Legado de Bolsonaro será desemprego de 14 milhões

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Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

O desemprego no Brasil irá ceder apenas de forma marginal em 2022 e não retornará aos níveis pré-pandêmicos. Além disso, os números de pessoas abandonando o mercado de trabalho continuam elevados e a informalidade cresce. O governo de Jair Bolsonaro, portanto, terminará sem ter recolocado o país no patamar que existia antes da eclosão da crise sanitária, apesar de seu discurso de que medidas contra a pandemia estavam sendo evitadas para salvar postos de trabalho e permitir que a economia pudesse operar.

As projeções fazem parte de um novo informe da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que rebaixou nesta segunda-feira sua previsão de recuperação do mercado de trabalho em 2022. Para o diretor-geral da agência, Guy Ryder, o cenário não é bom. “Estamos vendo tanto um aumento de desemprego como uma redução do número de pessoas participando do mercado de trabalho”, disse. “Se você agrega esses dois elementos, o que se vê é um sinal de uma situação preocupante no estado de saúde do trabalho”, alertou.

Em 2019, o número de desempregados no Brasil era de 12,5 milhões de pessoas. Em 2021, a taxa atingiu 14,3 milhões de pessoas e, em 2022, ele chegará a 14 milhões, uma queda apenas marginal.

Em termos percentuais, a taxa saiu de 11,9% em 2019 para 14,4% em 2021. Em 2022, ela continuará em 13,6%.O índice é mais de duas vezes superior à média mundial.

Para a OIT, dificilmente o Brasil conseguirá voltar aos níveis de 2019 em 2023 e a recuperação pode ser adiada.

De acordo com Ryder, além do desemprego, milhões de brasileiros abandonaram “de forma significativa” o mercado de trabalho e sequer estão buscando mais emprego. Antes da crise sanitária, 62,2% dos brasileiros estavam no mercado de trabalho. Em 2020, a taxa caiu para 57,3% e, agora, continua abaixo dos índices de 2019, com 59%.

Em termos de perda de horas trabalhadas, elas equivalem a 2,2 milhões de empregos no Brasil em 2022. Em 2020, essa taxa chegou a 14,2 milhões.

Para o economista chefe da OIT, Richard Samans, a América Latina como um todo terá o cenário menos otimista entre todas as regiões do mundo e as taxas de desemprego não retornarão aos níveis pré-pandemia até pelo menos 2023.

De acordo com a OIT, a situação do emprego no mundo viverá uma recuperação. Mas Ryder admite que esse processo será mais lento e mais difícil que se imaginava. Hoje, a agência projeta um déficit em horas trabalhadas globalmente equivalente a 52 milhões de empregos em tempo integral, em comparação ao quarto trimestre de 2019. A estimativa é duas vezes pior do que se previa, de 26 milhões de empregos equivalentes em tempo integral.

A OIT acredita que a situação em 2022 é melhor que a de 2021. Mas ela permanece quase 2% abaixo do número de horas trabalhadas antes da pandemia começar. “Temos um longo caminho para conseguir uma recuperação, que é bem mais lenta que esperávamos”, disse Ryder.

Uma volta ao período pré-2019 só ocorrerá a partir de 2023. Até lá, o desemprego global ficará acima dos níveis pré-covid. “O nível 2022 está estimado em 207 milhões de desempregados, comparado a 186 milhões em 2019”, diz. Em termos percentuais, o desemprego no mundo passou de 5,4% para 6,2% em 2020. Em 2021, a taxa ficou em 5,9%.

O relatório da OIT também adverte que o impacto global sobre o emprego é significativamente maior do que o representado nestes números, porque muitas pessoas deixaram a força de trabalho. Em 2022, a taxa global de participação da força de trabalho deve permanecer 1,2 pontos percentuais abaixo da de 2019.

A redução na previsão para 2022 é reflexo tanto da chegada da variante ômicron, bem como a incerteza sobre a rota da pandemia.

Outra constatação é de que, diante dos dois anos da pandemia, a informalidade aumentou de forma importante. Mas, no caso brasileiro, a pandemia aprofundou o processo que já vinha ocorrendo nos últimos anos, de expansão da informalidade do trabalho.

Segundo a OIT, a transição para o emprego formal em andamento em muitas economias da América Latina foi interrompida antes da pandemia.

“Durante grande parte da década de 2000, a taxa de informalidade estava caindo em muitos países da sub-região. Esta tendência descendente foi impulsionada por uma série de fatores, incluindo uma demanda dinâmica de mão-de-obra no contexto do crescimento econômico, e um contexto macroeconômico estável, auxiliado por políticas específicas para fortalecer o processo de formalização”, explicou.

“De 2015 até o início da pandemia, no entanto, a mudança do trabalho informal para o formal na Argentina, Brasil, Equador, Panamá ou se inverteu ou se desacelerou. Em apenas alguns países (por exemplo, Paraguai, Peru) o processo foi sustentado”, disse.

De fato, a OIT estima que os estágios iniciais da pandemia tiveram um efeito sem precedentes nos mercados de trabalho da região, em parte porque o emprego informal não podia desempenhar seu tradicional papel anticíclico de absorver os trabalhadores deslocados do setor formal.

Existem sinais de recuperação, mas apenas no setor dos empregos informais. « Os empregos informais foram responsáveis por mais de 70% da criação líquida de empregos desde meados de 2020 em muitos países da América Latina, incluindo Argentina, México e Peru, e por mais da metade do crescimento do emprego no Chile e na Costa Rica”, disse.

