PDT está farto de João Santana
Foto: Reprodução
Contratado pelo PDT com a missão de ajudar Ciro Gomes a furar a polarização entre Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o marqueteiro João Santana acumulou poderes que vão além da usual elaboração das estratégias de comunicação. Quase todas as decisões de campanha passam por ele: a agenda do presidenciável, a escolha da candidata a vice e até o conteúdo do programa de governo do pedetista. A extensão da atuação de Santana tem enfileirado descontentes no partido, inclusive entre integrantes do primeiro escalão.
Antes de ser registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o pacote de propostas de Ciro foi submetido a Santana, para torná-lo mais palatável aos eleitores. O GLOBO apurou que pautas amplamente defendidas pelo candidato, como a promessa de recompra de ações da Petrobras, acabaram retiradas do texto por influência do marqueteiro. Oficialmente, a campanha justificou que o programa é apenas uma diretriz, mas não comentou a retirada da medida. Procurado, Santana não se manifestou.
Por trás da escolha da vice de Ciro, a vice-prefeita de Salvador, Ana Paula Matos (PDT), teve dedo do marqueteiro. Pesaram a favor dela aspectos considerados importantes para fazer um contraponto à imagem do presidenciável. Além de ser uma mulher negra, Ana Paula tem uma fala mais calma do que a do pedetista, conhecido pelo temperamento enérgico e, por vezes, explosivo.
A palavra de Santana também é decisiva na elaboração das agendas de viagem do presidenciável. Ele tem defendido que Ciro mire os grandes colégios eleitorais. Não por acaso, desde o início do período oficial de campanha, o pedetista já visitou São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Ceará e Rio Grande do Sul, estados que concentram grande número de brasileiros aptos a votar.
Sonar: Vídeos com ataques a candidatos viralizam no TikTok e aumentam desinformação durante campanha eleitoral
Em caráter reservado, pedetistas irritados com o alcance das decisões de Santana questionam o resultado do trabalho do marqueteiro até aqui. Embora a campanha tenha começado há apenas 12 dias, e a propaganda eleitoral tenha estreado ontem, a ala dos críticos lembra que Ciro segue estagnado, sem conseguir alcançar os dois dígitos nas pesquisas de intenção de voto.
O protagonismo de João Santana contrasta com o papel desempenhado pelo marqueteiro de Ciro na disputa pelo Palácio do Planalto em 2018, Manoel Canabarro. De acordo com quem esteve nas duas campanhas, o espaço dado a Canabarro não se compara ao ocupado atualmente por Santana, que exerce uma influência maior nos passos do presidenciável.
O próprio presidente do PDT, Carlos Lupi, admite que o raio de atuação de Santana é mais amplo que o de seu antecessor na função.
— João se envolve em tudo. É um cara que vive a campanha. É quase um companheiro de partido — define.
De acordo com o presidente do PDT, Santana foi contratado no ano passado por R$ 250 mil mensais, valor posteriormente reajustado para R$ 350 mil. Um novo acordo foi firmado para o período de campanha. Lupi ainda não abre o montante que será pago ao marqueteiro. Confirma somente que ficará na casa dos milhões.
Lupi pontua, porém, que o valor não chegará perto do que o próprio João Santana ganhou na última campanha presidencial da qual participou, em 2014, quando ajudou a reeleger Dilma Rousseff, do PT. Naquele ano, recebeu R$ 70 milhões, declarados à Justiça Eleitoral.
Marqueteiro das campanhas vitoriosas de Lula em 2006 e de Dilma em 2010 e 2014, Santana retorna à raia da corrida ao Planalto depois de ter sido preso e se tornado delator da Operação Lava-Jato. Ele e a sua mulher admitiram ter recebido recursos em caixa 2, ou seja, não declaradas à Justiça Eleitoral.