Pastor “petista” quer modular discurso do PT
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Escalado no início do ano para ser o elo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com o eleitorado evangélico, o pastor Paulo Marcelo Schallenberger, ligado à Assembleia de Deus, não teve o espaço prometido dentro do PT. A menos de dois meses das eleições, ele faz críticas à campanha do petista e diz que “já passou da hora” de o ex-presidente fazer acenos mais contundentes ao público evangélico, segmento no qual Jair Bolsonaro (PL) leva vantagem e já alcança 43% das intenções de voto, dez pontos percentuais a mais que Lula, segundo a última pesquisa Datafolha, de julho.
— O Lula ainda não acenou da forma como deveria. Ele precisa falar para o evangélico. Ter ao seu lado alguém que tenha um linguajar que o evangélico entenda. Ele (Lula) acha que esse público virá naturalmente, mas falta um aceno. Abrir espaço na agenda, marcar encontro com líderes ou uma live que seja. Já passou da hora — disse Paulo Marcelo em entrevista ao GLOBO na última terça-feira.
Filiado ao Solidariedade e ex-aliado político do deputado federal bolsonarista Marco Feliciano (PL), Paulo Marcelo lamentou não ter tido o espaço desejado na campanha do petista. Em meados de fevereiro, ele foi escolhido para comandar um podcast voltado a eleitores evangélicos, mas a ideia foi postergada com a troca na comunicação da campanha e até hoje não saiu do papel. Em uma entrevista ao GLOBO no mesmo mês, ele relatou que a aproximação com o ex-presidente teve como intuito abrir canais com líderes e fiéis de igrejas e que, para isso, iria desconstruir discursos como o do pastor Silas Malafaia, aliado de Bolsonaro.
— Eu acho que falta espaço (na campanha). Pela entrega que tive e intensidade que vim para ajudar, acho que poderia ter sido aproveitado melhor. Poderia fazer um pouco mais pela campanha. O PT tem essa dificuldade, não só por eu ser evangélico, mas por ser de fora (do núcleo-duro da sigla). A Janja (mulher de Lula) e o Randolfe (Rodrigues, senador) passam por isso — afirmou Paulo Marcelo, que ainda acrescenta. — Mas essa é uma situação da campanha, e não do presidente. O Lula é o contrário. Ele quer somar. Ele que teve a ideia de trazer todos para uma frente ampla.
Apesar da falta de espaço, o pastor continua dando palpites na campanha do petista. Em uma das três reuniões que teve com o ex-presidente, sugeriu que ele adotasse um vocabulário que remeta ao universo evangélico, como em abril, quando se referiu a Bolsonaro como “fariseu” e disse que ele é um “pecador da pior espécie”. O pastor também aconselhou o petista a levar líderes religiosos em seus eventos de campanha:
— Ele sempre leva alguém do sindicato, dos movimentos negro, femininista e LGBTQIAP+. Seria importante ter algum representante dos evangélicos.
Para o pastor, é importante que o candidato petista marque encontros com líderes do segmento, como o pastor Samuel Ferreira, bispo da Assembleia de Deus do Brás e presidente-executivo da Convenção Nacional das Assembleias de Deus no Brasil, e o pastor Samuel Câmara, da Assembleia de Deus em Belém. Ambos já demonstraram interesse em abrir diálogo com o petista.
Paulo Marcelo diz que, com a falta de espaço na campanha de Lula, tem mantido diálogo com o ex-governador e candidato a vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB). Há pouco mais de um mês, os dois gravaram um vídeo juntos, em que o ex-tucano fala sobre o desemprego e a inflação no país e deixa uma mensagem aos evangélicos:
— Quero, em meu nome e do presidente Lula, agradecer, porque os evangélicos do Brasil inteiro têm um trabalho de evangelização maravilhoso, falando ao coração das pessoas. E o trabalho, pastor Paulo Marcelo, social, porque vai ao encontro de quem mais precisa, daquele que está sofrendo. Levam a palavra de conforto, a palavra de Jesus. Então o nosso agradecimento ao trabalho de vocês. Feliz a nação cujo Deus é o Senhor — disse Alckmin.
— Se o presidente fizesse um vídeo assim, seria suficiente — disse Paulo Marcelo.
O PT vem perdendo adesão do eleitorado evangélico, sobretudo após ascensão de Bolsonaro e da pauta de costumes. Uma pesquisa do Instituto Datafolha feita a nove dias do segundo turno da eleição presidencial de 2018 mostrou o capitão reformado com 59% das intenções de votos válidos entre os evangélicos, contra 41% de Fernando Haddad, então candidato petista.
Este ano, Bolsonaro tem buscado ampliar sua influência no grupo. A investida tem a ajuda da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, que esta semana participou de um culto em Belo Horizonte ao lado do presidente e no começo do mês conduziu vigília com grupo de religiosos na sede do Poder Executivo.
As pesquisas eleitorais mostram que ainda há espaço para Bolsonaro crescer, especialmente entre as mulheres evangélicas, grupo em que 34% dizem não saber em quem votará na eleição de outubro, de acordo com a pesquisa espontânea do Datafolha, na qual os entrevistados falam em quem votarão antes de serem apresentados a uma lista de candidatos.