Professor de Direito Fernando Hiddeo explica por que Lula não deve se entregar

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Fernando Hideo Iochida Lacerda é Advogado criminalista e professor de Direito Processual Penal da Escola Paulista de Direito, mestre e doutorando em Direito Processual Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Ele também é advogado do editor do Blog da Cidadania, Eduardo Guimarães, no caso envolvendo o juiz Sergio Moro

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Como cidadão, Lula tem o direito de resistir diante de um processo inteiramente ilegal e arbitrário, por todas as medidas de exceção a que foi submetido.

Como a maior liderança política dos nossos tempos, Lula tem o dever de resistir à caçada a que tem sido submetido por um sistema de justiça manipulado pelo poder midiático e corrompido pelos interesses do poder econômico.

O direito de resistência é fruto do pensamento liberal. John Locke defendia o direito de resistir a tiranias, cabendo ao povo a prerrogativa de não se submeter a governos ilegítimos.

Diante da tirania do sistema de justiça (que frauda sistematicamente a Constituição Federal, negando-lhe vigência a pretexto de reinterpretá-la), não há outro caminho senão a resistência popular.

Do primeiro ao último ato da persecução penal, o processo contra o cidadão Luís Inácio Lula da Silva é inteiramente ilegal.

Desde as interceptações ilegais da presidenta Dilma seguida dos vazamentos em rede nacional para pressionar a votação do impeachment, passando pela condução coercitiva (contrariando textualmente o que dispõe o Código de Processo Penal, não passa de um sequestro), pelo indeferimento da produção de provas que interessavam à defesa, pela sentença desvirtuada, pelo julgamento da apelação em tempo recorde, pelo acórdão que adotou uma tese que sequer foi sustentada pela acusação, chegando finalmente aos episódios da última semana.

Manobras políticas no Supremo Tribunal Federal: a primeira do Min. Edson Fachin ao tirar o julgamento da turma (onde a vitória era certa), seguida da atuação da Min. Carmen Lúcia ao pautar o julgamento do Habeas Corpus de Lula antes das Ações Declaratórias de Constitucionalidade 43 e 44 que acabou por gerar uma pressão insustentável contra a Min. Rosa Weber.

A violação à presunção constitucional de inocência é gritante. Todos sabemos que o entendimento será alterado em breve, o que torna a prisão de Lula um escárnio. Pior ainda: o TRF4 sequer esgotou a sua jurisdição, razão pela qual a decisão do juiz de primeira instância de Curitiba é mais uma ilegalidade gritante.

Essa perseguição é o símbolo do autoritarismo contemporâneo

As engrenagens de um sistema de justiça (polícias, ministério público e judiciário), desvirtuado por uma suposta legitimação conferida pelo poder midiático e corrompido pelos interesses econômicos soberanos, reproduzem medidas de exceção que esvaziam de sentido a Constituição Federal (tese de Pedro Serrano).

A tirania judicial é a forma da ditadura no séc. XXI. Ninguém precisa de censura na era da pós-verdade: tempos em que a farda é substituída pela toga, o fuzil dá lugar ao martelo e a mordaça vira fake news.

O processo penal se transforma em campo de guerra que busca eliminar os inimigos da soberania neoliberal: sejam os pobres inúteis ou os políticos inconvenientes.

Nesse contexto, o combate à esperança de um novo governo popular é o desfecho do golpe. A figura do inimigo personifica em Lula o símbolo maior da (ainda que remota) ascensão social, econômica e cultural do povo.

Segundo a narrativa oficial do processo penal de exceção, ao invés de lutar pela universalização dos direitos fundamentais e garantias individuais a todos propõe-se o discurso da generalização do arbítrio e da porrada em nome do “fim da impunidade”.

Qualquer um que tenha estudado um mínimo de criminologia sabe que nunca há verdadeira generalização do poder penal, pois a seletividade é intrínseca ao sistema de justiça criminal.

Só o que existe é a extensão do mesmo arbítrio e autoritarismo para os representantes políticos da classe que sempre foi alvo da crueldade do poder penal.

Que não lhe falte coragem, que não nos falte disposição. Porque resistir não é uma opção, mas uma missão!