Por pressão dos EUA, México aumenta repressão a imigrantes

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Eles chegaram ao amanhecer, com trajes de combate, despejados por veículos do governo. Uma falange de militares e policiais encheu um pequeno hotel no centro de Tapachula, pequena cidade perto da fronteira do México com a Guatemala. Seu alvo: migrantes não autorizados.

Agentes correram de porta em porta, detendo pessoas enquanto migrantes gritavam ou fugiam pelos fundos, subindo nos telhados das casas vizinhas, segundo testemunhas.

Foi uma das várias batidas aqui na semana passada para recolher migrantes, parte de uma ampla repressão mexicana contra a onda de centro-americanos e outros que flui para os Estados Unidos.

Nas últimas semanas, as autoridades mexicanas têm debandado caravanas de migrantes e montado bloqueios nas rotas mais comuns de migração para o norte.

As detenções e deportações no México estão rapidamente se multiplicando, semeando medo entre os milhares de centro-americanos e outros que lotam os abrigos para migrantes e hotéis baratos aqui no sul do México, a maioria deles esperando alcançar a fronteira dos Estados Unidos.

“É muito assustador”, disse um migrante cubano no hotel. “O medo nunca desaparece.”

O governo mexicano sofre intensa pressão do presidente Donald Trump, dos Estados Unidos, para bloquear as dezenas de milhares de migrantes que se deslocam para o norte todos os meses.

Com as autoridades americanas incapazes de deter a imigração ilegal para os Estados Unidos, Trump visou os países da região —incluindo Guatemala, Honduras e El Salvador, origens da maior parte dos migrantes— ameaçando punições a menos que eles façam mais.

Na semana passada, Trump surpreendeu autoridades e líderes empresariais dos dois lados da fronteira, ameaçando impor tarifas a todas as importações mexicanas, a menos que o México impeça os migrantes não autorizados de entrar nos Estados Unidos.

Em Washington na segunda-feira (3), o ministro das Relações Exteriores do México, Marcelo Ebrard, avisou que as tarifas simplesmente minariam os atuais esforços de seu país para controlar a migração.

Com uma delegação de autoridades mexicanas, ele deverá ter conversas de alto nível nesta semana com o governo Trump, para aliviar a situação.

“Tarifas poderiam causar instabilidade econômica e financeira”, enfraquecendo a capacidade do governo de solucionar o problema, disse ele.

O presidente Andrés Manuel López Obrador, do México, insiste que o país já faz sua parte, afirmando que a crise deriva de uma série complexa de problemas sociais e políticos em toda a região, o que exigiria investimento internacional de bilhões de dólares —e não medidas punitivas— para consertar.

Além de seus recentes esforços de policiamento, porém, as autoridades mexicanas admitem que sua fronteira sul é altamente porosa, com milhares de migrantes escorregando por ela todos os meses por centenas de pontos de travessia ilegal.

Apesar da pressão de Trump, as autoridades mexicanas insistiram que não vão “militarizar” a fronteira sul construindo um muro ou enchendo-a de forças de segurança.

Analistas dizem que o México não tem recursos para reforçar sua fronteira de 1.120 quilômetros com seus vizinhos centro-americanos, especialmente porque o país todo já enfrenta níveis recordes de violência.

E mesmo que o governo mexicano tentasse fortificar a fronteira sul, afirmam analistas, provavelmente isso não bastaria para conter a onda incessante.

Em abril, mais de 109 mil pessoas foram apreendidas na fronteira sudoeste dos Estados Unidos, ou próximo dela, o maior total mensal desde 2007. Muitos viajavam em família, e elas continuam chegando em números históricos apesar dos vários esforços de Trump para conter o fluxo.

A migração em massa estava em vigor quando López Obrador assumiu a Presidência em 1º de dezembro.

Mas como um populista e antigo defensor dos pobres ele fez campanha com uma plataforma de proteger os direitos humanos dos migrantes, prometendo recusar a abordagem de seus antecessores, que chamou de mão pesada e repressiva.

De início, seu governo abriu os braços aos migrantes, divulgando amplas oportunidades de trabalho no México e começando um programa que deu vistos humanitários de um ano para praticamente todo mundo que os solicitou.

