Novo Ministro da Educação é considerado desonesto no meio acadêmico

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Escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) para assumir o lugar de Ricardo Vélez Rodríguez, o novo ministro da Educação, o economista Abraham Weintraub, apresenta em seu currículo Lattes (sistema que reúne informações de pesquisadores de todo o país), dois artigos idênticos em periódicos diferentes.

No meio acadêmico, a prática de apresentar total ou parcialmente textos já publicados sem citar trabalhos anteriores é conhecida como autoplágio.

A medida é vista como um desvio de conduta, já que pode dar a entender que a produção intelectual de um autor é maior do que é na realidade. Na competição por financiamento para projetos de pesquisa, a produtividade é um dos critérios para agências de fomento escolherem uns em detrimento de outros.

Weintraub é professor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), assim como sua mulher, Daniela Baumöhl Weintraub.

Ambos assinaram o artigo “A Bela Adormecida: 20 anos depois, o processo inflacionário está em vias de ressurgir. Qual a dinâmica e as consequências desse movimento para a Previdência no Brasil”, publicado na Revista Brasileira de Previdência e na Revista Chilena de Derecho del Trabajo y de la Seguridad Social, ambos em português e com o mesmo título.

O irmão de Abraham Weintraib, Arthur Weintraub, também professor da Unifesp e assessor da Presidência da República, era um dos membros do corpo editorial da Revista Brasileira de Previdência à época da publicação.

Ambas as políticas editoriais das revistas requerem ineditismo dos artigos a serem publicados. Uma medida comum adotada em casos assim é a retratação, ou seja, a “despublicação” de um dos artigos.

A reportagem enviou dados e links das duas publicações, extraídas do currículo de Abraham Weintraub, para a assessoria de imprensa do MEC (Ministério da Educação). Também foi questionado o porquê da duplicidade, se o ministro tinha conhecimento de que dupla publicação poderia configurar autoplágio e se ele pretende tomar alguma medida a respeito.

O MEC respondeu: “Não temos essas informações.”

A Universidade do Chile, que hospeda a Revista Chilena de Derecho del Trabajo y de la Seguridad Social, disse investigar o caso e que a publicação segue normas do Committee on Publication Ethics (Cope, grupo internacional que elabora normas e orientações sobre questões éticas em publicações).

Em casos de autoplágio (publicação redundante), se comprovada a infração, a revista diz que pode tomar medidas como publicar um aviso de que o artigo já havia sido publicado ou mesmo retratá-lo.

A revista brasileira, assim como outras publicações, está hospedada no site da Unifesp, que afirma em nota que “cabe a cada editor, independentemente, a inteira responsabilidade por manter e zelar por aspectos éticos da transparência editorial”. “A Unifesp não interfere nesse processo.”

A reportagem não conseguiu contato com o editor da revista brasileira, cuja página da internet apresentava erro de navegação.

No final de 2018 a Unifesp instituiu sua Comissão Institucional de Integridade Acadêmica, que visa incentivar boas práticas e avaliar casos de má conduta, como plágio e autoplágio e manipulação de dados. Quem coordena o grupo é Bruno Comparato, professor de ciências sociais da universidade.

Segundo ele, o autoplágio, além de inflar a produção, é um problema também porque cria uma bibliografia redundante, o que piora a qualidade do acesso à informação para pesquisar numa área.

“Não é algo honesto do ponto de vista científico e vai contra a razão de ser da universidade, que é produzir conhecimento”, diz. “Mas ainda é uma discussão [sobre autoplágio] delicada e nova na academia.”

Comparato afirma que a comissão de integridade que comanda tem como principal meta a prevenção de casos de má conduta, seja com a criação de um código de boas práticas ou com um curso de formação obrigatório para os pesquisadores, por exemplo.

A comissão não tem por função policiar o corpo docente e discente nem o poder de aplicar sanções, diz Comparato.

A avaliação de casos de má conduta se dá com base em denúncias, e os pareceres são encaminhados a outros órgãos da universidade, que podem tomar medidas como advertir ou exonerar o profissional.

Até o momento só um caso foi investigado pela comissão de integridade, que envolve a troca de orientador de TCC de um aluno.

Em 2017 a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) decidiu que bloquearia verbas de instituições que não adotassem medidas contra as más práticas de pesquisa, o que movimentou universidades e instituições de pesquisa do estado.

Pesquisadores ouvidos pela Folha não consideram o novo ministro da Educação propriamente um acadêmico, mas um economista com larga experiência no mercado financeiro que recentemente, em 2014, ingressou na carreira docente, na posição de professor assistente. Na época ele possuía apenas um artigo publicado; hoje são quatro.

Um dos cientistas ouvidos afirmou que a inexperiência acadêmica de Weintraub poderia explicar o deslize.

De FSP