um tumulto às vésperas da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando a tropa já estava sendo mobilizado para o evento de 1º de janeiro.

No depoimento, o militar também relatou que, desde o início do acampamento, o Exército colocou em prática a operação de “sufoco logístico”. As ações, segundo ele, envolviam o veto à entrada de food trucks e uso de “gatos” de energia e água. Também fez questão de frisar que, pouco antes dos ataques, havia apenas 150 pessoas no acampamento. Mas o cenário mudou com a chegada de caravanas no dia 7.

Apesar da restrição de acesso ao Setor Militar Urbano, a Secretaria de Segurança Pública do DF — já sob a gestão de Anderson Torres — elaborou um plano no dia 6 de janeiro que previa que os ônibus se dirigissem à área militar para o desembarque de passageiros.

Em seu depoimento, Torres fez questão de relatar que uma das primeiras ações tomadas por ele como secretário de Segurança Pública do DF foi convocar uma reunião com o então comandante militar do Planalto para discutir a “retirada total do acampamento”. O encontro ocorreu em 6 de janeiro — dois dias antes dos ataques.

Aos investigadores, o general contou que a reunião tratou da primeira etapa do plano: retirar no dia 9 de janeiro as pessoas em situação de rua que estavam no acampamento. No mesmo dia 6, Torres avisou ao general que iria embarcar para uma viagem de férias aos Estados Unidos.

O Globo