Reitor da UFSC entrega a Jungmann evidencia de crime da Lava Jato
O reitor da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Ubaldo Cesar Balthazar, entregou nesta quinta (13) ao ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, um memorial contendo relatos e documentos sobre a operação Ouvidos Moucos, deflagrada pela Polícia Federal há exatamente um ano prometendo desmantelar uma quadrilha que desviava verba de bolsas de estudo na universidade.
Na manhã do dia 14 de setembro de 2017 policiais federais prenderam seis professores e o reitor da UFSC, Luiz Carlos Cancellier de Olivo. À frente da operação estava a delegada Erika Mialik Marena, ex-integrante da Lava Jato em Curitiba.
Dezoito dias após a prisão, que durou cerca de 36 horas, o reitor Cancellier se atirou do sétimo andar de um shopping de Florianópolis. Ele trazia no bolso um bilhete que dizia que sua morte havia sido decretada no dia em que foi afastado da universidade. Até hoje, cinco dos seis professores alvos da operação continuam impedidos de frequentar a UFSC.
Eles foram indiciados pela PF, mas o Ministério Público Federal ainda não decidiu se os denuncia ou arquiva as acusações contra eles.
O documento entregue pelo reitor Balthazar ao ministro Jungmann é dividido em duas partes. A primeira, trata de fatos relativos à corregedoria UFSC, responsável por uma investigação entregue à Polícia Federal e que subsidiou para as acusações contra Cancellier e outros professores.
Na segunda parte estão relatos sobre os acontecimentos dos dias 14 e 15 de setembro, as reações institucionais, o papel de diferentes autoridades no processo, relatos sobre as condições em que os acadêmicos foram presos, interrogados e encarcerados.
E, por fim, o processo que envolve a denúncia do MPF contra o reitor e o chefe do gabinete da reitoria, Aureo Mafra de Moraes, acusados pela PF e o Ministério Público Federal de atentar contra a honra da delegada Erika Marena. As acusações contra os dois foram baseadas em duas entrevistas dadas por eles durante o evento de aniversário de 57 anos da universidade.
Ambos lamentaram a morte de Cancellier, que foi homenageado no dia, mas não se referiram em momento algum à delegada, à Polícia Federal e a nenhum dos investigadores. Mas como atrás dos entrevistados havia manifestantes com cartazes protestando contra supostos abusos na Ouvidos Moucos eles foram incriminados.
A prova usada pela PF para apontar o crime foi um vídeo da TV UFSC, feito por alunos, com a cobertura jornalística do evento. A reportagem dura pouco mais de dois minutos.
Balthazar e Aureo foram indiciados e depois denunciados pelo procurador Marco Aurélio Aydos acusados de injúria por supostamente atentarem contra a “honra funcional” da delegada Erika Marena.
O procurador entendeu que ambos cometeram crime de injúria porque poderiam ter coibido os protestos e não deveriam ter se exposto diante da faixa.
A juíza Simone Barbisan Fortes, da 1ª Vara Criminal Federal de Florianópolis, rejeitou a denúncia justificando que “a manifestação indicada na denúncia estaria dentro do exercício da liberdade de expressão”. O procurador recorreu da decisão.
A corregedoria do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) abriu uma reclamação disciplinar para apurar a conduta do procurador Aydos.
O corregedor do órgão, Orlando Rochadel, atendeu ao pedido do conselheiro Leonardo Accioly da Silva, feito na terça (11) para apurar se o procurador censurou a liberdade de expressão dos acadêmicos, conforme informou o Painel na quarta (12).
Nesta fase da investigação, a corregedoria pede mais informações sobre o episódio antes de decidir se instaura, por exemplo, um Processo Administrativo Disciplinar, por exemplo.
“Entendo que, diante da gravidade dos fatos, a Corregedoria Nacional deste Conselho Nacional deve tomar conhecimento, para, se o caso, instaurar o procedimento que entender adequado, a fim de apurar se o Procurador da República, Marco Aurélio Dutra Aydos, com consciência e vontade, desviou-se do interesse público e se utilizou do cargo público por ele ocupado para censurar a liberdade de expressão de acadêmicos, docentes e servidores da UFSC, movimentando todo o aparato de Justiça criminal para tutelar interesse próprio, com base em sentimento pessoal de justo ou injusto”, disse o conselheiro.
Em abril, a PF concluiu o relatório final da Ouvidos Moucos indiciando 23 pessoas. O documento é assinado pelo delegado Nelson Napp, que acusou Cancellier de ter chefiado um esquema criminoso e diz ele só não está entre os indiciados por ter morrido.
Nas 817 páginas do relatório não há provas de que o ex-reitor tenha se beneficiado de qualquer esquema de desvio de verbas na universidade. Os desvios, segundo a investigação, teriam acontecido entre 2008 e 2016. Cancellier, porém, foi o único reitor incriminado pela PF, apesar de ter assumido a direção da universidade apenas em maio de 2016.
Os reitores que comandaram a UFSC nos oito anos em que a suposta quadrilha atuava, Alvaro Toubes Prata (2008 a 2012) e Roselane Nekel (2012 a 2016), não são alvo das acusações do delegado.
Segundo a reitoria da UFSC, o ministro Raul Jungmann disse que irá fazer os “encaminhamentos necessários para apurar as responsabilidades dos diferentes órgãos envolvidos”. A Polícia Federal e o Ministério Público Federal ainda não responderam o pedido da Folha para que comentem o envio do documento ao ministro Jungmann.
Da FSP.