Alckmin fez Estado mais rico ir mal na Educação
Na semana passada, em entrevista ao Jornal Nacional, Geraldo Alckmin (PSDB), candidato a presidente e ex-governador, disse que o estado de São Paulo tem a melhor educação do país. Não tem mais.
A rede de ensino paulista perdeu a liderança no principal indicador de qualidade da educação básica, ficando para trás tanto em duas etapas do ensino fundamental quanto no ensino médio, onde a situação é mais grave.
Essa radiografia aparece no mais recente Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação), de 2017, produzido a cada dois anos e divulgado nesta segunda-feira (3) pelo governo federal. Na edição anterior, em 2015, São Paulo liderava nos anos iniciais (5º ano) e nos finais (9º ano) do ensino fundamental e também no ensino médio.
No ensino médio, a rede estadual de São Paulo teve queda no Ideb, passando de 3,9 para 3,8 —espera-se que algum dia o país alcance o índice 6. Com esse resultado, o ensino médio de São Paulo foi ultrapassado por Goiás, Espírito Santo e Pernambuco e ficou empatado com Ceará e Rondônia.
Apesar desse empate, só São Paulo teve queda no indicador entre os mais bem posicionados em 2017. A rede paulista é um dos dez estados que caíram no ensino médio. Em 2015, São Paulo liderava empatado com Pernambuco nesta etapa.
O Ideb é calculado a partir de dois componentes: a taxa de aprovação das escolas e as médias de desempenho dos alunos em uma avaliação federal de matemática e português. Os dados das provas foram conhecidos na semana passada, e as notas da rede paulista no ensino médio também caíram nessas duas disciplinas.
O estado mais rico do país é governado pelo PSDB desde 1995. O ex-governador Geraldo Alckmin, que deixou o cargo neste ano, é candidato do partido à Presidência da República. Alckmin governou São Paulo de 2001 a 2006 e depois de 2011 a abril de 2018, quando se afastou para disputar a corrida ao Planalto.
O ensino médio é apontado como um dos maiores gargalos do país. Redes estaduais são responsáveis por 8 a cada 10 matrículas na etapa. Dos 3,8 milhões de alunos da rede paulista, a maior do país, 40% (1,5 milhão) são de ensino médio.
Já no ensino fundamental, São Paulo avançou no Ideb nos anos iniciais (5º ano) e finais (9º anos). Mas o tímido avanço não foi suficiente para se manter no topo e acabou ultrapassado por outras redes, cujos saltos foram maiores.
O indicador de SP nos anos iniciais passou de 6,3 para 6,5. Entre as redes estaduais, foi superado por Ceará e Goiás e ficou empatado em terceiro lugar com Minas Gerais.
Nos anos finais do fundamental, o Ideb da rede paulista teve um leve aumento, de 4,7 para 4,8. O índice é superado por Goiás e Rondônia e fica empatado com Santa Catarina (que, por sua vez, tem melhores notas em matemática e português).
O Ideb também estipula metas a cada edição. São Paulo só bateu a meta de 2017 nos anos iniciais. A rede não alcançou seu objetivo tanto na segunda etapa (9º ano) do fundamental quanto no ensino médio.
A liderança no Ideb 2015 nas três etapas da educação básica tem sido usada recorrentemente pelo governo estadual como argumento da qualidade das escolas estaduais, sobretudo para responder a críticas de problemas na rede.
Nos últimos anos, a gestão Alckmin esvaziou programas como o de alfabetização e de reforço presencial para alunos com dificuldades. Em 2015, o governo tentou realizar uma reorganização, que previa o fechamento de mais de 90 escolas, que acabou sendo suspensa após uma onda de ocupações de escolas por alunos.
Embora Alckmin tenha repetido que o estado investe 31% das receitas em educação, o governo paulista tem incluído nos últimos anos gastos com aposentados como sendo para manutenção de ensino.
Só em 2016, R$ 5,1 bilhões declarados como investimentos em educação foram, na prática, repasses para aposentadorias. Ao excluir o orçamento das universidades estaduais, a educação básica recebeu 19% da receita total do estado (em 2016).
Política educacional central das sucessivas gestões tucanas em São Paulo, o bônus por resultado na rede escolar não tem promovido melhorias no desempenho dos alunos do estado, conforme avaliação do próprio do Governo de São Paulo. Advertências para correções, presentes em relatórios internos, têm sido ignoradas pelo menos desde 2011 pela cúpula do governo e pela Secretaria Estadual da Educação.
Secretário de Educação do estado até o início deste ano, o desembargador José Renato Nalini criticou à Folha o sistema de bônus e disse que não teve respaldo para alterá-lo. Sem histórico na educação, Nalini foi levado ao cargo por Alckmin em 2016 após as ocupações das escolas.
A rede paulista administra 5,3 mil escolas em todo estado, o que indica uma complexidade de gestão desafiadora. O estado registra a melhor taxa de atendimento escolar no ensino, com 78,5% de taxa líquida na etapa (que mostra o percentual de jovens de 15 a 17 anos matriculados). Apesar de ainda estar longe da universalização, a taxa no Brasil é bem pior, de 62,7%.
