Fotógrafo torturado pela milícia: ‘eles diziam que eu nunca mais seria o mesmo. E é verdade’
Na sexta-feira, 12/4, dois prédios desabaram na comunidade da Muzema, zona oeste do Rio de Janeiro, mas até agora a polícia vem enfrentando dificuldades para coletar depoimentos dos sobreviventes. A razão é o medo dos milicianos que construíram os dois edifícios e controlam a região com mão de ferro. Muzema é um dos 26 bairros cariocas controlados por grupos organizados que atuam à margem da lei.
Em regiões carentes da presença do Estado, policiais e ex-policiais passam a cobrar pela “segurança” e por outros serviços básicos, como transporte, oferta de gás, TV a cabo e até aluguéis.
Este é o assunto do Conversa com Bial desta terça-feira, 16/4, que escuta, em off, um morador de região controlada por milícia, o sociólogo José Cláudio Souza Alves e o fotógrafo Nilton Claudino, conhecido também como Índio, que em 2008 infiltrou-se em uma comunidade da zona oeste do Rio de Janeiro para registrar a ação de milicianos.
Quando seu disfarce foi descoberto, foi torturado por sete horas e meia, ao lado de uma repórter e de um motorista. Não por acaso, ele se apresenta como um “morto-vivo”. A cena do filme “Tropa de Elite 2” em que dois repórteres são assassinados foi inspirada na história de Nilton. “Quando eles me torturavam, eles diziam ‘você nunca mais será o mesmo’. E é verdade.”
Parceiro de Tim Lopes em outras reportagens investigativas, Nilton era chefe da fotografia da redação do jornal “O Dia” quando se infiltrou na comunidade do Batan. Desde então vive uma rotina de fuga, medo e paranoia.
“Índio é um herói. Seu caso expõe as entranhas de uma organização criminosa que se expande velozmente”, afirma o sociólogo José Cláudio Souza Alves, que estuda o fenômeno das milícias há 26 anos.
Em 2008, após a CPI das Milícias, 216 pessoas foram indiciadas, incluindo 7 políticos. Mas o ritmo de crescimento destes grupos só aumentou desde então. “Ampliam a base econômica, ampliam a base política e hoje têm projeção no poder central do Brasil”, opina.
“É um estado paralelo ao estado oficial? Não, não é um novo poder. É o próprio estado. O estado em si tem uma face legal e uma ilegal, e é isso que dá esse poder todo. Você vai ao batalhão denunciar o miliciano e encontra o miliciano lá.”
Eles explicam que o controle de transporte de van, gás e TV a cabo clandestina fazia parte da “época da microempresa”. Hoje, trata-se de uma rede com impressionante multiplicidade: venda de terras, imóveis, combustível adulterado e aterro sanitário. Um de seus tentáculos, a exploração imobiliária, teve desfecho trágico em Muzema. Dezesseis mortos já foram localizados até o momento.
Assista à entrevista completa:
Do GShow