Anos atrás, procuradores preferiram Telegram porque achavam o aplicativo mais seguro
A possibilidade de manter conversas criptografadas de ponta a ponta e de compartilhar arquivos, entre outras funções, levaram procuradores federais a adotar o Telegram para trocar mensagens anos atrás, quando o WhatsApp não dispunha de tais funções.
Foi justamente pelo aplicativo que o chefe da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, e o então juiz e atual ministro da Justiça, Sergio Moro, trocaram as mensagens vazadas que estão sendo divulgadas pelo site The Intercept Brasil. Outros procuradores de Rio, São Paulo e Brasília sofreram tentativas de invasão de privacidade por meio do Telegram. A Polícia Federal investiga os casos.
Segundo a procuradora Luiza Frischeisen, o Telegram foi adotado por colegas porque tinha mais funcionalidades que o WhatsApp, o que foi confirmado também por outro procurador que optou por falar sob anonimato.
O UOL apurou com outras duas fontes ligadas ao MPF (Ministério Público Federal) que havia a percepção de que o Telegram era mais seguro que o WhatsApp, principalmente porque já tinha a opção de conversas secretas, com criptografia de ponta a ponta –tecnologia que depois se tornou padrão no WhatsApp. Com isso, em tese, ninguém consegue violar o sigilo de uma conversa entre dois usuários, nem mesmo as empresas responsáveis pelos aplicativos.
A opção de “chat secreto” também permite configurar um prazo para a autodestruição da conversa, que varia de um segundo a uma semana, além de impedir o encaminhamento de mensagens e, nos celulares com sistema Android, a realização de capturas de tela.
Em nota, a PGR (Procuradoria-Geral da República) disse que “não há orientação para membros e servidores utilizarem o Telegram em vez de outros aplicativos de mensagem”, mas que existem “indicações quanto ao uso seguro dos aplicativos de mensagem em geral, principalmente nos celulares funcionais.”
Possível brecha via desktop
O Telegram também permite o envio de arquivos de até 1,5 GB cada um. No WhatsApp, esse limite é de 100 MB. Mesmo a própria função de compartilhar arquivos já existia no Telegram anos antes de ser disponibilizada no concorrente.
Outra função do aplicativo é o seu uso em um navegador no desktop sem necessidade de manter o celular conectado. Segundo o jornal O Globo, o MPF apura se foi justamente por meio desta funcionalidade que terceiros ainda não identificados conseguiram acessar o Telegram de procuradores.
Para usar o Telegram em um navegador, é preciso colocar o número do celular no site do aplicativo. O usuário então recebe uma mensagem via SMS com um código. Em seguida, o aplicativo é aberto no navegador, permitindo a troca de mensagens e o acesso a conversas antigas. Segundo O Globo, ainda não se sabe como os invasores conseguem acesso a esse código.
Em um dos casos, um autodeclarado hacker usou o Telegram do conselheiro do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) Marcelo Weitzel Rabello de Souza, procurador do Ministério Público Militar, para mandar mensagens no grupo do órgão e conversar com o procurador federal José Robalinho Cavalcanti. O CNMP disse que Weitzel não comentaria o caso.
Depois da invasão, um dos integrantes do CNMP, o advogado Leonardo Accioly, desativou sua conta no Telegram e apagou o aplicativo de seu celular. Segundo ele, as conversas do grupo eram sobre questões internas do conselho. “Não há temor quanto ao conteúdo”, disse na quarta (12).
No entanto, no caso específico das conversas entre Deltan Dallagnol e Sergio Moro, ainda não está claro como os diálogos foram obtidos. O site The Intercept Brasil afirma ter recebido o material de uma fonte e não deu detalhes sobre como isso teria ocorrido.
Na terça (11), o Telegram disse que não havia evidências de que o aplicativo foi hackeado. Segundo a empresa, “é mais provável que tenha sido malware [vírus] ou alguém que não esteja usando uma senha de verificação em duas etapas”.
Quando as conversas vieram a público, no domingo, a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba divulgou nota afirmando que seus integrantes foram “vítimas da ação criminosa de um hacker”. Na quarta (12), em outra nota, os procuradores afirmaram que os diálogos podem ter sido “forjados”.
Do UOL