
Rússia nega que queira derrubar regime ucraniano
Foto: Serguei Bobok/AFP
A invasão russa à Ucrânia não tem entre seus objetivos derrubar o governo Volodimir Zelenski, disse a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova nesta quarta-feira (9), dia em que a guerra completa duas semanas.
A fala demonstra certa mudança no tom adotado sobretudo no começo da guerra, declarada na madrugada de 24 de fevereiro pelo presidente Vladimir Putin com o objetivo declarado de “desnazificar” a Ucrânia, em meio a acusações de que a gestão Zelenski tinha associações com grupos neonazistas. O presidente ucraniano vem afirmando desde o começo do conflito que é o “alvo número 1” e que pode ser morto a qualquer momento.
Na segunda (7), um porta-voz do governo listou à agência de notícias Reuters condições para o fim da guerra, que não incluíam a queda de Zelenski. Segundo ele, a operação almeja que a Ucrânia se renda militarmente; mude sua Constituição para garantir que nunca irá aderir à Otan (aliança militar ocidental) ou à União Europeia; e reconheça a Crimeia anexada em 2014 como russa e as regiões separatistas do Donbass, no leste, como independentes.
Zakharova defendeu nesta quarta que a guerra tem saído conforme o planejado, contrariando analistas que apontam que os russos têm enfrentado uma dificuldade maior do que o previsto a princípio. Ela afirmou também que a Rússia nunca ameaçou a Otan, mas que o país deve reagir aos “movimentos de confronto” da aliança militar.
Em entrevista recheada de denúncias contra países ocidentais, que fecharam o cerco e isolaram Moscou, a porta-voz ainda acusou os Estados Unidos de financiarem laboratórios na Ucrânia com o objetivo de desenvolver “componentes de armas biológicas”, onde havia amostras de cólera e antrax, entre outros elementos letais. Um porta-voz do Pentágono afirmou que “esta desinformação russa absurda é patentemente falsa”.
Nesta quarta, a operadora ucraniana de energia Ukrenergo afirmou que a produção da usina de Tchernóbil, origem da pior catástrofe nuclear civil, em 1986, “está totalmente desconectada da rede de energia elétrica devido às ações militares dos ocupantes russos. O local não tem mais fornecimento de energia elétrica.”
O décimo quarto dia de guerra começou com a promessa de um novo cessar-fogo temporário para permitir a saída de civis por corredores humanitários. As outras tréguas anunciadas até aqui não foram respeitadas, deixando centenas de milhares de pessoas presas em cidades sitiadas, sem acesso a água potável e medicamentos.
A Rússia prometeu respeitar uma trégua das 9h às 21h do horário local (4h às 16h no horário de Brasília) desta quarta-feira. Nesta manhã, a vice-primeira-ministra ucraniana Irina Vereshchuk afirmou que os dois lados do conflito concordaram em respeitar o cessar-fogo.
O anúncio de trégua desta quarta foi semelhante o de terça (8), que prometia a fuga segura pelas cidades de Kiev, Kharkiv, Chernihiv, Sumi e Mariupol. Até agora, no entanto, apenas um corredor funcionou de fato, saindo de Sumi, na terça, quando cerca de 5.000 pessoas deixaram a cidade.
A situação é tensa sobretudo em Mariupol, cidade portuária ao sul totalmente cercada por tropas russas há mais de uma semana, onde a Cruz Vermelha descreve a situação dos civis como “apocalíptica”.
Moradores se abrigam nos subsolos para se protegerem dos bombardeios constantes, sem acesso a comida, água, energia ou aquecimento, e sem poder retirar os feridos.
Um cessar-fogo na região já havia falhado no sábado. O governo ucraniano disse que 30 ônibus e oito caminhões de suprimentos foram bombardeados pela Rússia na terça-feira, violando o cessar-fogo, e não conseguiram chegar à região. Moscou culpou Kiev por não deter o fogo.
Nas duas maiores cidades da Ucrânia, Kiev e Kharkiv, a oferta de corredores humanitários do governo russo forçaria os civis a irem para a própria Rússia ou sua aliada Belarus, propostas rejeitadas pelo governo ucraniano.
Nesta quarta, Zelenski afirmou que só o estabelecimento de uma zona de exclusão aérea sobre a ucrânia pode evitar uma catástrofe humanitária, que seria de responsabilidade da comunidade internacional.
“A Rússia usa mísseis, aviões e helicópteros contra nós, contra civis, contra nossas cidades, contra nossa infraestrutura. É dever humanitário do mundo responder”, disse ele, em discurso televisionado.
Mais de 2 milhões de pessoas fugiram da Ucrânia desde que o presidente Vladimir Putin invadiu o país há duas semanas.
A guerra rapidamente lançou a Rússia em um isolamento econômico nunca antes visto em uma economia desse porte. Os Estados Unidos proibiram na quarta-feira as importações de petróleo russo.
Empresas ocidentais também têm se retirado do mercado russo, como Starbucks, Coca-Cola e Pepsi. A mais simbólica, no entanto, é o McDonald’s, que anunciou na terça-feira que estava fechando seus quase 850 restaurantes no país. A primeira loja russa da rede, que atraiu enormes filas para a praça Púchkin, em Moscou, quando foi inaugurada em 1990, foi um emblema do fim da Guerra Fria.