Eduardo Bolsonaro está distribuindo cargos na PF a amigos
Foto: Reprodução/redes sociais e Marcos Corrêa/PF
Tradicionalmente, os postos que a Polícia Federal tem nas embaixadas do Brasil no exterior são oferecidos a funcionários experientes ou que deixam cargos de destaque após um longo período de trabalho na corporação. Houve um tempo inclusive em que se realizavam concursos para preencher esses cargos. Mas hoje, aparentemente, já não é preciso ter uma folha de serviços tão fornida.
Para dois policiais federais, pelo menos, bastou ser amigo da família Bolsonaro – especialmente do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que é escrivão da PF.
Os dois policiais – um escrivão e um papiloscopista – nem sequer estavam dando expediente na PF quando foram nomeados para cargos nas embaixadas de Miami e de Portugal. Mas o fato de estarem muito próximos ao clã presidencial supriu essa lacuna.
O agente Fabrício Scarpelli, amigo pessoal de Eduardo, foi nomeado em março oficial de ligação em Miami até 2023. O cargo é exercido em regime temporário por dois anos, sempre com missões em organismos estrangeiros como a Interpol e a ONU.
Na cidade americana, a função está ligada à cooperação com o Immigration Customs Enforcement (ICE), órgão dos Estados Unidos que cuida da imigração ilegal. O salário é de R$ 38 mil, segundo o Portal da Transparência.
Até ser nomeado, ele trabalhava como assessor especial da Casa Civil, que fica no Palácio do Planalto, sob o comando do ex-ministro Luiz Eduardo Ramos. Não se sabe exatamente o que ele fazia, uma vez que as agendas oficiais do período em que atuou na Casa Civil só se referem a “despachos internos”.
Mas, apesar de trabalhar para o general Ramos, seu vínculo de verdade é com Eduardo. Scarpelli e o deputado exibem fartamente a amizade em publicações nas redes sociais. No Instagram, o próprio 03 já contou que os dois trabalharam juntos antes mesmo de Eduardo entrar para a política, em 2015.
Scarpelli, aliás, disputou a primeira eleição (pelo PSDB) antes mesmo de Eduardo. Em 2012, tentou uma vaga na Câmara de Vereadores de Itatiba (SP), nos arredores de Campinas.
Depois que filho 03 de Bolsonaro se elegeu deputado federal, Scarpelli se transferiu para o PSC, que era então a legenda do clã, e concorreu novamente a vereador, usando “Fabricio Scarpelli da Federal” como nome de campanha.
“Se quisermos uma política de direitos humanos voltada para a vítima, uma escola que não forme militantes de esquerda e sistemas que privilegiem a meritocracia temos que eleger pessoas que se identifiquem conosco. Por isso fui hoje para Itatiba-SP apoiar o candidato a Vereador Policial Federal Fabrício Scarpelli”, escreveu Eduardo Bolsonaro em apoio ao amigo.
O endosso não fez efeito. Scarpelli da Federal não conseguiu se tornar vereador. Mas nunca deixou de exibir sua influência no meio bolsonarista. Além de várias fotos com o próprio Eduardo, seu perfil no Instagram o mostra com o então ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, e o deputado estadual de São Paulo Gil Diniz (sem partido), o Carteiro Reaça, que ganhou projeção por ter sido assessor de Eduardo Bolsonaro na Câmara dos Deputados.
Funções como a de oficial da ligação, adido-adjunto e adido são disputadíssimas na PF, em função do prestígio e dos benefícios que incluem – além, é claro de os salários serem pagos em dolar. Além dos R$ 38 mil de salário, Scarpelli embolsou R$ 91 mil de ajuda de custo para a mudança.
Já o segundo amigo dos Bolsonaro, o papiloscopista João Paulo Dondelli, teve direito a uma ajuda de custos de R$ 97 mil para se transferir para Portugal, onde será adido-adjunto, e ainda pode levar seus dependentes, todos com passaporte diplomático. A função para a qual ele foi nomeado em junho tem salário padrão de US$ 12 mil, mais US$ 4 mil dólares de auxilio moradia.
