Engenheiro boliviano diz que seu software foi usado para disparos pró-Bolsonaro

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Em vídeo postado no YouTube, o engenheiro boliviano Nicolás Hinojosa, 32, afirma que seu software de envio de mensagens em massa por WhatsApp foi usado por apoiadores do então candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL) no ano passado e que, por esse motivo, seu número foi bloqueado pelo aplicativo.

“Lamentavelmente, na semana passada, bloquearam meu número de WhatsApp por causa do que aconteceu no Brasil. As pessoas que fizeram campanha para o candidato Bolsonaro usaram meu software, mas nem sequer compraram as licenças, usaram a versão demo [teste]”, diz Hinojosa no vídeo de 5 minutos e 25 segundos, postado em 31 de outubro de 2018.

No dia 18 de outubro do ano passado, reportagem da Folha revelou que empresas brasileiras estavam comprando de agências de marketing pacotes de mensagens por WhatsApp em massa contra o PT.

A campanha de Bolsonaro negou ter conhecimento sobre as mensagens enviadas. No dia seguinte à publicação da reportagem, o WhatsApp anunciou ter bloqueado contas que estavam fazendo envios maciços de mensagens, entre elas as das agências mencionadas na reportagem.

Nesta terça-feira (18), a Folha mostrou que o dono de uma agência de marketing na Espanha afirmou em gravação que empresas brasileiras contrataram sua firma em 2018 para fazer disparos em massa de mensagens políticas a favor do então presidenciável Jair Bolsonaro.

Em entrevista à Folha, Hinojosa afirmou que 360 usuários lançaram mão de seu software “para enviar campanhas para Bolsonaro”.

“Calculo que tenham sido enviadas mensagens de cerca de 30 mil contas [números] de WhatsApp. Todas as mensagens que vi eram campanha para Bolsonaro. Textos e imagens em português”, disse.

“Imagino que outros [candidatos] também devem ter enviado [com o software dele]. Mas o que eu tenho certeza é de que vi [campanha] para o Bolsonaro.”

Procurado, o WhatsApp confirmou ter bloqueado as contas de Hinojosa por mau uso. “O WhatsApp bloqueou algumas contas dele antes das eleições”, disse a empresa por email.

“Na versão demo, obviamente saía na parte de baixo meu website, e lá dentro tinha meu número. Por causa disso, WhatsApp me identificou como se eu tivesse sido a pessoa responsável por esta onda de spam que essas pessoas fizeram e suspendeu meu número.”

A contratação dos disparos por pessoas físicas, sem declarar às autoridades eleitorais, é vedada por lei.

Segundo o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), apenas as campanhas oficiais podem fazer contratação de impulsionamento de conteúdo eleitoral nas redes sociais.

“A contratação do serviço de impulsionamento deve ser realizada exclusivamente por partidos, coligações, candidatos ou seus representantes e diretamente por meio da ferramenta responsável pelo serviço, cujo provedor deve ter sede e foro no Brasil, ou com filial, sucursal, escritório, estabelecimento ou representante legalmente estabelecido no país”, diz a lei 13.488, de 6 de outubro de 2017.

Além disso, é proibido o uso de ferramentas de automatização, como os softwares de disparo em massa.

O boliviano é dono de uma microempresa em Cochabamba, na Bolívia, e ele é o único funcionário.

O uso de softwares de disparos de empresas estrangeiras, pagando com cartão de crédito ou Pay Pal, demonstra a facilidade de contratação de serviços de envios em massa durante campanhas eleitorais e a dificuldade para a Justiça Eleitoral ter controle de gastos de campanhas efetuados por terceiros em favor de candidatos.

Hinojosa voltou a oferecer o software em uma nova versão, no site softwaresen.com, por US$ 149 ao ano, sem a opção de teste.

Na versão demo (teste), segundo ele, não era necessário inserir dados do cartão de crédito —por isso ele afirma não poder identificar os usuários.

O software de Hinojosa é muito usado para venda de produtos, e ele diz acreditar que os brasileiros chegaram ao seu site por meio de algum dos vídeos de promoção que ele posta no YouTube.

O boliviano disse que verificou o conteúdo das mensagens porque tinha um número de WhatsApp para o qual o conteúdo era redirecionado quando não conseguia ser entregue a algum número.

Mas alega não ter guardado nenhuma das mensagens antes que os números fossem bloqueados pelo aplicativo.

“Esse software foi criado para automatizar serviço a clientes, quando pessoas não têm dinheiro para ter funcionários atendendo clientes, não tem nada de irregular”, afirmou.

No entanto, esse tipo de serviço passará a ser acionado judicialmente pelo WhatsApp a partir de dezembro deste ano, segundo anunciou a plataforma no domingo (9).

O WhatsApp informou que vai levar à Justiça casos de violação dos termos de serviços da plataforma com práticas abusivas, como envio de mensagens em massa ou automatizadas.

Nas eleições brasileiras de 2018, reportagens da Folha revelaram que o sistema para os envios em massa usou bases de usuários que cederam seus números de forma voluntária ou bases de terceiros, vendidas por agências de estratégia digital.

A agência brasileira Fórmula de Vendas vende um software parecido com o de Hinojosa. Segundo o próprio presidente da agência, Gilson Costa, seu software foi inspirado no boliviano e foi utilizado por “alguns poucos políticos” na campanha do ano passado.

A agência também oferece, por R$ 399,90, o FaceLeads, software que permite extrair nomes, emails e celulares de participantes de grupos do Facebook, para que eles passem a compor listas de envios de mensagens em massa por WhatsApp. Em tutorial, ele mostra como o software extrai os dados dos usuários do Facebook.

O software de envios automatizados por WhatsApp, chamado de LeadZap, também custa R$ 399,90.

Segundo Costa, o principal público de seus produtos são empresas, que usam para relacionamento com clientes. Ele afirma que sua agência está se preparando para migrar seus softwares de automatização para o Instagram, por causa das novas restrições anunciadas pelo WhatsApp.

Da FSP