Mãe de assessor de Flávio Bolsonaro tem amnésia: não lembra de depósito de R$ 90 mil em sua conta
O policial civil Jorge Luis de Souza , que atuou como assessor parlamentar de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), fez um depósito de R$ 90 mil em espécie na conta da mãe, Nicelma Ferreira de Souza , em março de 2018, quando ainda trabalhava para o então deputado estadual.
Em contato com o GLOBO, Nicelma disse que não lembra da transação e que desconhecia o trabalho do filho para Flávio Bolsonaro. A transação foi apontada pelo Ministério Público , em seu pedido de quebra de sigilo bancário e fiscal de 86 pessoas e 9 empresas , como um indício de que quantias desviadas do orçamento da Alerj eram distribuídas entre lideranças do gabinete de Flávio.
O Ministério Público apura indícios de formação de organização criminosa , com desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro, no gabinete de Flávio na Alerj. Em seu pedido de quebra de sigilo, o MP se refere à “expressiva quantia” de R$ 90 mil depositada por Jorge Luis, em uma única transação, na conta bancária da mãe, que mora em Rio das Ostras, no Norte Fluminense. O depósito foi realizado, segundo a documentação apresentada, em março de 2018.
Os procuradores usam a transação para rebater a tese apresentada pela defesa deFabrício Queiroz , ex-assessor de Flávio, de que parte do salário de funcionários era devolvida para possibilitar a contratação de novos “assessores informais”. Para o MP, o volume atípico de valores movimentados por assessores de Flávio Bolsonaro, como Queiroz e Jorge Luis, indica que os vencimentos eram, na verdade, devolvidos às lideranças do gabinete – prática conhecida como “rachadinha” , proibida por lei.
Procurada por telefone pelo GLOBO, Nicelma se mostrou surpresa com a informação do depósito de R$ 90 mil em sua conta. Ela está entre os alvos do pedido de quebra de sigilo feito pelo MP, assim como seu filho, Jorge Luis.
– Na minha conta? Não lembro, não. Entra em contato com meu filho porque eu não sei de nada disso – afirmou Nicelma, antes de complementar: – Entra em contato com o Bolsonaro… Deus está vendo. Se houve alguma coisa ilegal, Deus vai mostrar na hora certa.
Nicelma afirmou que nunca teve contato com o clã Bolsonaro, e que desconhecia a atuação do filho no gabinete de Flávio.
– Não sei, não. Meu filho nunca falou nada.
Procurado pelo GLOBO, Jorge Luis afirmou que não faria “nenhuma declaração no momento”.
Em seu pedido de quebra de sigilo, o Ministério Público aponta indícios de que, entre as pessoas nomeadas como funcionários de Flávio Bolsonaro na Alerj, “muitos não atuavam efetivamente como assessores parlamentares, figurando, provavelmente, como funcionários ‘fantasmas’, meros instrumentos (‘laranjas’) para desviar recursos orçamentários que deveriam ser destinados à manutenção” do gabinete.
Relatório do Coaf que veio a público no fim do ano passado mostrou que Jorge Luis foi um dos oito funcionários de Flávio Bolsonaro que fizeram depósitos na conta de Fabrício Queiroz entre 2016 e 2018. O policial, cujo vencimento líquido na Alerj era de R$ 4,8 mil, fez uma transferência de R$ 3,1 mil para Queiroz.
Jorge Luis estava lotado no gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj pelo menos desde 2015. Em março daquele, a Casa Civil autorizou a permanência do policial no gabinete do deputado, segundo publicação no Diário Oficial. Em junho de 2018, Jorge foi transferido para o gabinete da liderança do PSL, exercida à época por Flávio Bolsonaro, sem alterar sua remuneração líquida mensal de R$ 4,8 mil.
O portal de transparência do governo do Rio aponta que Jorge Luis estava na ativa como policial civil em abril de 2019, com salário bruto de R$ 12,8 mil naquele mês. Procurada pelo GLOBO para esclarecer se Jorge seguiu recebendo salário quando estava lotado no gabinete de Flávio Bolsonaro, a Polícia Civil não deu retorno até a publicação desta reportagem.
O MP argumentou, em seu pedido de quebra de sigilo, que as nomeações de policiais no gabinete de Flávio Bolsonaro podem ter sido usadas “com desvio de finalidade”, afastando-os do serviço nas ruas “em troca do repasse de parte das gratificações pagas pela Alerj”.
Procurado pelo GLOBO para comentar o depósito de R$ 90 mil feito por seu assessor na conta da mãe, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) disse que não tem “qualquer responsabilidade pelas ações de outras pessoas” e disse que “não são verdadeiras as informações vazadas” sobre ele.
Jorge Luis não faz parte do gabinete atual de Flávio Bolsonaro no Senado. A última aparição de seu nome na folha de pagamento de servidores da Alerj ocorreu em fevereiro de 2019. O policial disse ao GLOBO que não vai se manifestar no momento.
Veja a íntegra do posicionamento de Flávio Bolsonaro:
“Não tenho qualquer responsabilidade pelas ações de outras pessoas. Se há algum crime nessa conduta, só a Justiça pode dizer. Apenas lamento a insistência de autoridades e de parte da imprensa em fazer ilações fantasiosas contra mim. Reafirmo que não são verdadeiras as informações vazadas sobre mim pelo Ministério Público.
De O Globo