Médicos brasileiros fariam Hipócrates corar de vergonha
Quando era mais jovem (bem, bem mais jovem) via os médicos quase como sacerdotes. Pessoas do bem, dedicadas a minorar o sofrimento humano. Ainda era criança quando, enternecido, li pela primeira vez o juramento de Hipócrates.
Hipócrates foi um ateniense que rejeitava explicações supersticiosas para problemas de saúde. Enquanto outros pensadores gregos se concentravam na natureza em geral ou na moral e na política, ele se dedicava a observar e compreender o funcionamento do organismo humano.
É atribuído a Hipócrates texto de um “juramento” utilizado hoje para a profissão de medicina, embora estudiosos afirmem que o juramento é posterior.
Abaixo, reprodução do pergaminho grafado em grego antigo que contém o “juramento de Hipócrates”.
Minha visão sobre os médicos começou a mudar lá por 2009, quando a síndrome neurológica de minha filha caçula, então com 11 anos, começou a se agravar. Durante os 4 anos seguintes, eu e a minha família viveríamos mais dentro de hospitais – em intermináveis internações da menina – do que em casa.
Foi nesse período que descobri que os médicos brasileiros formam uma casta arrogante, gananciosa e insensível. Ao longo daqueles anos, lidar com médicos naquelas longas internações requereu paciência e autocontrole para não ultrapassar a civilidade com pessoas que deixavam claro que viam minha filha como trabalho e fonte de lucro, não como um ser humano.
Os honorários que os médicos brasileiros podem cobrar são pornográficos. Consultas de poucos minutos chegam a custar um mês inteiro de salário de um trabalhador, incluídos os encargos sociais.
E, quanto mais eles ganham, mais querem ganhar. Nunca acham que ganharam o suficiente.
Há, claro, os que trabalham em hospitais públicos em longos plantões madrugada a dentro. Uma rara exceção é a de alguns poucos médicos que se esforçam para levar conforto aos pacientes e lhes salvar vidas. A maioria dos profissionais que trabalham em condições menos confortáveis, porém, é revoltada, apesar de não existirem baixos salários para médicos.
Mas a prova definitiva do espírito que permeia hoje essa profissão foi vista com a implantação do programa Mais Médicos, durante o governo Dilma Rousseff.
Vai ficar na história o comportamento selvagem de médicos brasileiros de classe alta em 2013, vaiando colegas cubanos que chegavam para suprir carência crônica de médicos nas regiões humildes, nas quais os profissionais brasileiros se recusavam a atuar mas não queriam que médicos estrangeiros atuassem.
Já em 2016, eclodiu escândalo que ficou conhecido como “máfia das próteses”. Depoimentos obtidos com exclusividade pela TV Globo revelaram o esquema desbaratado pela operação Mr. Hyde, da Polícia Civil do Distrito Federal.
Funcionários da empresa TM Medical deram detalhes aos investigadores sobre o pagamento de propina a médicos e hospitais que resultava em cirurgias e implantes desnecessários e de baixa qualidade.
O esquema incluía a reprodução de lacres falsos de próteses em uma gráfica. O material era grampeado nos relatórios de cirurgias entregues aos planos de saúde como forma de aumentar o valor ressarcido pelas operadoras. Cada lacre era “reciclado” por até 50 vezes.
Funcionário da empresa TM Medical revelou que os médicos ficavam aguardando a propina nos estacionamentos dos hospitais. No depoimento, ela também afirma que a propina é “tão comum no setor que nenhuma empresa de próteses sobrevive sem pagar 30% aos médicos”.
Há de tudo, até neurocirurgiões, especialistas cujos salários são tão enormes que permitem a esses profissionais viverem como nababos. Ainda assim, por mais e mais dinheiro implantam próteses falsas que irão torturar os pacientes operados pelo resto da vida, podendo até matá-los.
