Punição (ou falta de) para desembargador desnudará o Brasil

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Foto: Reprodução

O que mais espantou no caso da carteirada que o desembargador paulista tentou aplicar num guarda municipal da cidade de Santos foi a desfaçatez. O doutor sabia que estava sendo filmado. Deu de ombros. Parecia convicto de que, no Brasil, a pior hipótese sempre ganha.

Não há semitons no comportamento do desembargador Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira, do Tribunal de Justiça de São Paulo. Nas palavras e nos gestos do doutor, o inaceitável soa como inaceitável, o sórdido tem cara de sórdido. A estupidez é visual e sonoramente marcada.

A arrogância caricatural do desembargador produziu uma boa notícia. O elogio é algo raro no noticiário. Pois o caso de Santos subverteu a ordem natural das coisas. Chamado de analfabeto no instante em que multava o doutor por não usar máscara, o guarda Cícero Hilário Roza Neto exibiu comportamento de mostruário.

Cícero reagiu à arrogância com moderação. Autor da filmagem, o guarda Roberto Guilhermino também se manteve dentro das fronteiras do manual. Ao contracenar com uma pequena criatura, a dupla de agentes municipais agigantou-se pelo contraste. Impossível não elogiar.

A presença da lente do celular em cenas como a de Santos desperta na sociedade brasileira uma convulsiva fome de consequências. Acabou o brasileiro cordial. A grandeza da vista curta já não é admitida passivamente. Isento de engajamento político ou corporativo, o celular oferece um testemunho da estupidez humana.

Natural que o doutor não estivesse preocupado com a opinião pública. Ao ignorar a filmagem, o desembargador apostou na cumplicidade de sua corporação. Ele é reincidente. Em ocorrência anterior, exibiu sua arrogância falando em francês com o guarda. Sabe que os franceses inventaram o esprit de corps. E não ignora que os brasileiros criaram o esprit de porc.

O Conselho Nacional de Justiça e o Tribunal de Justiça abriram procedimentos para averiguar o comportamento do desembargador. Pela lei, Eduardo Siqueira pode ser enquadrado no crime de abuso de autoridade. Pelo Código de Ética da Magistratura, infringiu o artigo que exige dos magistrados comportamento que dignifique a função.

Os colegas do desembargador não avaliarão apenas se a arrogância dele deve ser punida ou ignorada. O CNJ e o TJ-SP informarão nos próximos dias que país somos.

Uol