Mesmo após bobagens ditas por Bolsonaro, presidente chinês acredita na parceria com o Brasil

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Com um aperto de mãos, o vice-presidente do Brasil, general Hamilton Mourão, e o presidente chinês, Xi Jinping, reconduziram as relações entre os dois países à normalidade. Uma normalidade de que ambos os países necessitam, havendo ou não comentários incendiários do presidente Jair Bolsonaro, que na campanha acusou o gigante asiático de querer “comprar” seu país. O Brasil, porque a China é o seu parceiro comercial mais importante. A China, porque em sua incipiente guerra fria com os Estados Unidos, que tem cada vez mais frentes abertas, precisa cercar-se de bons aliados.

Em uma recepção no imponente Palácio do Povo, em Pequim, que o Governo chinês reserva para os grandes encontros, Xi disse a Mourão que “os dois lados devem continuar se vendo como parceiros e oportunidades para o seu próprio desenvolvimento. Devem respeitar-se, apoiar-se, ter confiança um no outro e construir as relações China-Brasil como um modelo de solidariedade e cooperação entre os países em desenvolvimento”.

A China quis se empenhar ao máximo na recepção a Mourão, um homem visto neste país como a ponte entre a ala dura do Governo Bolsonaro e os empresários, ansiosos por expandir os laços com Pequim, um representante da moderação contra o populismo do presidente brasileiro.

O protocolo não obrigava Xi a receber um vice-presidente. Mas o chefe de Estado chinês queria fazer esse gesto de aproximação numa visita comparável, no campo diplomático, ao retorno do filho pródigo, quando as relações mergulharam em seu pior momento em quatro décadas, após a eleição de Bolsonaro em outubro. Além de Xi, Mourão também se reuniu com o vice-presidente, Wang Qishan, e os principais líderes chineses durante seis dias de visita à potência asiática.

Na quarta-feira, em um discurso para empresários de ambos os países em um hotel em Pequim, Mourão disse que Brasília considera os laços com a China “estratégicos” e lhes concede prioridade. Após sua visita –ressaltou– os vínculos entram “em uma posição ainda mais promissora”.

Na última década, a China se tornou o principal parceiro comercial brasileiro, com um volume de intercâmbio de 98,9 bilhões de dólares no ano passado (395,6 bilhões de reais). Nos últimos quinze anos, a China investiu cerca de 70 bilhões de dólares no Brasil (280 bilhões de reais), segundo dados do Ministério da Economia brasileiro. A maior parte foi direcionada aos setores de energia e infraestrutura. Mas, diante da incerteza desencadeada pelos comentários do então candidato presidencial Bolsonaro, de que “a China está comprando o Brasil”, o investimento direto chinês caiu de 11,3 bilhões de dólares em 2017 para 2,8 bilhões em 2018.

Mourão afirmou em seu discurso em Pequim que, além dos campos tradicionais – soja, petróleo–, o Brasil tentará direcionar os investimentos chineses a “setores de interesse”, como a inovação, a ciência e a tecnologia.

Ele não quis entrar nos assuntos mais delicados da relação bilateral –essas decisões corresponderão a Bolsonaro, que planeja viajar para Pequim por volta de agosto e dar as boas-vindas a Xi durante a visita do presidente chinês em novembro para participar da cúpula dos BRICS. Entre as questões, por um lado, se o Brasil optará por ceder aos desejos dos Estados Unidos e tomar medidas para limitar o papel da gigante tecnológica chinesa Huawei nas redes 5G do país. E, por outro, se o Brasil quer aderir formalmente, por meio de um memorando de entendimento, à iniciativa chinesa Nova Rota da Seda, a rede de infraestrutura com a qual Pequim quer se conectar com o restante do mundo. Até agora, Brasília resistiu a dar um passo que outros líderes latino-americanos já deram. Sua integração formal representaria um enorme gesto em direção a Pequim.

Por ora, o Brasil começou a enviar sinais amigáveis ao gigante asiático. Nesta semana, o Governo em Brasília anunciou que retirará sua denúncia na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra as políticas comerciais chinesas sobre o açúcar. Também expressou seu apoio ao candidato chinês para liderar a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), Qu Dongyu.

Do El País