
Mercado diz que Petrobras sofrerá prejuízos com intervenção
Foto: Reprodução
Assim que soube que a Petrobras iria fazer um novo reajuste ao preço do diesel nas refinarias, o presidente Jair Bolsonaro correu para o seu ‘cercadinho’ de apoiadores no Palácio da Alvorada, em 27 de setembro, e disse que “não pode fazer milagre”, jogando a responsabilidade do atual patamar dos combustíveis para o presidente da Petrobras, o general Joaquim Silva e Luna. O reajuste veio e, mesmo depois de três meses sem repasse para o diesel, deixou os caminhoneiros, apoiadores de primeira hora de Bolsonaro, atônitos. Desde então, o presidente da República tem se reunido com os líderes do Congresso e com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para traçar uma solução pouco liberal para a política de preços da commodity no Brasil. Diante do risco de interferência política na petrolífera, Silva e Luna defendeu-se: “Isso [a interferência no preço do combustível] é uma coisa grave e séria que a gente tem que estar atento. Os valores precisam permitir que haja a importação do combustível”, disse, em entrevista ao jornal O Globo, veiculada neste domingo, dia 3.
O impasse em relação à política de preços praticada pela empresa, que é baseada na cotação internacional do barril e na volatilidade do dólar, não é exclusividade de Silva e Luna. Seu antecessor, Roberto Castello Branco, mesmo sendo uma indicação do ministro da Economia, Paulo Guedes, sofreu críticas indecorosas de Bolsonaro em praça pública na reta final de seu mandato, que acabou não renovado. Em 2018, Pedro Parente, que assumiu a companhia com o difícil trabalho de recolocá-la no prumo e impôs o modelo de negociação que ainda vigora, entregou uma carta de demissão onde destacava que o debate sobre a política de preços era “emocional” — e, por assim dizer, desprovida de razão.
Com 36,7% da capital social e 50,5% das ações com direito a voto da petrolífera, o governo entende que cabe a ele definir os rumos da empresa, uma visão que, na opinião de muitos especialistas, é equivocada e gera distúrbios no mercado de capitais brasileiro. Sendo assim, Bolsonaro, que vê sua popularidade ser dizimada em um momento de aumento da pobreza, do desemprego e da inflação, pressiona a companhia por mudanças. Depois de apontar a culpa para Silva e Luna e para governadores, a solução in voga em Brasília é a criação de um fundo regulador que irá subsidiar os aumentos nos combustíveis com o caixa gerado pelos dividendos da companhia à União. Para isso, Bolsonaro negocia com Gustavo Montezano, presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A pressão é tamanha que recentemente a petrolífera anunciou um auxílio para a compra de gás de cozinha para famílias mais vulneráveis. Avaliado em 300 milhões de reais, o programa terá duração de 15 meses e servirá de alívio para algumas famílias que não têm condições financeiras para arcar com o preço médio do GLP, hoje na faixa dos 96,9 reais. “Não vamos subsidiar. Vamos doar. Empresas privadas devem participar deste programa durante a Covid-19 com a Petrobras”, disse Marcelo Mesquita, conselheiro da Petrobras. Ele reconhece que há um “fogo amigo” por parte de algumas declarações de figuras públicas. O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP/AL) questionaram a agilidade da petrolífera para repassar o aumento de preço das commodities. “Uma pena este fogo amigo do Campos Neto e do Lira, mas, no dia a dia, vida que segue. Luna está fazendo um bom trabalho para proteger a empresa desses ataques”, completa.
Para David Zylbersztajn, ex-diretor geral da Agência Nacional do Petróleo, a ANP, a pressão do governo não se justifica. “Nenhum país interfere dessa maneira nas empresas de petróleo no mundo. Isso não existe. É um governo que se diz liberal, mas atua com política ‘getulista’. Se o presidente do BC quer mexer no preço do combustível, ele pode começar atuando no câmbio”, disse. “Um governo liberal teria interesse em abrir o mercado. Quer dar mais transparência para os preços? Vende parte das refinarias. Coloca o refino em concorrência. Agora, parece que o governo quer estatizar a Petrobras. Então compre todas as ações. São alguns bilhões de dólares. De onde vai vir esse dinheiro eu não sei. O governo está penando até para fechar o Orçamento”.
Zylbersztajn defende uma política de governo voltada aos mais vulneráveis (como o Vale Gás) nesse momento de disparada nos preços, mas diz que subsidiar combustíveis como diesel e gasolina é ajudar uma parcela mais rica da população. “É um subsídio transparente e correto, que pode ser bancada aos mais pobres pelo Tesouro. Agora, mexer nos preços é colocar o Brasil no caminho para virar uma Venezuela”, reitera. Segundo o portal Global Petrol Prices, o preço médio do litro da gasolina no país é de 1,13 dólar, longe de ser um dos mais caros do mundo. De acordo com a Associação Brasileira de Importadores de Combustíveis (Abicom), há defesagem de 14% no preço diesel e de 10% no valor da gasolina praticados pela Petrobras nas refinarias do país em relação aos preços internacionais.
Um ex-executivo da Petrobras, que prefere não se identificar, afirma que qualquer medida mais radical do governo será interpretada com maus olhos por órgãos reguladores. “A Petrobras está sujeita à supervisão pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), pela Security Exchange Comission e ainda tem a supervisão do departamento de Justiça dos EUA, decorrente de um acordo que foi feito, que se estende até o final de 2021”, diz ele. “A Petrobras não é um órgão do governo. É uma empresa que o estado brasileiro tem uma participação importante, mas que não pode ser utilizada para fazer política pública. Essa é a questão. E eu vejo essa tendência se acentuando. Como a campanha eleitoral foi antecipada, isso vai continuar a acontecer.”
Para Decio Oddone, ex-diretor geral da ANP e atual CEO da Enauta, não há “solução mágica” para a commodity, mas o governo federal deveria cessar-fogo com os estados e propor um novo cálculo para o ICMS. “Não há solução mágica para o preço dos combustíveis. A solução passa por respeitar o preço internacional, porque só assim você vai garantir o abastecimento do produto, além de promover a máxima competição competição ao longo da cadeia”, diz ele. “A questão mais premente é o ICMS. A cobrança do ICMS por um valor fixo por litro pode diminuir a volatilidade na bomba e na arrecadação dos estados.”
Fato é que a Petrobras ressurgiu das cinzas em seus últimos mandatos e se desfez de ativos importantes, como gasodutos e a BR Distribuidora, agora conhecida como Vibra Energia. Tudo isso se deu em busca de promover maior competição ao mercado, mas, sobretudo, de recuperar o caixa da companhia e focar em áreas mais lucrativas, como a exploração do pré-sal. Como resultado, a petrolífera atingiu seu maior lucro trimestral da história no quarto trimestre de 2020: 59,9 bilhões de reais, 634% em relação ao mesmo período de 2019. Essa recuperação robusta, no entanto, pode estar com data marcada para terminar se o governo efetuar soluções fora da realidade para controlar a inflação por meio da empresa, que completou 68 anos de vida neste domingo, dia 3.
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