Tão próximo do pai quanto do filho, Dondelli foi o segurança de Jair Bolsonaro na que deteve Adélio Bispo no momento da facada sofrida pelo então candidato em Juiz de Fora, em setembro de 2018.
Em fevereiro de 2020, ele mesmo rememorou a experiência, numa cerimônia de condecoração recebida na Assembleia Legislativa de São Paulo junto com outros ex-seguranças de Jair Bolsonaro.
Depois de contar que havia detido o agressor enquanto o candidato era carregado para o chão de um bar, Dondelli continuou: “Nós não podíamos tirá-lo [Adélio] de lá naquele momento, porque no local que visualizei para a retirada do Adélio estava a viatura do candidato, o Zero Um [Jair Bolsonaro]. Havia uma encruzilhada: saco o Adélio e aumento exponencialmente o risco de vida para mim e para a nossa equipe ou eu aguardo o Pelotão de Choque da Polícia Militar fazer o nosso apoio?” Ao final, o segurança conseguiu retirar Adélio do bar e levar para a superintendência da Polícia Federal.
O depoimento foi acompanhado no plenário por Eduardo Bolsonaro e Gil Diniz. O presidente não foi à cerimônia, mas mandou uma mensagem exaltando Dondelli e os outros dois policiais condecorados pelo seu salvamento.
Em outro trecho de seu discurso, o ex-segurança contou também um momento de intimidade com Bolsonaro: foi com ele que Bolsonaro desabafou sobre a decisão da RedeTV de manter um púlpito vazio representando Lula no debate presidencial.
O presidente achava que a medida não devia ser adotada, uma vez que o petista estava preso e sua candidatura, suspensa pelo TSE. “Ele ficou injuriado com aquilo, olhou para mim e falou assim: ‘Federal, império da lei, (Lula) não tem registro e tá condenado’, e eu, ‘Império da lei, Zero Um’, ‘Vamos pra guerra?’, ‘Vamos pro combate!’, e seguimos para o debate”.
Depois que Bolsonaro foi eleito, levou Dondelli junto para o Planalto. O policial teve uma passagem relâmpago pela comunicação da Secretaria de Governo e depois migrou para a Secretaria de Comunicação.
Sua agenda oficial mostra que, além de reuniões com empresas, ele despachava com quadros olavistas do governo, como o assessor especial de relações exteriores, Filipe Martins, e o secretário de Comunicação Institucional Felipe Pedri, ambos próximos de Eduardo Bolsonaro.
Teve, ainda, participação em episódios escrutinados na CPI da Covid. Segundo o ex-secretário de Comunicações Fábio Wajngarten, foi Dondelli quem o assessorou na na primeira reunião que teve com executivos da Pfizer no Planalto. O que se passou nessa reunião nunca foi devidamente esclarecido.
Seu nome também foi citado em reportagens sobre a chamada Abin paralela, um grupo de policiais que trabalhava no Palácio do Planalto e do qual se dizia que fazia investigações para o presidente.
Agora como adido-adjunto, Dondelli vai ocupar o segundo cargo mais importante da PF em Portugal pelos próximos três anos. Embora não seja comum um perito ocupar um cargo tão estratégico para a Polícia Federal no exterior, uma credencial é certo que ele tem: a fidelidade à família presidencial.
Procurada, a Polícia Federal respondeu que a indicação de Dondelli e Scarpelli para seus respectivos cargos “atendem perfeitamente os critérios previstos na norma que rege a matéria (Instrução Normativa 86/2014, artigo 20)”.
A respeito de os policiais não estarem trabalhando na corporação quando foram requisitados, a assessoria da PF afirma que as normas não estabelecem “vedação ou requisito que o servidor exerça suas atividades em lotação específica, seja na própria PF ou regular cessão a outro órgão”.
Indagada se o agente e o papiloscopista foram indicados por Eduardo Bolsonaro ou pelo Palácio do Planalto, a corporação não respondeu.
Fabrício Scarpelli foi contatado através de uma rede social a respeito da reportagem, mas assim que recebeu a mensagem, bloqueou o repórter. O oficialato de ligação da PF em Miami não atendeu aos telefonemas, bem como a embaixada do Brasil em Portugal, onde trabalha Dondelli. O mesmo com o gabinete do deputado Eduardo Bolsonaro.
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