Pandemia sufoca hospitais e provoca caos na saúde
Foto: National Cancer Institute via UnSplash
Cirurgia de correção de miopia, retirada de hemorroida e laqueadura são exemplos de cirurgias eletivas. O Ministério da Saúde define como eletivas todas as cirurgias que não são de emergência, ou seja, não precisam ser feitas em um curto período de tempo quando a vida do paciente está em risco.
Com a pandemia da Covid-19, a realização deste tipo de procedimento ficou muito comprometida. E a normalização do atendimento ainda é incerta para 2021.
Devido à necessidade de internação na maioria das cirurgias, ficou praticamente inviável manter o fluxo normal destas operações no cotidiano do hospital: tanto pelo volume do trabalho dos médicos — que ficaram sobrecarregados com as hospitalizações do novo coronavírus e não tiveram disponibilidade para as intervenções — quanto pela segurança dos pacientes, que ficariam expostos à Covid-19 em ambiente hospitalar — ainda mais com as recentes variações do vírus.
O Hospital 9 de Julho, no centro de São Paulo, por exemplo, realizava 80 cirurgias por semana. Com a chegada do coronavírus, passou a fazer apenas 20. O diretor-executivo médico do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, também na capital paulista, Antonio da Silva Bastos Neto, afirmou que cerca de 40% do volume de internações no hospital antes da pandemia correspondia aos procedimentos eletivos.
Segundo a Associação Nacional de Hospitais Privados, os exames e consultas eletivas previstos para 2020 registraram uma queda de 32%. Isso também se relaciona à queda das cirurgias, pois em um procedimento não emergencial, são feitos mais exames e consultas de preparação pré-operatória.
“Tivemos uma queda muito grande mesmo na quantidade de procedimentos cirúrgicos eletivos. Depois de as entidades sanitárias terem mudado as recomendações [voltaram a recomendar a realização de cirurgia] e os hospitais terem adaptado o fluxo de trabalho, está acontecendo uma retomada desses procedimentos, mas eu não diria que o fluxo é igual ao de antes da pandemia”, relatou o editor do Observatório da Anaph (Associação Nacional de Hospitais Privados) e CEO do Sabará Hospital Infantil, Ary Ribeiro.
O termo ‘eletiva’ explica bem o conceito desses procedimentos, que normalmente são gerados a partir de uma decisão conjunta entre paciente e médico. É preciso atenção, entretanto, para não considerar este tipo de cirurgia como sinônimo de “opcional”: em muitos casos, a cirurgia é necessária, apenas não precisa ser feita imediatamente. Por esse motivo, adiar as operações em muito tempo não é o ideal, e pode prejudicar a qualidade de vida dos pacientes.
Entenda melhor quais os impactos do atraso destes procedimentos na saúde dos pacientes e no cotidiano dos hospitais:
Em 2019, o Ministério da Saúde elaborou uma estratégia de ampliação do acesso às cirurgias eletivas no SUS que visava aumentar a quantidade de operações deste tipo realizadas anualmente, como forma de melhorar a saúde e a qualidade de vida dos usuários do sistema.
O objetivo da nova política era zerar as filas para as intervenções cirúrgicas em âmbito nacional, e cerca de 2,4 milhões de procedimentos eletivos foram realizados no ano.
Foram investidos R$ 100 milhões no projeto, e dado o relativo sucesso, foi estendido para 2020, com um acréscimo de R$ 250 milhões, divididos proporcionalmente ao contingente populacional de cada estado do país.
Com a chegada da pandemia, no entanto, os objetivos da pasta encontraram um obstáculo praticamente intransponível: as salas de espera, emergências e UTIs lotadas não deixaram espaço para que os médicos e outros profissionais envolvidos nas cirurgias eletivas pudessem assumir uma responsabilidade extra. Além disso, internar um paciente em pós-operatório — situação na qual o organismo fica mais vulnerável — em um ambiente lotado de infectados pela Covid não era uma opção.
A decisão de realizar ou não cirurgias eletivas durante o período epidêmico ficou a cargo dos Conselhos Regionais de Medicina. Durante os quase 10 meses de pandemia, os estados bloquearam e liberaram, em diferentes frequências, a realização desses procedimentos.
Em São Paulo, por exemplo, no dia 19 de novembro de 2020, o secretário de Saúde do estado, Jean Carlo Gorinchteyn, bloqueou pela segunda vez o uso de leitos para procedimentos não emergenciais.
“O governo do estado de São Paulo, em conjunto com a Secretaria de Estado da Saúde e o Comitê de Contingência da Covid-19, sempre com o compromisso de garantir e preservar vidas, assina uma decreto que determina a todos os hospitais públicos, filantrópicos, e privados a não desmobilização de qualquer leito, seja ele de unidade de terapia intensiva ou de enfermaria”, disse ele.
