Moro já chega no União Brasil gerando crise
Foto: Bruno Rocha/Estadão Conteúdo
Um dia depois de anunciar que abriria mão da pré-candidatura ao Planalto, “neste momento”, o ex-ministro Sergio Moro negou que tenha desistido da disputa presidencial e abriu uma crise no União Brasil, partido para o qual migrou na quinta-feira. Uma ala da legenda, liderada pelo secretário-geral, ACM Neto, e pelo governador de Goiás, Ronaldo Caiado, disse que pedirá a desfiliação do ex-juiz caso ele insista em concorrer à Presidência.
“Preciso esclarecer a todos que eu não desisti de nada. Muito menos de meu sonho de mudar o Brasil”, afirmou Moro à imprensa em um hotel em São Paulo. “Não tenho ambição por cargos. Se tivesse, teria permanecido juiz federal ou ministro da Justiça. Não tenho necessidade de foro ou outros privilégios, que sempre repudiei e defendo a extinção. Aliás, não serei candidato a deputado federal”, acrescentou. Questionado sobre se pretende disputar algum cargo eletivo, Moro encerrou o pronunciamento sem responder às perguntas.
Menos de uma hora depois, ACM Neto declarou que o pedido de desfiliação de Moro seria apresentado ainda ontem. “Será assinado pelos oito membros com direito a voto no partido, o que corresponde a 49% do colegiado. A filiação, uma vez impugnada, requer 60% para ter validade”, disse.
Moro se filiou ao Podemos em novembro do ano passado para ser candidato ao Planalto, mas enfrentou dificuldades dentro e fora do partido. Na quinta-feira, trocou a sigla pelo União Brasil (fusão do DEM com o PSL). A filiação de Moro foi negociada com a ala oriunda do PSL, como o presidente do União Brasil, Luciano Bivar, e o deputado Júnior Bozzella — que está à frente da legenda em São Paulo. O ex-juiz mudou o domicílio eleitoral do Paraná para São Paulo e poderia ser candidato a deputado federal.
No entanto, o setor do partido que era do DEM só aceitou a filiação de Moro com a condição de que ele deixasse de ser presidenciável. A avaliação é de que ter o ex-ministro como candidato ao Planalto atrapalharia a eleição para governadores, senadores e deputados. Caiado, em Goiás, e ACM Neto, na Bahia, são pré-candidatos a governador e querem deixar o palanque presidencial aberto. Eles temem que a vinculação com Moro prejudique suas futuras candidaturas.
Na Bahia, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem muita força. Além disso, Neto tem uma aliança fechada com o PDT, de Ciro Gomes, presidenciável crítico de Moro. Goiás é um estado ruralista, onde o bolsonarismo está muito presente.
Em seu pronunciamento, Moro falou como presidenciável. Defendeu candidatura única da terceira via e pediu “gestos de desprendimento” de Luiz Felipe d’Avila (Novo), João Doria (PSDB), Eduardo Leite (PSDB), Simone Tebet (MDB), André Janones (Avante) e de lideranças partidárias para “fazer prosperar essa articulação democrática”.
“Filiei-me ao União Brasil com a intenção de auxiliar a unificação do centro democrático. Fui a primeira liderança a fazer esse gesto político em prol da unificação do centro democrático. Não colocarei meus interesses pessoais à frente dos interesses do país”, sustentou.
Moro chegou a ser apresentado como pré-candidato à Presidência quando se filiou ao Podemos, mas enfrentava resistências no partido, sobretudo dos deputados, que não estavam dispostos a ceder parte do fundo eleitoral para a campanha ao Planalto. O ex-ministro da Justiça aparece em terceiro lugar nas pesquisas de intenção de voto.
Em nota após a desfiliação de Moro, a presidente do Podemos, Renata Abreu, disse que a saída do ex-ministro ocorreu “para a surpresa de todos”, manifestou descontentamento pelo fato de, segundo ela, ter sido informada pela imprensa de que ele migraria para o União Brasil e afirmou que continuará buscando um candidato com “firmeza de propósitos”.
Caso Moro fique mesmo fora da corrida presidencial, o mais beneficiado, a princípio, será o presidente Jair Bolsonaro, conforme destacou ao Correio o diretor de pesquisa da Quaest, Guilherme Russo. “Em primeiro lugar, as pesquisas estão mostrando que Moro não tem subido desde julho do ano passado. Ele se mantém em torno de oito, 10 pontos percentuais”, frisou. “O que esse resultado nos mostra é que tem muita gente que não sabe o que fazer se Moro não concorrer, mas o primeiro candidato a receber os votos (de Moro) é Bolsonaro.”
Na mais recente pesquisa Genial/Quaest, divulgada em 9 de fevereiro, Moro contava com 7% das intenções de voto. Caso deixasse de concorrer, o levantamento indicou que 30% de seus eleitores votariam em branco, nulo ou não votariam; 22% iriam para Bolsonaro; 15% para Lula; 11% para Ciro Gomes; 7% para Doria; 7% para Tebet; e 1% para Felipe d’Avila.
Chama a atenção o fato de 15% dizerem que migrariam para Lula. “Isso parece pouco consistente, mas é normal em uma eleição com dois candidatos fortes”, explicou Russo.
Na avaliação dele, o principal dado a ser considerado agora são os 30% de nulos ou brancos. Segundo destacou, o eleitorado de Moro é mais escolarizado do que os de Lula e Bolsonaro, por exemplo, e deve aguardar o desenrolar do ano eleitoral para tomar posições mais firmes.
“Eles esperam mais a definição da terceira via. O grande é essa soma de Ciro, Tebet, Doria. Você tem um grande grupo que vai migrar até achar um candidato. Dá para esperar que a gente tenha mais migração ainda”, disse. O diretor reforçou, porém, que os dados são de fevereiro. A próxima pesquisa será divulgada na quinta-feira.