Lula lidera segundo round das eleições
Foto: Ricardo Stuckert/Divulgação
Na minha coluna de 04/04/2022, argumentei que Jair Bolsonaro havia largado na frente e vencido o primeiro round na disputa eleitoral deste ano. Naquela época, a janela para mudanças partidárias tinha acabado de fechar, e os partidos que apoiam o presidente (PL, PP e Republicanos) haviam atraído os maiores contingentes de parlamentares no Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas.
Após quatro meses de intensas negociações, pouca coisa mudou. A campanha está na rua, mas nada de bombástico surgiu: nenhum candidato surpresa apareceu, o PSD de Kassab não se aliou formalmente a ninguém, não há frente ampla e nem terceira via. Até as intenções de voto evoluem lentamente, com alterações milimétricas, sempre dentro da margem de erro a cada rodada de pesquisas.
Com as convenções partidárias encerradas, Bolsonaro mantém a tríade de partidos do Centrão lhe dando suporte, enquanto Lula, do outro lado, manteve num amplo espectro de legendas de esquerda a sua base de sustentação. A terceira via, como esperado (vide coluna de 21/03/2022), se fragmentou entre Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (MDB, PSDB, Cidadania e Podemos), Soraya Thronicke (União Brasil) e Luiz Felipe d’Avila (Novo).
A ausência de novidades, contudo, não quer dizer que o jogo está parado. A leitura dos detalhes mostra que, no segundo round das eleições (o período entre a janela partidária e o registro das candidaturas), Lula é quem sai vencedor – mesmo sem ter partido pra cima do seu principal adversário.
O petista bem que tentou formar a tal frente ampla antibolsonarista em torno de si ainda no primeiro turno, mas fracassou em conseguir o apoio formal de grandes partidos da centro-direita, como o MDB e o PSD. O máximo que conseguiu, e ainda assim minutos antes do soar da campainha, foi o apoio de nanicos como Agir (antigo PRN de Collor em 1989), Avante (ex-PTdoB) e Pros – esse pendente de confirmação.
O apoio desses partidos praticamente sem eleitores e nenhuma densidade ideológica agrega quase nada à campanha de Lula, a não ser alguns segundos na propaganda eleitoral no rádio e na TV.
A grande sacada lulista nesse movimento foi a retirada das candidaturas de André Janones e Pablo Marçal. São figuras não identificadas com a política tradicional e com boa penetração nas redes sociais, nomes que poderiam atrair votos de cidadãos insatisfeitos com as opções oferecidas pelos grandes partidos.
Além disso, as jogadas de Lula neutralizaram as chances de crescimento de desafiantes em dois cantos do ringue. Ao unificar em torno de si praticamente todos os partidos da esquerda (PSB, Psol, PCdoB, PV, Rede e Solidariedade), o petista encurralou Ciro no PDT. E ao atrair Geraldo Alckmin para ser o seu vice, Lula rachou o PSDB, um dos pilares sobre o qual poderia ser erigida a tal terceira via.
Do lado oponente, o atual detentor do cinturão da Presidência não foi capaz de turbinar o grupo de partidos em sua retaguarda. Pelo contrário. Apoios dados como certos, como PTB, PSC e Patriotas, todos membros do Centrão, na última hora optaram ou por lançar candidato próprio (caso do primeiro, com Roberto Jefferson) ou pela neutralidade. Com isso, Bolsonaro terá alguns minutos a menos do que Lula na propaganda eleitoral.
Com o registro das candidaturas até o dia 15, o octágono ficará montado. No dia seguinte se inicia oficialmente a campanha. Há pontos de atenção que podem ser decisivos para as ambições de cada candidato.
Em primeiro lugar, é preciso dizer que a união de partidos em torno de candidaturas presidenciais não necessariamente será seguida por todos os seus correligionários Brasil adentro.
Na formação das chapas estaduais, há indícios claros de desobediência, sendo o caso mais flagrante a tendência de apoio a Lula, e não a Simone Tebet, por lideranças do MDB em boa parte dos Estados do Nordeste.
Atenção também para o posicionamento, em cada região, dos caciques dos partidos que se declararam neutros na disputa presidencial, principalmente o caso do PSD de Gilberto Kassab.
Outra dúvida que merece maior escrutínio dos analistas é descobrir até que ponto os parlamentares atuais vestirão a camisa e se tornarão cabos eleitorais para os candidatos a presidente de seus partidos.
Mais especificamente, ainda é um mistério se deputados e senadores do Centrão, agraciados com milhões do orçamento secreto, irão mesmo retribuir o presente e apoiar enfaticamente Bolsonaro nos seus redutos eleitorais.
Quanto à definição sobre a viabilidade ou não de um segundo turno, será importante verificar se a disponibilidade de tempo na propaganda eleitoral “gratuita” ainda se mostra um ativo político valioso.
Refiro-me, nesse caso, especialmente às candidaturas de Simone Tebet e Soraya Thronicke, que terão quinhões significativos na grade do rádio e da TV, mas precisam ser capazes de converter inserções publicitárias em voto.
Por fim, esse papo todo sobre articulações, coligações e apoios não faz sentido algum se não colocarmos o eleitor na equação. Levando em consideração as intenções de voto reveladas atualmente pelas pesquisas, duas perguntas se colocam.
De um lado, ainda no primeiro turno será importante descobrir qual força será mais forte: se o esforço pelo voto útil em Lula, na tentativa de uma definição já no início de outubro, ou a revelação do voto envergonhado em Bolsonaro.
No quadro geral, a principal dúvida, a meu ver, é aferir qual a percentagem de votos que Bolsonaro conseguirá arrebanhar no Nordeste com o aumento do Auxílio Brasil, as obras financiadas com emendas de relator e outros benefícios distribuídos na região.
Com o eleitorado brasileiro cada vez mais dividido em termos de idade, gênero, renda e origem geográfica, qualquer movimento pode fazer muita diferença.