Mesmo terminada a eleição, bolsonaristas seguem divulgando fake news
Imagens e vídeos enganosos que foram bloqueados nas redes sociais a pedido do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) continuam no ar em outros endereços, com alto número de interações – às vezes até maior do que as do conteúdo removido. O Estado identificou pelo menos dez casos em que, mesmo com a determinação judicial, o conteúdo foi compartilhado por outros usuários da rede social, mantendo o engajamento na internet em torno de informações comprovadamente falsas.
Um dos casos mais emblemáticos é o do vídeo em que o agora presidente Jair Bolsonaro fez ataques ao suposto “kit gay” – apelido pejorativo dado a uma cartilha do Ministério da Educação contra a homofobia. O vídeo principal, que foi gravado há três anos e voltou a circular durante a campanha, tem mais de 280 mil compartilhamentos e ainda está disponível no perfil oficial de Bolsonaro.
Em 16 de outubro, o ministro Carlos Horbach, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ordenou a remoção de seis postagens do vídeo no YouTube e no Facebook. Nelas, Bolsonaro criticava o livro Aparelho Sexual e Cia. e dizia que a obra havia sido levada a escolas públicas no período em que Fernando Haddad (PT) era o ministro da Educação. O vídeo dizia ainda que o livro estimularia crianças a se interessar por sexo precocemente.
Como ficou comprovado posteriormente, o ministério nunca adquiriu ou distribuiu esses livros. Horbach, em sua decisão, disse que “a difusão da informação equivocada de que o livro em questão teria sido distribuído pelo MEC gera desinformação no período eleitoral, com prejuízo ao debate político, o que recomenda a remoção dos conteúdos com tal teor”.
O problema é que os links apontados na ação não eram da página de Bolsonaro, mas somente nte de usuários que compartilharam tal conteúdo. Em consulta feita no dia 21 de novembro, a publicação tinha mais de 20 mil comentários e 160 mil reações.
Também seguem no ar, em diferentes links, vídeos idênticos a um que foi removido do YouTube a pedido da equipe de Bolsonaro. Trata-se de um falso jingle de campanha, com a música Meu País, de Zezé di Camargo e Luciano. A reportagem encontrou ao menos cinco cópias, que somam mais de 100 mil visualizações.
Em outro caso, a Justiça deferiu pedido para que fosse removida postagem em que consta uma frase falsamente atribuída a Bolsonaro, de que ele não precisaria dos votos dos nordestinos. A postagem original foi removida, mas há pelo menos outros dois perfis com o mesmo conteúdo publicado.
Como não existe uma censura automática sobre o conteúdo em si, não é ilegal, segundo especialistas, a prática de salvar conteúdo removido e posteriormente repostá-lo em outras páginas. Os links removidos a pedido da Justiça, na verdade, ficam apenas bloqueados em computadores brasileiros. No exterior, todos estão acessíveis, assim como para qualquer pessoa que use ferramenta que mascare seu endereço IP. Isso facilita a replicação do conteúdo, mesmo depois de bloqueado.
No dia 6 de outubro, por exemplo, a Justiça determinou a remoção de 35 links com informações consideradas comprovadamente falsas sobre o então candidato petista a presidente, Fernando Haddad, entre elas um vídeo dizendo que, quando prefeito, ele havia distribuído mamadeiras com o bico em formato de órgão genital masculino em creches de São Paulo – o que nunca aconteceu. O Estado encontrou pelo menos duas cópias do vídeo no Facebook, com mais de 5 mil compartilhamentos.
Em nota, a assessoria de apoio aos ministros substitutos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) informou que o órgão procurou agir “com a menor interferência possível no debate democrático”. “Se, por um lado, foi necessário assegurar a igualdade de condições entre os candidatos, por outro os juízes eleitorais tiveram que assegurar a liberdade de expressão, evitando qualquer tipo de censura. A legislação eleitoral limita a remoção de conteúdo na internet às situações em que são constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos dos que participam do processo eleitoral”. A apreciação das ações, disse o TSE, se deu por meio dos links específicos enviados pelos autores dessas ações.
O Facebook disse que “respeita a Justiça brasileira e cumpre decisões judiciais de remoção de conteúdo específico, nos termos da lei eleitoral e do Marco Civil da internet”. Jair Bolsonaro e Fernando Haddad não se manifestaram.
Do Estadão