Márcio Pochmann explica como o golpe quebrou o Brasil
Após dois anos de gravíssima recessão, a economia brasileira encontra-se em ritmo de estagnação, com anomalias próprias de um capitalismo controlado por equivocado receituário neoliberal.
Em sua nova versão desde o desastre dos anos de 1990 em administrar as finanças públicas, com dívida líquida saltando de 30% para 60% do PIB entre 1995 e 2002, a atual equipe “dos sonhos do mercado financeiro” do governo Temer teima em fracassar duplamente.
De um lado, o neoliberalismo adotado voltou-se ao ataque dos direitos sociais, promovendo o desmonte das políticas públicas, com a retirada dos pobres do orçamento governamental e o rebaixamento do investimento ao menor patamar das últimas cinco décadas.
O resultado tem sido o desemprego mais abrangente, o colapso da classe média assalariada, o empobrecimento da população e o mais assustador: o dramático aumento de famílias miseráveis.
O Brasil caminha para se tornar novamente aquele país em que o sonho do mais pobre é garantir ao menos três refeições na mesa de casa.
Mesmo assim, o endividamento público cresce vertiginosamente, gerando desorganização nas finanças governamentais. Quando a presidente Dilma foi arbitrariamente retirada, a Dívida Líquida Consolidada do Setor Público, que era de 39,2% em maio de 2016, passou a equivaler, em fevereiro de 2018, a 52% do PIB.
De outro lado, a inegável incapacidade do neoliberalismo de permitir a retomada sustentada do crescimento econômico. No dia 24 de junho de 2016 (1 mês e 11 dias após o afastamento da presidenta Dilma), por exemplo, uma nota do Ministério da Fazenda de Henrique Meirelles definia o seguinte:
“A situação do Brasil é de solidez e segurança porque os fundamentos são robustos. O país tem expressivo volume de reservas internacionais e o ingresso de investimento direto estrangeiro tem sido suficiente para financiar as transações correntes. As condições de financiamento da dívida pública brasileira permanecem sólidas neste momento de volatilidade nos mercados financeiros em função de eventos externos.”
E continuava: “O Tesouro Nacional conta com amplo colchão de liquidez. A dívida pública federal é composta majoritariamente de títulos denominados em reais Além disso, o governo anunciou medidas fiscais estruturantes de longo prazo. A recente melhora nos indicadores de confiança e na percepção de risco do país reflete essas ações. Nesse contexto, o Brasil está preparado para atravessar com segurança períodos de instabilidade externa.”
Os dois anos de governo Temer indicam que —ao contrário do conjunto da sociedade— são fundamentalmente os bancos que acumulam lucros extraordinários (os três maiores bancos privados tiveram lucro líquido de R$ 53,8 bilhões em 2017, 15% superior ao de 2016).
Na mesma marcha, destaca-se o conjunto dos rentistas, que absorveu R$ 401 bilhões (6,1% do PIB) do orçamento público somente no ano passado.
É nessa perspectiva que ideólogos como Samuel Pessôa disputam, entre outros, a acirrada posição de paladinos do governo para ricos.
Assumem, como na época da Inquisição, a condição de julgadores que definem o que é o “certo”, desqualificando colegas, distorcendo argumentos e posando de falsa moral acadêmica.
Não importa que apenas cinco bilionários detenham patrimônio equivalente ao ganho da metade mais pobre dos brasileiros, tampouco reconhecer que, no país, ser rico é muito mais do que igual situação na França. O que vale mesmo é propagar o irresponsável ideário neoliberal e distorcer a realidade, sempre em defesa do governo para os ricos no Brasil.