Diante de tudo isso, por que alguém se surpreenderia com o procedimento da jovem e bela médica Gabriela Munhoz, que trabalhava no hospital Sírio Libanês e acaba de ser demitida da instituição após ter sido descoberto que roubara exames de Marisa Letícia, esposa recém-falecida do ex-presidente Lula, e divulgara nas redes sociais para debochar da tragédia que acometeu a família?
Gabriela foi uma das ativistas mais furiosas contra a implantação do programa mais médicos, que permitiu que pessoas de regiões pobres que nunca tinham se consultado com um médico na vida finalmente tivessem acesso a uma consulta médica.
Por que nos chocarmos com as palavras do neurocirurgião Richam Ellakkis, do Hospital das Clínicas de São Paulo, que sugeriu em um grupo do whats app procedimentos que matariam a dona Marisa na mesa de cirurgia.
“Esses fdp vão embolizar ainda por cima. Tem que romper no procedimento. Daí já abre a pupila e o capeta abraça ela”, afirmou neurocirurgião em um grupo do whats app só de médicos, os quais se contorciam de rir enquanto elencavam meios de matar um paciente com AVC.
O Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) soltou uma nota hipócrita condenando o procedimento dos médicos supracitados, mas, ao lado do Conselho Federal de Medicina essa entidade é uma entre os grandes responsáveis pelas condutas hidrófobas da categoria.
Voltemos ao juramento que fizeram todos esses pervertidos que se regozijam com o sofrimento alheio e chegam a elaborar métodos de assassinato de seus pacientes, o “juramento de Hipócrates”. Vamos dar uma olhada na versão que o Cremesp adotou para os médicos paulistas que se formam.
Juramento de Hipócrates
“Eu juro, por Apolo médico, por Esculápio, Hígia e Panacea, e tomo por testemunhas todos os deuses e todas as deusas, cumprir, segundo meu poder e minha razão, a promessa que se segue:
Estimar, tanto quanto a meus pais, aquele que me ensinou esta arte; fazer vida comum e, se necessário for, com ele partilhar meus bens; ter seus filhos por meus próprios irmãos; ensinar-lhes esta arte, se eles tiverem necessidade de aprendê-la, sem remuneração e nem compromisso escrito; fazer participar dos preceitos, das lições e de todo o resto do ensino, meus filhos, os de meu mestre e os discípulos inscritos segundo os regulamentos da profissão, porém, só a estes.
Aplicarei os regimes para o bem do doente segundo o meu poder e entendimento, nunca para causar dano ou mal a alguém.
A ninguém darei por comprazer, nem remédio mortal nem um conselho que induza a perda. Do mesmo modo não darei a nenhuma mulher uma substância abortiva.
Conservarei imaculada minha vida e minha arte.
Não praticarei a talha, mesmo sobre um calculoso confirmado; deixarei essa operação aos práticos que disso cuidam.
Em toda casa, aí entrarei para o bem dos doentes, mantendo-me longe de todo o dano voluntário e de toda a sedução, sobretudo dos prazeres do amor, com as mulheres ou com os homens livres ou escravizados.
Àquilo que no exercício ou fora do exercício da profissão e no convívio da sociedade, eu tiver visto ou ouvido, que não seja preciso divulgar, eu conservarei inteiramente secreto.
Se eu cumprir este juramento com fidelidade, que me seja dado gozar felizmente da vida e da minha profissão, honrado para sempre entre os homens; se eu dele me afastar ou infringir, o contrário aconteça.”
“Aplicarei os regimes para o bem do doente segundo o meu poder e entendimento, nunca para causar dano ou mal a alguém”, diz o juramento em certo ponto. Alguém diria que as condutas de tantos médicos abordada acima se coaduna com esse juramento?
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PS: Estão criticando Lula por ter recebido FHC, Temer et caterva. Dizem que ao fazê-lo fragilizou o discurso do golpe. Só quero lembrar que Dona Marisa nem foi sepultada ainda. Lula está fragilizado. Não deve ter cabeça para cálculos políticos. Não chamou ninguém lá, apenas não comprou uma briga.