Ainda assim, a recuperação do emprego na América Latina permaneceu incompleta, e tanto o emprego formal quanto o informal permaneceram abaixo de seus níveis pré-pandêmicos na maioria dos países.

Para a OIT, é fundamental que as políticas se concentrem em gerar emprego formal em escala suficiente não apenas para absorver a força de trabalho em recuperação, mas também para afastar qualquer risco de um impacto mais profundo na sociedade.

De fato, o impacto da pandemia não tem sido igual para todos e a crise está aprofundando as desigualdades dentro e entre países e enfraquecendo o tecido econômico, financeiro e social de quase todas as nações, independentemente do status de desenvolvimento.

“Este dano provavelmente exigirá anos para ser reparado, com consequências potenciais a longo prazo para a participação da força de trabalho, renda familiar e coesão social e – possivelmente – política”, diz.

“Não pode haver uma recuperação real desta pandemia sem uma ampla recuperação do mercado de trabalho”. E para ser sustentável, esta recuperação deve ser baseada nos princípios do trabalho decente – incluindo saúde e segurança, equidade, proteção social e diálogo social”, defendeu Guy Ryder.

Os efeitos da pandemia também estão sendo sentidos de formas diferentes. As regiões europeias e norte-americanas estão mostrando os sinais mais encorajadores de recuperação, enquanto que o Sudeste Asiático e a América Latina têm as perspectivas mais negativas. Em nível nacional, a recuperação do mercado de trabalho é mais forte nos países de alta renda, enquanto as economias de renda média-baixa estão se distanciando mais.

Para a OIT, a América Latina apenas conseguirá voltar a ter as mesmas taxas de desemprego que registrava antes da pandemia em 2024. Em 2019, o índice era de 24,3%. Em 2020, a taxa subiu para 28,8% e, em seguida, para 30,1% em 2021. Para 2022, o desemprego cai para 27,6%.

De acordo com o informe, a situação macroeconômica anterior à pandemia diferia consideravelmente entre a América Latina, por um lado, e a América do Norte, onde o crescimento tinha sido estável e forte.

Quando a pandemia chegou, elas estavam posicionadas de maneira diferente para enfrentar a crise.

“O crescimento despencou em 2020 em ambas as sub-regiões, acompanhado de grandes perdas de emprego, aumento do desemprego e saídas maciças da força de trabalho. Em todas as Américas, os governos intervieram maciçamente para proteger os empregos e as rendas. Nos Estados Unidos e no Canadá, montantes significativos do orçamento foram alocados para apoiar os trabalhadores desempregados. Na América Latina e no Caribe, foram feitos progressos substanciais na extensão da proteção social aos trabalhadores informais em larga escala.

A OIT estima que a divergência nas perspectivas de recuperação entre as duas sub-regiões em 2021 é resultado de diferenças no lançamento de vacinas, perspectivas de manter uma política monetária e apoio à política fiscal em um contexto de crescente preocupação com a inflação e restrições financeiras.

Nos Estados Unidos, foi anunciado um apoio fiscal em larga escala para o segundo semestre de 2021, a fim de aumentar os investimentos em inframestrutura e fortalecer as redes de segurança social. Em contraste, algumas economias latino-americanas, incluindo Brasil e México, começaram a reconstruir os freios fiscais e normalizar a política monetária para evitar pressões inflacionárias.

A OIT também destaca como a América Latina foi a região mais duramente atingida em 2020, com altos níveis de contágio e mortalidade, a mais acentuada queda no PIB (7,5%) e uma queda nas horas de trabalho equivalente a 36 milhões de empregos em tempo integral.

Em 2020, a região registrou perdas líquidas de emprego de aproximadamente 25 milhões, dos quais 82% se traduziram em saídas da força de trabalho. Como a crise afetou todos os setores econômicos, medidas de contenção e restrições de mobilidade impediram a realocação de mão-de-obra para o emprego informal, que antes era um mecanismo-chave de ajuste do mercado de trabalho na sub-região.

“Ao invés de ficarem desempregados ou mudarem para empregos informais, como em crises anteriores, tanto os empregados demitidos quanto os trabalhadores autônomos deixaram a força de trabalho. Um impacto desproporcional nos trabalhadores informais se refletiu em um declínio na taxa de emprego informal em alguns países no auge da crise em 2020 », diz.

A pandemia revelou os laços estreitos na sub-região entre informalidade, baixa renda familiar e desigualdade.

“O fechamento e o desaparecimento de milhões de pequenas e médias empresas em toda a sub-região sugerem que a recuperação do emprego ficará atrás da retomada do crescimento econômico e que a qualidade do emprego poderá se deteriorar”, diz.

Já em 2021, houve uma recuperação da economia da América Latina, com uma expansão do PIB de 6,0 por cento, em parte impulsionado por termos de comércio favoráveis para o Brasil, e repercussões para o México devido à crescente demanda nos Estados Unidos.

“Espera-se que a recuperação do Brasil faça a economia voltar acima de seu PIB pré-crise, graças a maiores exportações de commodities, mas também graças a medidas fiscais maiores e mais bem direcionadas do que no México, que teve uma recessão mais profunda, e na Argentina, que lutou com as restrições financeiras resultantes do significativo remar de furos externos antes da pandemia”, diz.

Apesar da expansão do PIB, o crescimento do emprego voltou a ser limitado e tem sido impulsionado em grande parte pelo trabalho informal. Como muitos dos que haviam saído do mercado de trabalho em 2020 reentraram no decorrer de 2021, a taxa de desemprego permaneceu elevada em 10,0%,
Haverá uma queda nas taxas de desemprego. Mas a situação apenas retorna ao que era antes da pandemia em 2024.

Uol 

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