Hoje, no fim de 2018, o cenário político brasileiro é desalentador
Em fevereiro de 2017, ao dar início à colaboração regular neste espaço, escrevi: “Foi um espetáculo triste. Uma sucessão de equívocos. Ninguém se salvou. A elite brasileira se esmerou em tomar as piores decisões possíveis. Foi um verdadeiro festival.” Assim avaliava o ano anterior, ano no qual as elites do país haviam flertado com o desastre.
As perspectivas para o ano que se abria eram sombrias. Não havia razões para otimismo. Ainda assim, era impossível imaginar o que estava por vir, como as conversas entre Michel Temer e Joesley Batista na garagem do Jaburu e o julgamento da chapa Dilma-Temer. O festival tomou proporções dantescas, uma verdadeira descida ao inferno.
Mas não há nada que não possa piorar. O fundo do poço é inalcançável. Sempre há como cavar mais um pouquinho. Hoje, no fim de 2018, o cenário político é mais desalentador do que era no início de 2017. A eleição de Jair Bolsonaro é o ponto culminante desta sucessão de erros e equívocos. A elite brasileira, e não só a politica, caprichou. Todos, sem exceção, contribuíram e o resultado está aí. Nunca a equipe inicial montada por um presidente reuniu tantos nomes inexpressivos e sem experiência. O despreparo de Bolsonaro e sua trupe para dar conta das tarefas básicas da administração são evidentes. Para governar, é preciso mais do que convicções ideológicas e disposição para criar polêmicas.
Eleição de Bolsonaro é consequência da luta das elites Bolsonaro não foi eleito por seus méritos ou em razão do programa que defende. Venceu porque ocupou o espaço deixado pela luta fratricida no interior da elite política que governou o país desde a redemocratização. O impeachment de Dilma Rousseff antecipou a alternância no poder ‘programada’ para 2018. A coalizão MDB-PSDB assumiu carregando as promessas de regeneração da política e retomada do crescimento. Não entregou nem uma coisa nem outra. O governo Temer foi um fracasso rotundo, contribuindo para aprofundar a crise. A população foi em busca de alternativas e Bolsonaro foi a que restou.
Em outras palavras, é duvidoso que Bolsonaro tenha vencido pelo seu programa, pelas ideias que defende, até porque o grande trunfo da sua campanha foi o silêncio. Contudo, independentemente das razões que levaram Bolsonaro ao poder, as consequências da sua vitória são incontroversas. O consenso reformista pós-redemocratização, a ênfase na eliminação do que se convencionou chamar de dívida social do país, foi derrotado. Os que rechaçaram este programa, os conservadores, venceram e a eles cabe governar. A questão é se saberão fazê-lo. Todas as indicações disponíveis apontam para uma resposta negativa.
O programa politico do presidente eleito, passada a eleição e com a posse se aproximando, continua nebuloso, para não dizer inexistente. A sua equipe de transição nada anunciou de concreto. Tome-se o caso da Saúde e da Educação como exemplos. Os nomeados desapareceram com a mesma rapidez com que foram retirados do anonimato pelo convite presidencial. Ninguém sabe o que pensam e, mais interessante, ninguém parece querer saber. Nenhum dos dois foi procurado por jornais para conceder entrevistas e expor seus planos. Já o das Relações Exteriores, o melhor seria que seguisse o exemplo dos colegas, pois a cada pronunciamento cria um foco de incêndio. Os exemplos se multiplicam. O despreparo e inexperiência da equipe formada são patentes.
Nem mesmo Paulo Guedes e Sergio Moro, as celebridades do ministério, foram capazes de emitir sinais claros e tranquilizadores do que será o governo. O superministro da economia se recolheu depois de uma desastrada entrevista coletiva. Pouco se sabe de concreto sobre quais são suas propostas para enfrentar as questões urgentes, como a reforma da previdência e a tributária. Não faltam propostas elaboradas por especialistas de renome para enfrentar ambas as questões, mas a equipe de Guedes não se pronuncia de forma clara sobre quaisquer delas. Aparentemente, até o momento, tudo que equipe tem feito é desenhar e redesenhar o organograma das pastas da área.
A outra estrela do governo, o juiz Sergio Moro, tudo quanto fez de concreto foi engolir sapos. Ao aceitar o cargo, afirmou que vinha com o poder de um verdadeiro censor romano, que agiria de pronto em caso de denúncias, pois, como disse ao “Fantástico”, “é possível analisar desde logo a robustez das provas e emitir um juízo de valor. Não é preciso esperar as cortes de justiça proferirem o julgamento.”
Pois bem, a empáfia e a assertividade não resistiram ao realismo da politica. Com a rapidez que lhe é característica, minimizou as acusações que pesam sobre Onyx Lorenzoni. E saiu pela tangente no caso do relatório da Coaf sobre as movimentações financeiras de Fabrício de Queiroz e da dança de sua esposa e filhas pelos gabinetes da família Bolsonaro em Brasília e no Rio de Janeiro.
As declarações evasivas do ministro não permitem saber se, diante da ‘robustez das provas’, foi ou não capaz de formar um ‘juízo de valor’ sobre o episódio. Para os eleitores, o episódio evidencia a limitação e a pequenez do universo político em que Bolsonaro e sua família se movimentam.
A troca de gentilezas entre Eduardo Bolsonaro, Major Olímpio e Joice Hasselmann completa o quadro desolador. Não há como discordar da deputada, a política do PSL fica “abaixo da linha da miséria”. Na prática, a nova política proposta pelo PSL se resume à institucionalização da cotovelada e do xingamento como práticas regulares para a solução de desavenças políticas.
Do Valor