Na semana passada o Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (Cebraspe) divulgou o resultado final da perícia médica para os candidatos com deficiência do concurso público da Polícia Federal (PF). Os únicos cargos que constam no documento são os de agente e delegado (apesar de haver mais cargos com vagas para PCDs no concurso), e, em ambos, nenhum candidato PCD foi aprovado.
Ao todo, o concurso contou com 1.757 PCDs inscritos, a maioria concorreu justamente aos dois postos: as nove vagas reservadas para agente foram disputadas por 981 candidatos com deficiência, e as oito vagas para delegado foram disputadas por 227 inscritos. Eles já haviam passado por diversas fases da seleção, como prova objetiva e discursiva, testes de aptidão física e avaliação médica.
De acordo com o edital de abertura, quem reprovar na fase em razão de incompatibilidade da deficiência com o exercício normal das atribuições do cargo será eliminado do concurso e as vagas que não forem providas serão preenchidas pelos demais candidatos, mesmo que, por lei, eles tenham reserva mínima obrigatória de 5% das oportunidades.
O edital do concurso afirma: “a compatibilidade entre as atribuições do cargo e a deficiência apresentada pelo candidato será avaliada pela perícia médica oficial, promovida por equipe multiprofissional, em cumprimento à decisão proferida pelo STF […], a qual expressamente afirmou que: ‘a banca examinadora responsável, (…) respeitando critérios objetivos, poderá declarar a inaptidão de candidatos inscritos e cujas necessidades especiais os impossibilite do exercício das atribuições inerentes ao cargo para qual estiver concorrendo’ […]”.
Para tentar garantir a vaga, a solução encontrada por alguns desses candidatos reprovados é recorrer à Justiça. Como fez Rodrigo Jabour, candidato a agente, que conseguiu na 17ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal o direito de permanecer no certame. Segundo consta no processo, ele já havia sido aprovado em vaga reservada a deficientes em concurso de perito criminal no estado de Goiás, que teria funções similares com o de agente da PF, tendo sido considerado apto para o exercício do cargo, inclusive no curso de formação, e assumido o cargo.
De acordo com o advogado da ação, Max Kolbe, “da mesma forma que no concurso anterior, a PF reprovou todos os deficientes no exame médico, ou seja, aceitam candidatos com deficiência para não desrespeitar a decisão do STF, mas, no exame médico, reprova todos, sob a justificativa de incompatibilidade da deficiência para o exercício dos cargos.
Não havia vagas para deficientes no concurso da PF, então o STF mandou reservar ao menos 5% no último concurso. Desde então eles ‘cumprem de fachada’ a decisão, pois ainda que aceitem candidatos deficientes, após eles serem aprovados em todas as fases, acabam reprovados nos exames médicos pelas próprias razões da deficiência”.
Segundo o relator do caso, o juiz federal Pablo Dourado, de fato o apelante passou em todas as etapas do concurso, inclusive no exame físico, que, “todos sabemos — e é um fato notório, portanto não carece de maiores análises probatórias —, é um teste físico dificílimo, mesmo a pessoa treinando e apta a fazê-lo, às vezes, não consegue passar”, defendeu.
Sobre o fato de ninguém mais ter sido aprovado, o relator afirmou que se trata de “indiciário de que a motivação para a eliminação do candidato, que foi feita pela junta médica, é incoerente, desproporcional e incompatível com a finalidade, que é exatamente permitir que o deficiente físico tenha ali um privilégio para disputar o cargo na medida em que aquela deficiência, aquela enfermidade o desiguala mais ou menos na disputa”.
Ele concluiu afirmando que o momento mais correto para a análise da aptidão para o cargo é o curso de formação e o estágio probatório, “em que a administração pode ali verificar se, realmente, aquele servidor pode ou não exercer o cargo”.
Tendo isso em vista, o desembargador Souza Prudente concordou que seria inadmissível, no procedimento de um concurso para agente de Polícia Federal, em que fora noticiado que o candidato foi aprovado em todas as fases, inclusive nos exames físicos, receber um laudo médico negativo de sua inaptidão física para o exercício do cargo pelo simples fato de ser portador de alguma aparente deficiência que não compromete a mobilidade de seus braços.
O Cebraspe, por sua vez, informou ao site de Concursos que os candidatos que não foram considerados aptos na avaliação médica do concurso público são aqueles que não apresentaram as condições de saúde, de acordo com o edital, nas avaliações realizadas. “O Centro esclarece também que, para o preenchimento das vagas, é necessário que haja candidatos aprovados de acordo com o edital da seleção.”
A reportagem entrou em contato com a PF, mas não obteve resposta até esta publicação.
O concurso oferece ao todo 500 vagas, sendo 150 são para delegado, 60 para perito criminal, 180 agente, 80 para escrivão e 30 para papiloscopista. Os salários iniciais vão de R$ 11.983,26 e R$ 22.672,48, para jornadas de trabalho de 40 horas semanais.
De acordo com o Cebraspe, 147.744 candidatos se inscreveram no concurso da Polícia Federal. O cargo com o maior número de inscritos foi o de agente de polícia, com 92.671 cadastros, seguido pelo cargo de delegado, com 17.816 participações. As lotações serão para os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins e em unidades de fronteira.
Além, do resultado final da perícia médica, a PF também convocou para a avaliação de títulos (somente para os cargos de delegado de polícia federal e perito criminal federal) e para o envio dos documentos necessários à matrícula no curso de formação profissional (CFP), para todos os cargos.
Em agosto do ano passado, o MPF ingressou com ação civil pública pedindo retificação do edital do concurso público da Polícia Federal, para que fosse concedida liminar obrigando a seleção a assegurar o cumprimento da legislação com relação aos direitos das pessoas com deficiência nas fases do concurso.
Para o Ministério Público Federal, o edital continha itens que violavam direitos dos candidatos que concorrem pelos sistema de cotas, não apenas nas etapas do certame, como no teste de aptidão física, mas após essas, durante a fase de lotação.
O último concurso da PF, lançado em 2012 com 1.200 vagas, não ofereceu vagas para pessoas com deficiência e foi alvo de reclamação da Procuradoria-Geral da República no Supremo Tribunal Federal (STF).
No julgamento, a ministra Cármen Lúcia reiterou que a reserva de vagas determinada pela Constituição tem dupla função: inserir as pessoas com deficiência no mercado de trabalho e permitir o preenchimento de cargos públicos com pessoas qualificadas e capacitadas para o exercício da função.
“Cabe à Administração Pública examinar, com critérios objetivos, se a deficiência apresentada é ou não compatível com o exercício do cargo, assegurando a ampla defesa e o contraditório ao candidato, sem restringir a participação no certame de todos e de quaisquer candidatos portadores de deficiência, como pretende a União,” afirmou.
Assim, obrigatoriedade de vagas para este público foi estabelecida, já que a ministra aplicou jurisprudência no sentido de que a destinação de vagas em concursos públicos às pessoas com deficiência física obedece ao artigo 37, inciso VIII, da Constituição Federal.
Após o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, anunciar que 1.000 candidatos aprovados no concurso público da Polícia Federal (PF), de 2018, vão compor o pacote anticrime do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, na semana passada, foi a vez do presidente Jair Bolsonaro confirmar o chamamento. Em um post em seu perfil pessoal no Twitter, Bolsonaro anunciou as novas convocações.