AGU dá sinal verde a reeleições de Maia e Alcolumbre
Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
O ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), José Levi, defendeu ontem que a reeleição dos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado dentro de uma mesma legislatura é “uma escolha política”, cuja concretização depende exclusivamente do Poder Legislativo. Se acolhido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), esse entendimento possibilita a renovação das presidências de Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP), respectivamente.
O parecer foi encaminhado ao Supremo nos autos de uma ação do PTB contra a recondução. Alguns congressistas dizem enxergar uma espécie de “jogo combinado” entre o governo Jair Bolsonaro e Alcolumbre, que busca respaldo jurídico para se manter no cargo. Por outro lado, pré-candidatos aos cargos afirmaram ao Valor que, mesmo com eventual decisão da Corte nesse sentido, os regimentos internos das Casas manteriam proibidas as hipóteses de recondução.
No documento enviado ao STF, o advogado-geral diz que, por se tratar de questão relativa à organização interna do Congresso, não caberia a interferência de outros Poderes. “Em situações de ausência de normatividade categórica que não envolvam risco para bens constitucionais de primeira grandeza, o Poder Judiciário deve prestigiar a pluralidade de intérpretes institucionais, bem assim a autonomia interna dos Poderes, em nome da conformidade funcional”, escreveu. Segundo ele, a intervenção judicial seria “medida injustificada, não condizente com o sistema de separação de Poderes”.
O detalhamento do parecer já está concluso para análise do relator do caso, ministro Gilmar Mendes. No fim de agosto, o Senado já havia se manifestado no mesmo sentido.
A possibilidade de alterar o regimento interno, embora seja um procedimento muito mais simples do que votar uma proposta de emenda constitucional (PEC) para alterar a Constituição e permitir a reeleição, exigiria um esforço de articulação. No caso da Câmara, pode ser mais complicado, já que parte da base de apoio de Maia tem interesse em concorrer a cadeira dele e as conversas não estão tão avançadas quanto as de Alcolumbre.
O atual presidente do Senado conta com apoio do Palácio do Planalto para ser reconduzido – na avaliação de alguns senadores, isso acabou orientando a manifestação da AGU, classificada como “escandalosa” por Alessandro Vieira (Cidadania-SE).
“Afronta dispositivo constitucional expresso. É lamentável constatar o rebaixamento institucional da AGU, que se coloca a serviço de uma tese personalista e inconstitucional”, disse ele.
O líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), foi numa direção parecida. Na avaliação do senador, o órgão sinaliza que o Planalto não vai se opor à estratégia de Alcolumbre, ainda que isso possa cacifar também a reeleição de Maia, que não conta com o mesmo apoio de Bolsonaro.
“A manifestação da AGU é exatamente o combinado entre eles, pois Bolsonaro escancara mesmo o apoio para que Davi Acontinue avaliando o risco do prosseguimento de Rodrigo Maia”, afirmou.
As críticas à AGU, no entanto, não são unânimes. Em caráter reservado, alguns opositores de Alcolumbre avaliam que o posicionamento não seria exatamente o esperado pelo presidente do Senado. Isso porque, nos bastidores, ele estaria apostando em uma reinterpretação da Constituição, por parte dos ministros do STF, que pudesse bancar sua chance de disputar o cargo novamente, sem necessidade de aprovar uma PEC.
“O parecer da AGU enfraquece a tentativa do Davi de forçar essa decisão do Supremo, pois sinaliza que essa é uma interpretação interna corporis”, disse uma fonte.
O líder do Podemos no Senado, Alvaro Dias (PR), também elogiou o posicionamento da AGU. “É o óbvio, seria interferência indevida de outro poder”, disse. Apesar disso, ele defende que não cabe reinterpretação da Constituição, pois isso “ridicularizaria” o parlamento.
Recentemente, o Senado se posicionou oficialmente sobre o assunto justamente neste sentido, defendendo que a emenda constitucional que permitiu a reeleição a presidente da República, em 1997, só não foi aplicada ao Legislativo por “tensões políticas da época”.
A proibição da reeleição de presidentes da Câmara e do Senado, segundo o secretário-geral da Casa, Luiz Fernando Bandeira de Mello, remonta ao período da ditadura militar, quando um “regime de exceção visava controlar o surgimento de lideranças no Poder Legislativo que pudessem fazer face ao Poder Executivo”. Atualmente, com a solidez da Constituição de 1988, não haveria razão para manter essa regra.