CPI do MST pode investigar grilagem

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Foto: Reprodução

Com apenas sete das 27 cadeiras da CPI do MST, a base governista tem como intuito desviar o foco das invasões recentes do Abril Vermelho realizadas pelo movimento social e trazer o tema da demarcação de terras indígenas para os debates da comissão. Deputados federais aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) protocolaram nesta segunda-feira requerimentos de convocação de empresários do agronegócio cujas propriedades, de acordo com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), sobrepõem reservas dos povos originários.

Em entrevista recente ao jornal O Globo, a deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP) havia antecipado que aliados do presidente levariam o assunto ao colegiado. Até o momento, José Maria Bortoli, da empresa de soja Bom Futuro, e Renato Eugenio de Rezende Barbosa, da empresa de cana-de-açúcar Campanário S/A, são os alvos. Ex-secretário nacional de Assuntos Fundiários de Jair Bolsonaro (PL), Nabhan Garcia é o terceiro a integrar a relação.

Cunhado de Erai Maggi Scheffer, conhecido como o “rei da soja”, Bortoli é dono de uma propriedade em Sapezal, no interior do Mato Grosso. De acordo com o Incra, essa fazenda avança em 20 hectares na terra indígena Enawenê-Nawê, regularizada desde 1996. O empresário esteve ao lado de Bolsonaro e, na campanha do ano passado, destinou R$ 5 mil para a reeleição do ex-presidente.

Barbosa também integra a relação do Incra de terras que estariam transpassando reservas: no município de Laguna Carapã, no Mato Grosso do Sul, 238 hectares de sua propriedade estariam sobrepostos à terra indígena Dourados-Amambaipeguá I.

— Vamos começar por alguns invasores de terras indígenas identificados em processos de grilagem — reitera Sâmia Bomfim.

Já Nabhan Garcia deve ser ouvido sobre sua gestão ao longo do governo de Bolsonaro, quando recebeu críticas por propostas como a regularização da grilagem em latifúndios.

Em 2020, o ex-secretário apoiou uma normativa da FUNAI que permitiu certificações e registros de fazendas no Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) federal, dentro de terras indígenas ainda não homologadas — última fase da demarcação que consiste no decreto presidencial. Esta etapa não ocorreu ao longo do mandato de Bolsonaro, que foi o único chefe do Executivo a não demarcar terras desde a redemocratização.

Além das terras indígenas, a base governista busca expor empresários citados em processos de grilagem. É o caso do expoente do agronegócio do oeste da Bahia Walter Horita, um dos maiores latifundiários do país e investigado pelo Ministério Público. Dono da Horita Empreendimentos Agrícolas, exportadora individual de soja em Formosa do Rio Preto, o empresário foi citado na Operação Faroeste, que apura grilagem de terras no estado.

Outro alvo que será convocado é o empresário Nelson José Vigolo. Recentemente, Vigolo confessou, em delação premiada, ter comprado sentenças. Por este motivo, terá que devolver R$ 20 milhões aos cofres públicos.

— Queremos investigar não só a invasão de terras indígenas, mas também de áreas de preservação permanente, de grilagem de terras públicas. Sem esquecer os envolvidos e denunciados pela prática de trabalho escravo. Vamos propor a convocação de todos os que estiverem envolvidos e mostrar que quem de fato comete crimes no campo não são os trabalhadores e seus movimentos — afirma o deputado Padre João, membro titular da CPI (PT-MG).

A estratégia dos parlamentares governistas se contrapõe com a da oposição, que deve usar o colegiado como palanque contra Lula e quer ouvir ministros. Do primeiro escalão, estão na mira Flávio Dino (Justiça), Carlos Fávaro (Agricultura e Pecuária) e Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário).

A convocação de nomes como de João Pedro Stédile e do ex-MST José Rainha — atual líder da Frente Nacional de Luta Campo e Cidade (FNL) — é disputada. O primeiro é alvo de quatro requerimentos, contra três do segundo. Rodolfo Nogueira (PL-MS), Coronel Assis (União-MT) e Kim Kataguiri (União-SP) buscam aprovar a ida de Stédille para terem prioridade na hora de interrogar o convocado.

Já Messias Donato (Republicanos-ES) pede para que dois ex-ministros do Desenvolvimento Agrário prestem esclarecimento sobre as “diferentes políticas de reforma agrária adotadas pelo Governo Federal”: Raul Jungmann, que esteve à frente da pasta entre 1999 e 2002, durante o segundo mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, e Miguel Soldatelli Rossetto, titular entre 2003 e 2006, no primeiro governo Lula.

O Globo