A assessoria de imprensa de Geraldo Alckmin defendeu em nota que o Ideb do ensino fundamental mostra que a educação do estado está no caminho correto.
“A perda de posições no ranking elaborado pela imprensa aponta que, apesar do crescimento paulista, outros estados avançaram mais, o que é positivo para o país”, diz a nota.
Sobre o ensino médio, Alckmin assinalou que a variação negativa foi de apenas 0,1 para baixo. “É notório que todo o Brasil está estagnado, com um modelo que não mais atrai o interesse dos alunos”.
Vice de Alckmin, Márcio França (PSB) assumiu o governo após a saída do ex-governador. França é candidato à reeleição ao Palácio dos Bandeirantes.
Em nota, a Secretaria de Estado da Educação afirmou que “os resultados do Ideb 2017 evidenciam a necessidade de aperfeiçoar os ensinos fundamental e médio. “A pasta reconhece resultados importantes, o esforço dos profissionais da rede estadual, porém, ações como a valorização do professor e o investimento em tecnologia de ponta, com lousas digitais, são fundamentais para avançar a qualidade do ensino”, informou em nota.
Procurado, o ex-secretário de Educação do Estado entre 2016 e 2018, José Renato Nalini, preferiu não comentar os resultados.
A pasta cita ações planejadas para o ano que vem relacionadas a ensino a distância. A secretaria de Educação ainda ressalta que enviou para a Assembleia Legislativa um novo concurso para contratação de 15 mil professores para atuarem nos anos finais do fundamental e no ensino médio.
Goiás assumiu a liderança do Ideb em 2017 no ensino médio, posição que já havia ocupado na edição de 2013. Foi o único estado que bateu a meta em 2017 nesta etapa entre as redes estaduais de todo país.
O estado tem os melhores resultados de aprovação de alunos, mas é o Espírito Santo que registra as maiores médias na avaliação dos alunos. Mesmo entre os líderes, os indicadores se mantêm em níveis baixos e o cenário geral é de estagnação. Entre 2007 e 2017, somente quatro redes estaduais conseguiram fazer com que seus alunos tivessem avanços significativos em matemática e português.
A média do Ideb no ensino médio das redes estaduais ficou estagnada em 3,5. Abaixo da meta, de 4,4.
Nos anos iniciais, a média das escolas públicas subiu de 5,3 para 5,5, superando a meta de 5,2. O Ideb dos anos finais também avançou, de 4,2 para 4,4, mas não chegou na meta para 2017, que é 4,7.
Em entrevista, o ministro da Educação, Rossieli Soares Silva, voltou a ressaltar a gravidade dos resultados, sobretudo dos anos finais e ensino médio.
Sobre os resultados do fim do ensino fundamental: “Desde 2013 não cumprimos mais as metas. Não só não cumprimos a meta, como estamos nos afastando dela”, disse o ministro.
O governo Michel Temer tem usado os resultados negativos do ensino médio para argumentar em favor da urgência de se aprovar o texto referente a essa etapa da Base Nacional Comum Curricular.
“Há uma necessidade muito grande de que a gente logo faça mudanças estruturantes para o ensino médio”, disse o ministro durante entrevista em Brasília nesta segunda-feira (3). “A chance de alcançarmos as metas estabelecidas é nula hoje no Ensino Médio. Neste ritmo, não cumpriremos as metas para 2021. Atreveria dizer que, se continuarmos neste ritmo, não cumpriremos em décadas”.
A base nacional define o que os alunos devem aprender na educação básica e vai orientar currículos locais e livros didáticos, por exemplo. A parte da base que fala da educação infantil ao ensino fundamental já foi finalizada e estados e municípios têm discutido as adaptações curriculares. O bloco do ensino médio continua em discussão no CNE (Conselho Nacional de Educação).
O texto do ensino médio tem sido criticado e há o risco de não ser aprovado neste ano no CNE. A definição da base tem ligação direta com a reforma do ensino médio, aprovada por medida provisória pelo governo Temer em 2017. A reforma prevê flexibilização curricular e só passa a valer depois da aprovação da base.
Com a reforma, o ensino médio passa a ser organizado com uma área comum, referente a 60% da carga horária, e uma segunda parte a ser escolhida pelo aluno a partir de cinco áreas: ciência humanas, ciências da natureza, matemática, linguagens e educação profissional.
Essa flexibilização curricular sempre foi apontada com um dos caminhos para melhorar o ensino médio. Há receio, entretanto, sobre a capacidade de todas as escolas e redes oferecerem uma variedade de itinerários, dado opções a todos os alunos. Mais de metade dos municípios do país só tem uma escola de ensino médio, dificultando a oferta de cinco opções para os estudantes
O Ideb também é calculado por escola —a edição de 2017 foi a primeira em que os dados foram destrinchados por unidades de ensino médio. Até 2015, somente as escolas de ensino fundamental tinham esse tipo de informação e no ensino médio o indicador era produzido por amostra.
Da FSP.