Alunos da Unifesp de Osasco, onde Weintraub foi professor, criticam cortes e falas do ministro

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Após criticar três universidades federais por “balbúrdia”, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, anunciou um contingenciamento de 30% dos recursos discricionários de todas as instituições federais de ensino superior. A verba bloqueada nas 68 universidades federais espalhadas por todo o país soma R$ 2 bilhões e diz respeito aos gastos com luz, água e serviços terceirizados, como segurança e limpeza.
Segundo o MEC (Ministério da Educação), a medida é necessária para que o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) cumpra a meta fiscal. As universidades, por outro lado, alegam que o orçamento anteriormente aprovado já era insuficiente para cobrir todas as despesas –e que um novo bloqueio, como esse, pode obrigá-las a fechar as portas.
Entre alunos e funcionários da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) de Osasco (SP), o sentimento de inconformidade ganha outro contorno, já que o nome de Weintraub figurava entre o quadro de docentes da instituição até novembro de 2018.
Weintraub não era contratado em regime de dedicação exclusiva e não apresentava muito interesse em temas ligados à educação e à pedagogia. Ao mesmo tempo, nunca foi alvo de reclamações por faltar nem era visto como uma espécie de “turista” dentro do campus.
“Ele dava aula aqui até o ano passado. Ele sabe o trabalho que fazemos, as dificuldades que enfrentamos. Os alunos aqui estudam, não fazem balbúrdia”, disse uma funcionária que não quis se identificar ao UOL.
Em nota, a Unifesp informou que verificou um bloqueio de aproximadamente 30% das verbas destinadas a ações de extensão e de 34,5% para os chamados gastos discricionários. Segundo a instituição, também foram bloqueados 30% dos recursos de investimentos em obras e reformas, além de “expressivo valor” das emendas parlamentares.
A Eppen (Escola Paulista de Política, Economia e Negócios), campus de Osasco da Unifesp, iniciou suas operações em 2011. A unidade funciona em um espaço provisório desde então: uma antiga faculdade municipal, cujo edifício foi cedido temporariamente pela prefeitura, no bairro de Jardim das Flores.
Além do campus de Osasco, a Unifesp tem unidades em São Paulo, São José dos Campos, Guarulhos, Diadema e na Baixada Santista.
Localizado em Vila Quitaúna, também em Osasco, o prédio definitivo da Eppen está em construção desde 2016. A previsão era que as obras fossem concluídas em julho de 2018 –o que não aconteceu, segundo a universidade, pela redução de repasses federais nos últimos anos.
No local onde funciona hoje a Eppen, há uma pequena biblioteca, um auditório e uma sala de estudos com cerca de dez computadores. A sala onde fica o bandejão é improvisada. Só há espaço para que os alunos busquem a refeição. Mesas e bancos ficam do lado de fora.
Pelos corredores, alguns pufes ficam distribuídos em frente às salas de aula, onde alunos aproveitam para estudar, conversar ou tirar um cochilo nos intervalos.
Estudantes e funcionários da Eppen classificam o ambiente do campus como plural. Ali, dizem, circulam pessoas de direita, de esquerda, conservadores, neoliberais. Mas a pluralidade, segundo eles, não é sinônimo de conflitos.
“Não tem como falar que aqui tem um perfil político só. Tem as mais variadas posições. Para um campus com opiniões tão diversas, são poucos os conflitos que existem”, diz Nathalia Pratis, aluna do quarto ano de economia.
Entre os coletivos da universidade, há os que defendem as causas negra, LGBT e feminista, além de um grupo destinado à liberdade de expressão e discussão sobre o liberalismo, chamado Eppen Livre.
“Tem polarização. Tem gente de direita, de esquerda, mas isso é normal entre jovens e por ser uma escola de política”, disse um funcionário ao UOL.
Na Eppen, Weintraub era professor no curso de ciências atuariais. Ex-alunos do ministro concordam na classificação de que ele era um bom professor, qualificado para o cargo. “Mas ele não era muito imparcial”, afirmou à reportagem a estudante Giulia*.
“Lembro que ele comentou que o [ex-presidente] Lula tinha uma piscina de dinheiro enterrada”, disse. “Ele era um professor bom. Só não concordo com a nomeação dele como ministro, porque ele não é pedagogo. Acho triste ele falar que tem balbúrdia nas universidades, sendo que ele conhece o cotidiano dos alunos.”
Outro estudante afirma que Weintraub se dizia perseguido dentro da universidade devido à sua posição política. “Mas ninguém ligava. Ninguém jamais ia ameaçar ele”, disse. O ministro já foi à Justiça contra um aluno que, segundo ele, o havia criticado em um grupo de e-mail.
Eram 18h15 de quinta-feira (9) quando foi feita a última chamada para a assembleia dos estudantes, no vão principal da Eppen.
A primeira assembleia do ano foi convocada após o anúncio dos cortes de verba para as federais. Na pauta, estava a possibilidade de paralisação dos alunos no dia 15 de maio, data em que protestos contra os cortes na educação devem acontecer em todo o país.
“Esse cara foi professor da nossa universidade”, disse uma aluna, membro do diretório acadêmico, ao microfone. “Em vez de ajudar a melhorar a educação, ele piora”, completou. Ao redor, centenas de estudantes sentados no chão acenaram a cabeça, em sinal positivo.
Mas a participação coletiva não aconteceu de imediato. Quando os alunos do diretório abriram o microfone para qualquer estudante que quisesse falar, ninguém levantou a mão. Olhares se cruzaram, desconfiados, até que alguém decidisse pedir a palavra.
Em meio aos debates sobre qual seria a melhor forma de protestar, o nome de Weintraub voltava a aparecer.
“Se não levarmos a importância da Unifesp para a população, eles não vão ajudar”, disse uma aluna. “O ministro que está lá é daqui de Osasco!”, completou.
“Precisamos mostrar a Eppen, em destaque, por ser a universidade onde o ministro lecionou. Acho importante, porque nem a universidade em que ele dava aula o está apoiando dentro da situação que ele criou”, disse outra, ao que foi acompanhada por muitos aplausos.
Nas idas e vindas do microfone, teve início uma discussão sobre a legitimidade da presença de partidos políticos na manifestação dos alunos.
“Acho zoado levar bandeira [de partido]”, desabafou um aluno. “Quem vir na TV vai achar: ‘Olha, esse bando de PSOL, de PT, de sei lá o quê’. Acho que estamos juntos por um motivo maior e temos que conversar melhor sobre isso dos partidos”, disse o jovem –que também recebeu efusivos aplausos.
Pouco antes de os estudantes decidirem, por unanimidade, pela paralisação no dia 15, outro aluno defendeu: “Infelizmente, a entidade máxima que representa a educação no país, na situação de hoje, saiu daqui de dentro. E a gente, mais do que ninguém, tem que sair daqui com sangue no olho para lutar”.
Do UOL