Aquecimento global tem que ser tratado como questão política
O aquecimento global está levando o planeta a uma situação crítica. Catástrofes climáticas como incêndios florestais, secas prolongadas, inundações e canículas intensas estão acontecendo, com risco de uma aceleração que acarretaria funestas consequências para a humanidade.
Embora só recentemente o problema do aquecimento global tenha chegado aos foros econômicos e diplomáticos, na verdade já vinha sendo estudado por cientistas importantes há quase dois séculos.
Em 1824, o matemático francês Joseph Fourier conjecturou que “a temperatura da Terra aumenta porque a radiação solar encontra menos obstáculos para penetrar no ar na forma de luz, do que para sair, depois de convertida em calor”.
Em 1896, o químico sueco Svante Arrhenius — ganhador do Prêmio Nobel de 1903 — mostrou que o aumento da concentração de ácido carbônico na atmosfera provoca uma elevação da temperatura do solo. Arrhenius se referia ao composto formado pela reação de gás carbônico (CO2) com a água (H2O) contida na atmosfera (umidade absoluta), reação esta que produz ácido carbônico (H2CO3).
Isto acontece porque a radiação solar em seu espectro completo atravessa a atmosfera e aquece o solo, que reemite apenas as radiações infravermelhas (faixa térmica do espectro). Como o gás carbônico é opaco a estas radiações, elas ficam retidas na atmosfera, aquecendo-a. Daí o nome “efeito estufa”.
Medições cada vez mais acuradas, que vêm sendo feitas há mais de um século, evidenciam uma correlação entre o aumento da temperatura média da atmosfera e as crescentes emissões de CO2, que, como se sabe, decorrem do uso de combustíveis fósseis. Isto deixa claro que as causas do aquecimento global são em grande parte antrópicas.
Uma das consequências do aquecimento da atmosfera é que o ar próximo à superfície marinha se aquece, provocando o derretimento da camada de gelo. Com isto, parte da energia térmica armazenada no Oceano Atlântico (que também está mais quente) é transferida para o norte. Este fenômeno provoca a diminuição da camada de gelo em toda a Região Ártica, reduzindo-a a valores que chegaram aos mínimos registrados nos últimos verões, aumentando o risco de incêndios na floresta boreal, com reflexo adicional sobre o ciclo do carbono.
Agrava-se então o efeito estufa, causando um sensível aquecimento da atmosfera, com consequências sociais, econômicas e ambientais que podem ser catastróficas.
A simples explicação teórica do problema de pouco serve, se os responsáveis políticos nada fizerem para evitá-lo. Para que se chegue a resultados práticos, a questão deve ser enfrentada por representantes de países que, de fato, tenham poder para controlar o uso de combustíveis fósseis e reduzir as emissões de gases de estufa.
Daí a importância das reuniões multilaterais, com a participação dos países membros da ONU. Em 2015, os representantes dos 195 países que participaram da reunião de Paris estabeleceram metas para reduzir as emissões de gases de estufa, tendo os respectivos governos assumido o compromisso de respeitar as metas acordadas.
O único meio ao alcance dos governos para reduzir tais emissões é adotar modelos econômicos baseados em matrizes energéticas livres de combustíveis fósseis. É uma questão, ao mesmo tempo, técnica, econômica e, sobretudo, ética, palavra cujo significado o presidente americano mostrou ignorar, quando — desonrando o compromisso assumido anteriormente pelo próprio governo americano — retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris.
Assim, é preocupante que o futuro chanceler brasileiro, um grande admirador do presidente americano, tenha avançado em seu blog uma opinião anticientífica e, mesmo, infantil, como a seguinte: “a esquerda sequestrou e perverteu a causa ambiental, criando a ideologia da mudança climática, também chamada de climatismo”.
Do O Globo