Bolsonaro sonha com um golpe contra o Supremo Tribunal Federal
Após o golpe de 1964, os militares se movimentaram para intimidar as instituições republicanas e darem prosseguimento ao seu projeto de poder, que perdurou por 21 anos. O Ato Institucional número 2, por exemplo, aumentou a quantidade de ministros do Supremo Tribunal Federal de 11 para 16, a fim de garantir maioria às propostas do Poder Executivo em eventuais questionamentos judiciais. Com o AI-5, os ministros Hermes Lima, Victor Nunes Leal e Evandro Lins e Silva tiveram seus mandatos cassados, por discordarem do endurecimento do regime.
Admirador do período, o presidente Jair Bolsonaro recentemente se insurgiu contra decisão proferida pela Corte, que censurou reportagem reproduzida pela Revista Crusoé e pelo site O Antagonista. Entretanto, ainda assim, não há qualquer razão para suspeitar que Jair Bolsonaro seja um democrata. Sua proximidade com governos extremistas da Itália, Hungria, Turquia e Israel não tem objetivo estratégico de cunho comercial ou político para o país.
Algumas das reformas promovidas pelos mandatários desses países tiveram por objetivo submeter a autonomia de suas respectivas Supremas Cortes ao Poder Executivo, como exemplificou o sociólogo Celso Rocha de Barros em sua coluna na Folha de São Paulo em 22/04/2019
No Brasil, há articulação para instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar possíveis irregularidades praticadas por membros do Poder Judiciário com o intuito de coagir os ministros a votarem favoravelmente a projetos de viés autoritário, como o “Escola Sem Partido”, o “Pacote Anticrime” e outros que certamente sobrevirão ao longo do mandato.
A atuação do Supremo Tribunal Federal na censura à Crusoé e ao Antagonista motivou mobilizações pelo afastamento de ministros da Corte, como os pedidos de impeachment contra Dias Toffoli e Alexandre de Moraes, protocolizados pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania – SE). Veja reportagem.
A lei 1.079/1950 disciplina as hipóteses de afastamento de ministros do Supremo Tribunal Federal e de outras autoridades, por impeachment. Com isso, Bolsonaro poderia nomear outros ministros até o fim do mandato, mais alinhados ao seu perfil ideológico.
Juristas como Dalmo Dallari e Miguel Reale Júnior sustentam, contudo, que não há fundamento legal para justificar os afastamentos.
Também de valor jurídico questionável, é discutida a possibilidade de revogação da alcunhada “PEC da Bengala” e tornar compulsória a aposentadoria de magistrados dos Tribunais Superiores que sejam maiores de 70 anos.
Vale ressaltar que, para prosperarem, estes procedimentos dependem também de um cenário político favorável. Sendo assim, é difícil imaginar que dois terços do Senado aprovariam a remoção dos ministros, razão pela qual o governo aguarda o momento oportuno para se manifestar publicamente sobre eventual afastamento.
Todas essas alternativas podem soar fantasiosas, dada a flagrante ilegalidade que recai sobre todas elas. Contudo, por diversos fatores, alguns deles imponderáveis, o Brasil sofre acentuado processo de desgaste institucional desde 2015, sem paralelo com qualquer democracia saudável mundo afora, o que tem proporcionado a crescente adoção de soluções jurídicas casuístas.
Portanto, algum fato novo pode ser capaz de provocar a “tempestade perfeita” e dar a Bolsonaro a possibilidade de nomear outros ministros ao Supremo Tribunal Federal, além daqueles que chegarão aos 75 (setenta e cinco) anos e terão que se aposentar compulsoriamente.