De acordo com Bastos Neto, no início da pandemia, houve um fluxo de cancelamentos dos procedimentos, e muitos não retornaram. “No início da pandemia, muitas cirurgias foram canceladas (tanto por iniciativa de pacientes e/ou médicos) devido principalmente ao receio do contágio pelo coronavírus. Isso decorrente da disponibilidade restrita de conhecimento científico, além de informações não confiáveis que circularam abundantemente, gerando grande insegurança”, explicou.
Ary Ribeiro afirmou que esta diminuição no início da pandemia foi principalmente devido à falta de entendimento sobre a doença no momento e a necessidade de adaptação do fluxo de pacientes nos hospitais.
“Atualmente, não acredito que seja perigoso um paciente ser internado para fazer uma cirurgia eletiva”, afirmou. “A maioria dos hospitais estiveram atentos a criar mecanismos de segurança para tratar fluxos de pacientes com Covid e sem Covid de formas separadas. Uma das coisas que a gente teve que aprender em 2020 é saber como funciona dois hospitais dentro de um só”.
Conforme os meses da pandemia passaram, o entendimento sobre o novo coronavírus, seus sintomas, transmissão e profilaxia foram aumentando, e possibilitando a criação de protocolos de segurança nas mais diversas áreas.
Na perspectiva de Bastos Neto, é necessário prosseguir com as operações, seguindo os padrões de segurança — para o médico e para o paciente — ainda que a pandemia não tenha acabado.
“Devemos ter em mente que, a despeito da pandemia, temos alta prevalência na população de doenças crônicas não transmissíveis (doenças cardiovasculares, respiratórias, câncer e diabetes) além de outras como ortopédicas e neurológicas, que necessitam de tratamento cirúrgico. O atraso de tratamento pode, por exemplo, mudar o estadiamento de um câncer e implicar em um tratamento mais agressivo, com mudança de prognóstico e qualidade de vida para o paciente”, explicou.
Muitos profissionais de saúde temem que o medo dos pacientes de irem ao hospital para não serem contaminados pelo coronavírus faça com que eles ignorem ou minimizem sintomas importantes e sinais de alerta para doenças graves.
Ary Ribeiro reforça que uma das principais consequências da pandemia no sistema de saúde é a criação de “passivos”, ou seja, pessoas que deixam de acompanhar sua situação de saúde por diversos motivos agravados pela pandemia: medo da contaminação por Covid em hospitais e laboratórios, questões financeiras, entre outras. A falta de frequência de cuidados pode criar dificuldades como atrasos de diagnósticos importantes e atrasos no tratamento.
“É muito grave que um câncer tratável cirurgicamente em fase mais precoce só venha a ser tratado posteriormente, pois a cirurgia teve de ser cancelada, ou porque o paciente se sentiu receoso de procurar o hospital e a doença chegar em uma condição onde o tratamento cirúrgico já não terá o mesmo resultado”, exemplificou ele.
“É muito sério [o atraso nas cirurgias], existem efeitos e eles têm sido estudados. A Covid tem diferentes efeitos: tem o efeito dela em si e o efeito que ela gera naquelas condições que não estão sendo tratadas adequadamente pois os tratamentos estão sendo postergados”
O ideal, de acordo com o Conselho Federal de Medicina, é tomar todos os cuidados para evitar a contaminação por Covid-19 (incluindo o isolamento social), mas ir ao médico caso tenha sintomas de qualquer doença — as unidades de saúde estão preparadas para receber os pacientes e tentam proporcionar o menor risco de contaminação possível.
Ribeiro reforça que é preciso continuar procurando atendimento médico e cumprir as recomendações de tratamento na pandemia: “É importante que os pacientes não posterguem os procedimentos que lhes forem recomendados, e não deixarem de procurar o atendimento quando precisam. O sistema precisa continuar funcionando e ele tem que se adaptar a essa convivência entre os fluxos da Covid e o restante. Os hospitais trabalharam muito nisso para garantir a segurança”.
“Como instituição de saúde elaboramos protocolos clínicos, separamos fluxos de atendimento, criamos unidades dedicadas para pacientes não-Covid, capacitamos os profissionais e disponibilizamos todos os recursos necessários para a realização de cirurgias eletivas com a máxima segurança. Além disso, realizamos pesquisas para gerar conhecimento sobre o coronavírus em diferentes aspectos”, disse o diretor-executivo médico do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
O médico editor do Observatório da Adaph acredita que 2021 não deve ser tão diferente de 2020, em relação ao fluxo de cirurgias eletivas. Ainda que as vacinas tenham chegado no país, é muito difícil saber quais serão os resultados provocados por elas e quando vão começar a aparecer. Entretanto, com os resultados divulgados até o momento, é possível inferir que em algum momento as hospitalizações por Covid-19 devem diminuir muito e aliviar a pressão sobre o sistema de saúde.
Outra previsão para o futuro que causa temor é a da criação de filas para procedimentos, em especial no Sistema Único de Saúde, quando a demanda pelos procedimentos voltar a aumentar após um alívio da pandemia. “Olhando o sistema de saúde como um todo, a geração de filas é uma questão séria. Esta é uma das possíveis consequências, que pode criar uma demora no atendimento do paciente e uma piora no seu prognóstico”.
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