Golpe gera fila quilométrica de desempregados em SP
O Vale do Anhangabaú, na região central de São Paulo, amanheceu mais movimentado do que de costume nesta segunda-feira (16). Retrato do desemprego que atingia 13,2 milhões de brasileiros no trimestre encerrado em maio.
A multidão se aglomerou desde cedo nas imediações do Secsp (Sindicato dos Comerciários de São Paulo) em busca de uma das 1.800 vagas formais oferecidas em mutirão realizado pela entidade em parceria com empresas.
O volume de interessados pegou a organização de surpresa. Segundo o sindicato, os primeiros candidatos chegaram já no fim da noite de domingo (15).
Ela estava de olho em vagas de operadora de caixa, área em que já trabalhou, e ele, de estoquista.
Além de fazer frente à situação do desemprego no país, a iniciativa do Secsp é uma tentativa de atrair filiados após a reforma trabalhista, em vigor desde novembro, tornar o imposto sindical facultativo e derrubar a arrecadação dos sindicatos.
“É uma resposta pela valorização do movimento sindical e um caminho para aperfeiçoarmos a relação com as empresas. Agora, com o predomínio do negociado sobre o legislado, vamos ter que amadurecer as negociações coletivas”, diz Ricardo Patah, presidente do sindicato e da UGT (União Geral dos Trabalhadores), central à qual o Secsp é filiado
O sindicato negocia também com as empresas uma oferta adicional de 500 vagas para a próxima semana.
A mudança na dinâmica do processo deixou os candidatos perdidos. Muitos se aglomeravam na porta do sindicato para tirar dúvidas e reclamavam que a comunicação confusa havia dispersado pessoas da fila.
Uma funcionária do sindicato disse que houve casos de pessoas vendendo suas senhas na fila, após terem sido atendidas.
Outros que não chegaram a tempo de se inscrever entregavam seus currículos a funcionários na porta ao longo de toda a tarde.
“É o primeiro feirão, mas o trabalho de vaga social já existe, costumamos receber currículos e encaminhar quando há vagas”, explica Cleonice Caetano, diretora do departamento de assistência social do Secsp.
Dados do IBGE de maio mostram que o país perdeu quase quatro milhões de postos com carteira assinada desde o teto em 2014, chegando ao menor nível da série iniciada em 2012.
Sindicalização
Enquanto esperavam, os candidatos eram abordados por diretores e membros do sindicato, que explicavam como seria o processo seletivo e também como funcionava a entidade. Cerca de 28 diretores e mais de 30 militantes foram mobilizados para a empreitada.
O Secsp já chegou a registrar 50 mil filiados, hoje tem 30 mil, de uma base de 400 mil trabalhadores. “Só no ano passado fizemos 150 mil homologações”, diz Patah.
Desinformação e contenção de gastos se mostraram as principais barreiras para uma eventual associação, cuja mensalidade é de R$ 30.
“É importante se filiar, mas neste momento é complicado, de onde vou tirar o dinheiro?”, questiona Ana Carolina Toneo, formada em marketing e sem emprego com carteira assinada há dois anos. “Só fiz bicos, estou aceitando a vaga que vier”, completa.
Os haitianos Louis Pierre, 38, Oska Bellevue, 41, e Jean Alix Joseph, 54, estão no Brasil há cerca dois anos.
Tiveram empregos diversos, como pedreiro e ajudante de cozinha. Bellevue considera o movimento sindical do país forte. “Ele é importante porque há empregadores que abusam, e nós não queremos problema, só queremos trabalhar”, afirma. Ele diz, no entanto, que não teria condições de pagar para se associar.
O viúvo Arnaldo José Correra, 60, já foi filiado ao sindicato dos taxistas por dois anos, mas desistiu porque achava que a entidade “não fazia nada”.
“Precisaria saber como está o sindicato [dos comerciários], como funciona e quais são os benefícios para pensar em me filiar. O sindicato é importante se ajudar o trabalhador”, afirma. Ele está desempregado desde novembro e, segundo Arnaldo, faltam dois anos para que consiga se aposentar.
Ícaro de Oliveira, 18, que busca o primeiro emprego, se diz mais cético. “Prefiro não me filiar, acho que o sindicato é relevante para alguns, mas não para todos”, afirma.
“É uma categoria difícil de filiar, porque é dispersa e tem uma rotatividade grande. Além disso, há muitas pequenas empresas em que a relação do trabalhador e do patrão é muito próxima, muitos acabam não se associando por medo”, diz Patah.
Dentro do prédio do sindicato, candidatos se deslocavam de um andar a outro, participando em sequência de vários processos seletivos.
Vivian Donato, 42, é professora e está desempregada há três anos. Enquanto espera abertura de concurso para a rede pública, se candidatou para vagas diversas no mutirão.
“Achei uma boa iniciativa, eu me sindicalizaria se passasse no processo”, afirma.
Seleção
De acordo com Patah, a maioria das vagas disponíveis no mutirão tem um salário médio de R$ 1.300. “Queremos diversificar com vagas de até R$ 5.000 futuramente.”
O recrutamento acontece até as 17h na sede do sindicato (Rua Formosa, 99) em São Paulo. Há vagas como de operador de caixa e vendedor em grandes redes de farmácias, materiais de construção e supermercados, entre outros.
Os departamentos de recursos humanos das companhias estão no sindicato para iniciar o processo seletivo dos candidatos, com entrevistas e análise de currículo.
O candidato deve apresentar RG, CPF e comprovante de residência, além de seu currículo.
No Carrefour, por exemplo, a etapa no sindicato envolve um teste com 12 questões de português, matemática e conhecimentos gerais e uma redação. Até sexta-feira (20), quem passar será chamado para uma dinâmica e entrevistas com os gerentes das lojas.
Algumas empresas, como redes de supermercados, aceitam candidatos sem experiência ou ensino médio. Outras são mais restritivas, como a Clovis Calçados, que busca profissionais que já tenham trabalho no segmento.
Há também um posto do CAT (Centro de Apoio ao Trabalhador) no local para a emissão de carteira de trabalho para quem ainda não tiver o documento —é necessário apresentar RG ou outro documento oficial, orienta o sindicato.
Com informações da Folha de S.Paulo.