Estatização seria saída para a crise dos antibióticos
O desenvolvimento de novos medicamentos é parte crucial da solução para evitar o temido “apocalipse” da saúde pública a partir da crescente resistência dos organismos aos antibióticos, mas a última classe desses remédios foi criada ainda na década de 1980 e única solução à vista para assegurar os investimentos necessários é a nacionalização da indústria, propõe Terence James O’Neill, economista britânico que ocupa atualmente o cargo de chefe de pesquisa em economia global do grupo financeiro Goldman Sachs e foi conselheiro do governo do Reino Unido em resistência a antibióticos.
O’Neill disse à BBC que a solução pode ser “apenas tirar isso deles e assumi-lo” e representantes da indústria farmacêutica afirmaram que esse assunto não está em pauta. “As bactérias que evoluem para resistir aos antibióticos ameaçam levar a medicina de volta à idade das trevas”, disparou o economista. Algumas infecções podem se tornar imunes ao tratamento e a perda de eficácia dos antibióticos “tornaria as cirurgias e o tratamento de câncer muito mais arriscados”.
O problema não se restringe a falta de investimentos, pois todo medicamento precisa ser barato e usado raramente para minimizar o risco de resistência, sublinham especialistas.
Projeções de mortalidade anual provocada por infecções por microorganismos resistentes a antibióticos em 2050 apontam 4,73 milhões de óbitos na Ásia, 4,15 milhões na África, 392 mil na América Latina, 390 mil na Europa, 317 mil na América do Norte e 22 mil na Oceania. Há três anos, O’Neill propôs que os governos dessem um bilhão de dólares às indústrias farmacêuticas a cada novo antibiótico desenvolvido mas a estratégia não funcionou.
Diante desse fracasso e do silêncio dos formuladores de políticas globais sobre o assunto nos últimos três anos, ele vê na estatização a alternativa para direcionar os investimentos do setor em função do interesse de defesa da saúde da população mundial.
O economista disse que casos de abandono da pesquisa com antibióticos por empresas privadas seriam oportunidades para órgãos públicos adquirirem os respectivos ativos. A Associação da Indústria Farmacêutica Britânica (ABPI, na sigla em inglês) replicou dizendo que “as indústrias não estão paradas” na luta contra a resistência antimicrobiana.
O vice-diretor científico da entidade, Sheuli Porkess, afirmou que “a nacionalização do desenvolvimento de antibióticos simplesmente não nos dará os antibióticos de que precisamos. Em 2016, o setor privado investiu cerca de 2 bilhões de dólares em pesquisa e desenvolvimento de novos antibióticos, cerca de quatro vezes mais do que todo o governo e fundações combinadas.”
A ABPI disse que vem trabalhando em estreita colaboração com o governo nos últimos dois anos e que as empresas estão prontas para testar um novo modelo para os antibióticos. “Não devemos descartar este plano antes de tentarmos colocá-lo em prática”, disse Porkess. O desenvolvimento de novos antibióticos, concordam as várias partes envolvidas, é só parte da solução dos problemas criados pela resistência antimicrobiana.
“A prática de distribuir antibióticos como doces continuará a alimentar o surgimento de infecções resistentes aos medicamentos”, alerta o artigo da BBC.