Crise política e democrática faz dólar disparar
Um olho no Brasil e outro no exterior. Esta é a postura recomendada para o investidor que deseja minimizar perdas num mercado tomado pela volatilidade pré-eleitoral, que está mais intensa neste ano do que em campanhas anteriores e tende a se intensificar até outubro, mês da votação.
Os cuidados dizem respeito sobretudo ao câmbio, porque profissionais do mercado veem incertezas políticas levando o dólar a R$ 4,20 até sair o resultado eleitoral —ou ainda a R$ 4,50, no cenário mais pessimista, com um pano de fundo externo desfavorável.
Na semana passada, o dólar rompeu a barreira de R$ 4 pela primeira vez desde fevereiro de 2016 e chegou a fechar em R$ 4,124.
O último Boletim Focus, pesquisa do Banco Central com economistas, no entanto, projeta que a moeda fechará 2018 e 2019 a R$ 3,70.
“O Focus retrata que, independentemente de quem ganhe a eleição presidencial, terá que fazer alguns ajustes do ponto de vista fiscal”, afirma Conrado Navarro, especialista em finanças pessoais da Modalmais.
Na conta dos mais otimistas com o câmbio entra a perspectiva de que um candidato pró-mercado será eleito. O nome de preferência dos investidores até o momento é o de Geraldo Alckmin (PSDB).
Pesquisas mostrando que a candidatura do tucano ainda não deslanchou como o esperado, porém, chacoalharam o mercado na última semana, ao mesmo tempo em que investidores começaram a colocar na conta a possibilidade de um candidato do PT chegar ao segundo turno.
A Anbima (associação das entidades de mercado) aponta que a oscilação do dólar no período próximo à campanha eleitoral está maior neste ano do que no mesmo intervalo de 2006, quando Lula (PT) foi reeleito, de 2010, que levou Dilma Rousseff (PT) à Presidência, e até de 2014, quando a petista foi reeleita na disputa mais polarizada da história política recente do país.
Entre julho e agosto deste ano, por exemplo, o real já perdeu quase 6% em relação ao dólar. Em 2014, recuou 3,4%.
A instabilidade pré-eleitoral só perde, até o momento, para 2002, quando a corrida presidencial que levou Lula ao Planalto pela primeira vez fez o dólar atingir a marca inédita de R$ 4.
Vale lembrar que, trazendo a valores presentes, seria necessário o dólar passar de R$ 10 para ser equivalente à situação registrada em 2002, apontam cálculos de Einar Rivero, da empresa de informações financeiras Economatica.
A Anbima observa, no entanto, que a trajetória volátil do câmbio tende a se acirrar em outubro, mês da votação.
“A evolução do câmbio é condicional à evolução da campanha e, consequentemente, das pesquisas. Chegar a R$ 4,50 neste ano é possível, mas está associado a fatores eleitorais somados a uma piora da percepção de risco no exterior”, diz José Pena, economista-chefe da Porto Seguro Investimentos.
Para ele, um cenário externo adverso inclui investidores mais avessos a países emergentes e um ritmo inflacionário acelerado nos Estados Unidos suscitando o temor de que o banco central americano suba os juros mais rapidamente. Taxas elevadas na maior economia do mundo fortalecem o dólar ao atrair fluxo de capital para o país.
Alessandra Ribeiro, sócia e diretora da área de macroeconomia e política da consultoria Tendências, trabalha com a premissa de que o cenário externo permanecerá sob controle, com a economia mundial crescendo em ritmo bom e o BC dos EUA ajustando suas taxas sem surpresas ao mercado —são previstas mais duas altas para o ano, em setembro e dezembro.
“O dólar aqui está bem descolado do cenário externo, por isso, passando as eleições, acho que tem espaço para uma boa devolução”, diz Ribeiro, que tem como cenário base um dólar a R$ 3,50 no fim do ano. O recuo, no entanto, está relacionado à vitória de um político que dê continuidade a reformas fiscais.
Esse é um dos fatores que o investidor deve ter em sua conta após a conclusão do pleito. “Se evoluirmos para um cenário com mais reformas, o real ganha, senão o câmbio pode se depreciar”, diz Julia Gottlieb, economista do Itaú Unibanco. O banco é mais conservador em suas previsões e projeta um dólar a R$ 3,90 para o fim de 2018.
Apesar do viés de alta, Pena ressalta não ser possível afirmar categoricamente que essa é a tendência até outubro.
“Conforme avançarmos no tempo e a propaganda eleitoral na TV começar, a disputa pode se afunilar e os cenários ficarem mais claros”, diz.
A campanha eleitoral na televisão tem início na próxima sexta-feira (31). “Reflexos não devem aparecer logo de cara, fala-se em dez dias para começar a ter efeito em pesquisa”, observa Ribeiro.
Da FSP.