Lava Jato investigou 38 mil pessoas
Foto: Denio Simões/Valor
O procurador-geral da República, Augusto Aras, acusou integrantes da Lava-Jato do Ministério Público Federal (MPF) de Curitiba de “bisbilhotar” e investigar ilegalmente 38 mil pessoas que, segundo ele, constam dos arquivos dos investigadores do Paraná. A declaração de Aras ocorreu ontem, durante uma “live” promovida pelo grupo de advogados “Prerrogativas”, que se posiciona contrariamente aos métodos investigativos da operação e de seus desdobramentos em outros Estados.
“O Ministério Público [Federal] em todo o Brasil tem 40 terabytes [de memória de computador], para funcionamento do seu sistema, e a força-tarefa de Curitiba dispõe de 350 terabytes somente para si. E 38 mil pessoas com seus dados lá depositados, ninguém sabe como foram escolhidos, quais os critérios empregados”, afirmou Aras.
“Não se pode imaginar que uma unidade institucional se faça com caixas de segredos, uma instituição da República não se pode servir da extorsão, da bisbilhotice, não pode se valer de nenhum propósito não republicano”, disse o procurador-geral.
Ao falar sobre a atuação dos procuradores, Aras comparou alguns membros do MPF, sem nominá-los, a um “caçador que fica na beira da lagoa para atirar ou flechar a presa, porque a sua natureza é derrubar a presa”. Segundo Aras, é preciso mudar o perfil “punitivista” do Ministério Público. “O MP tem de se modernizar para agir preventivamente (…) quando atua na prevenção na área econômica e do consumidor, pode evitar a paralisação de obras. O programa Destrava Brasil detectou 34 mil obras paradas”, disse o chefe do MPF.
Aras tem enfrentado divisões e forte oposição em diversas alas dos Ministérios Públicos Federais nos Estados. Ele chegou ao cargo por escolha do presidente Jair Bolsonaro e por fora da lista tríplice tradicionalmente elaborada pela entidade de classe de procuradores da República há quase 20 anos, embora não encontre respaldo na Constituição.
O racha no MPF teve seu ápice quando Aras determinou que todos os arquivos de investigações das forças-tarefas de Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro e Distrito Federal fossem compartilhadas com a Procuradoria-Geral da República (PGR) – medida que foi ratificada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A conflagração na instituição foi agravada depois que o procurador-geral mandou publicar edital, em 24 de julho, que pode acabar com a dedicação exclusiva de procuradores que atuam em casos de corrupção. Se for tornada regra, forças-tarefas também terão de participar de procedimentos de outras natureza, acumulados às investigações sobre corrupção.
Indagado durante a “live” pela reportagem do Valor sobre as possíveis consequências do edital, Aras rebateu dizendo que atualmente há “sobras” nas unidades do MPF, referindo -se à disponibilidade de procuradores da República e procuradores regionais da República.
“Hoje temos sobras e o MPF de Curitiba, sozinho, consome recursos equivalentes a 20 outras unidades do MPF na federação”, afirmou o procurador-geral.
Aras disse também que seu foco é “reconstituir a unidade do Ministério Público” e evitar que haja “aparelhamento dessa instituição, já que muitos membros não concordam com esse modo de fazer política institucional”.
Para Aras, o “lavajatismo” é uma “hipertrofia” e “vai passar”.