As autoridades também deixaram que as grandes e frequentes caravanas que vinham da América Central passassem relativamente sem empecilhos pelo território mexicano.

Nos primeiros quatro meses de seu governo, as deportações caíram 38% em comparação com os últimos quatro meses do mandato de seu antecessor. Mas a permissividade incentivou mais migração da América Central, com muitos tentando usar o México como trampolim para os EUA.

No final de março, Trump ameaçou fechar a fronteira com o México para conter a migração. Ele também se moveu para cortar a ajuda aos países da América Central que enviam a maioria dos migrantes para os EUA.

O México pareceu reagir rapidamente, com as detenções e deportações subindo quase de imediato.

Em abril, quase 15 mil migrantes foram deportados pelo México, contra cerca de 9.100 em março, segundo números do governo. A contagem mensal subiu ainda mais em maio. Nos últimos dois meses, o governo López Obrador deportou 67% mais migrantes do que seu antecessor no mesmo período em 2018.

“O governo López Obrador quer claramente criar uma abordagem diferente da migração que trate os migrantes de modo mais humano”, disse Andrew Selee, presidente do Instituto de Políticas Migratórias em Washington.

“Mas diante do crescimento exponencial do fluxo e da pressão do governo Trump para contê-lo, eles geralmente voltaram a uma abordagem policial, como governos anteriores.”

O governo mexicano não abandonou totalmente os esforços para acomodar os migrantes e absorvê-los no tecido do país. Ele tentou expandir a eligibilidade para o trabalho e vistos de visitantes para os centro-americanos.

E alguns defensores dos migrantes dizem que ele fez mais que governos antigos para promover seu programa de asilo, que deverá receber cerca de 60 mil solicitações neste ano, aproximadamente o dobro do ano passado.

Muitos milhares de migrantes, muitas vezes como último recurso para evitar a deportação, pediram vistos ou asilo no México. Mas a corrida abarrotou os órgãos de migração do governo, que estão sufocados sob o peso de processos atrasados e cortes de orçamento.

Apesar do aumento constante da migração nos últimos meses, a divisão que cuida do policiamento, o Instituto Nacional de Migração, sofreu uma redução de 23% em seu orçamento neste ano.

Os atrasos são evidentes aqui em Tapachula, a principal cidade nesta parte do México e uma grande escala para os migrantes centro-americanos que rumam para o norte.

Alguns recorreram a contrabandistas. Na verdade, a repressão mexicana e os esforços de Trump para restringir a migração beneficiaram a indústria de atravessadores e as autoridades mexicanas corruptas que a propiciam, segundo analistas.

López Obrador e as autoridades em sua delegação a Washington dizem que estão otimistas sobre alcançar um acordo com o governo Trump. O presidente mexicano sugeriu no fim de semana que está disposto a “reforçar” as estratégias de controle de migração do governo –desde que os direitos humanos não sejam violados.

Mas na segunda-feira a embaixadora do México nos EUA, Martha Bárcena, disse que há um limite para a flexibilidade dos mexicanos nas negociações. “E o limite é a dignidade mexicana”, afirmou.

López Obrador promove há meses uma estratégia para abordar a crise migratória atacando na origem os problemas que levam as pessoas a deixar seus países.

Defensores da abordagem esperam que os EUA se tornem um grande doador e participante. Mas Trump já se moveu para cortar a ajuda aos três países centro-americanos que enviam mais migrantes que tentam entrar nos EUA pela fronteira sudoeste.

Na semana passada, o governo Trump assinou um acordo de dois anos para mobilizar até 80 agentes do Departamento de Segurança Interna à Guatemala para ajudar a treinar sua polícia e conduzir investigações destinadas a conter a migração ilegal.

Mas analistas se perguntam se a oferta americana se estenderá muito além disso.

“López Obrador está certo de que a única solução em longo prazo para conter a migração da América Central é investir em segurança e prosperidade nos países de origem”, disse Selee.

“Mas não está claro se seu governo aplicará recursos sérios nisso, e ainda menos claro se o governo Trump ajudará.”

Da FSP