FHC, Alckmin, Serra e Tasso Jereissati não tem fôlego para enfrentar os novatos
Para o cientista político Fernando Bizarro, que se debruçou na trajetória da sigla, nesse cenário de polarização não mais haverá espaço para um PSDB dividido. Doutorando em Harvard e pesquisador do David Rockefeller Center for Latin American Studies, Bizarro afirma que a velha guarda do partido — nomes como Fernando Henrique Cardoso, Geraldo Alckmin, José Serra e Tasso Jereissati — não tem fôlego para enfrentar os novatos. “Os novos tucanos precisam menos dos velhos do que os velhos tucanos precisavam dos novos”, diz.
Como o senhor define o momento atual do PSDB?
O que está acontecendo agora é o auge de um processo que começou lá atrás. É a transformação final do PSDB. O partido nasce na centro-esquerda, numa combinação de social-democrata com liberal progressista, democrata cristão, que era a fórmula inicial dos anos 80. À medida que tem sucesso, incorpora uma série de novas lideranças que estão sempre à direita do que era o partido originalmente. Em parte porque o partido ganhou as eleições, virou partido do governo e, por isso, atraiu figuras mais conservadoras e clientelistas. Em parte porque o FHC [ex-presidente Fernando Henrique Cardoso] e o partido precisaram se mover à direita para fazer aliança com o PFL no começo do mandato, governar e, finalmente, ser oposição ao PT. O PSDB acabou sendo uma alternativa à direita do PT. Para se nacionalizar, foi incorporando setores distantes dos iniciais.
Em que momento o partido começou a rachar?
Com a ascensão do PT, o partido se posiciona à direita. Nessa configuração, passa a ser um partido dividido. É por isso que o PSDB, em várias situações, aparentava estar em cima do muro. Porque tinha de resolver o fato de que era um partido que surgiu na centro-esquerda, com lideranças com posições progressistas, e acabou incorporando lideranças eleitorais com posições mais conservadoras. Sempre foi difícil combinar essas duas posições. Por isso o partido sempre teve dificuldade em se posicionar: se dissesse A, um monte de gente dizia que queria B. E, se dissesse B, um monte de gente dizia que queria A.
Por que o PSDB não de dividiu antes?
Isso nunca levou a uma completa reformulação do PSDB porque as lideranças que controlavam os pontos principais eram ainda aquelas do começo: FHC, Geraldo Alckmin, José Serra, Aécio Neves, Tasso Jereissati. Elas controlavam o partido porque ganhavam as eleições. O governador de São Paulo, seja ele de qualquer partido, sempre vai ter papel fundamental, porque é o governador do estado com maior eleitorado. Ao manter esses líderes iniciais como guardiões, o PSDB não renovou suas lideranças. Quando teve de renovar, porque os líderes do passado estavam se aposentando ou não podiam se candidatar de novo, não havia ninguém associado àquele grupo que fosse uma liderança eleitoral viável. Precisaram buscar nova liderança que fazia parte do grupo mais conservador. Quando o João Doria ganha, o equilíbrio de forças dentro do partido muda entre os dois grupos. Os velhos tucanos perdem o poder quando Doria é eleito. O que está acontecendo agora é essa passagem do bastão dos velhos para os novos tucanos. E Doria é quem comanda isso.
É um momento de “ou vai ou racha”?
Acho que sim. A reconfiguração pela qual o sistema partidário brasileiro parece estar passando não vai deixar espaço para um PSDB dividido. Devido à intensidade da polarização e ao fato de o governador Doria ser um político dessa nova geração, cria uma situação em que um PSDB com um pé em cada barco fica numa posição vulnerável. Quando a liderança do PSDB era dos velhos tucanos, eles tinham interesse em manter os novos tucanos com eles. Os novos tucanos lhes davam votos de penetração territorial que os velhos tucanos não tinham. Os novos tucanos não precisam tanto dos velhos. O governador Alckmin, por exemplo, não vai fazer muita diferença para o Doria se trocar de partido amanhã. A mesma coisa o Serra, que hoje é senador. A carreira política dele hoje está no ocaso. Ele não vai mais se candidatar para quatro ou cinco eleições. Se voltar a se candidatar, é para mais uma. Os novos tucanos precisam menos dos velhos do que os velhos tucanos precisavam dos novos.
Da Época