Estado deve revelar crimes da ditadura, diz Instituto Herzog
Casado com Ana Lúcia Valença Santa Cruz Oliveira e pai de Felipe, Fernando Santa Cruz “tinha vida absolutamente legal e era funcionário do Departamento de Águas e Energia Elétrica, em São Paulo, onde morava com a mulher e Felipe, então com dois anos” A informação é da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Político, a respeito do pai do atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, atacado hoje (29) por Jair Bolsonaro. Em 23 de fevereiro de 1974, ele e o amigo Eduardo Collier iriam se encontrar no Rio de Janeiro. Foram presos juntos por agentes do DOI-Codi. O presidente da República declarou que “sabe” o que aconteceu.
“É de se lamentar profundamente que crimes como o desaparecimento forçado de Fernando Augusto Santa Cruz, que marcaram um dos mais terríveis períodos da história do nosso pais, sejam tratados de forma tão leviana, especialmente por quem hoje ocupa a presidência da República”, afirma, em nota, o Instituto Vladimir Herzog.
“Fernando era filho de Elzita Santa Cruz, ícone feminino da resistência à ditadura militar brasileira e da defesa dos direitos humanos, que morreu em junho de 2019, com 105 anos. Elzita repetia insistentemente a pergunta ‘Onde está meu filho?’, e dizia não ter medo de encontrar quem matou Fernando”. Ela queria ter o direito de enterrá-lo.
“É uma dor muito grande porque o único crime que Fernando cometeu foi defender a igualdade social, essas coisas pelas quais deveríamos lutar até hoje”, disse em entrevista ao Diário de Pernambuco em 2009″, acrescenta o IVH.
“Entre 1964 e 1985, graves crimes contra a humanidade foram perpetrados por agentes do Estado brasileiro. Seus autores, no entanto, nunca foram julgados e as circunstâncias de boa parte desses crimes seguem sem esclarecimento”, diz ainda o instituto. “A tarefa, ainda incompleta, de democratizar o país é indissociável dos deveres do Estado brasileiro de revelar a verdade sobre os crimes do período e de assegurar justiça a todos que sofreram com a violência de seus agentes. Ao tempo em que presta toda solidariedade ao presidente do Conselho Federal da OAB, o Instituto Vladimir Herzog exige que as autoridades responsáveis investiguem a fala do presidente da República e possam, finalmente, dar uma resposta aos familiares de Fernando Augusto Santa Cruz e à toda sociedade brasileira sobre mais este crime cometido durante a ditadura militar.”
“Fascista agressor”
O presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), Wellington Leonardo da Silva, repudiou o “fascista agressor” Bolsonaro. “As declarações sobre o assassinato do pai de Felipe Santa Cruz, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, praticado por meganhas das Forças Armadas à época da ditadura militar, deveriam merecer o maior nível de manifestações de repúdio da sociedade em todos os bairros dos estados brasileiros. Indignas de um ser humano, foram proferidas pelo atual ocupante da cadeira de presidente da República – ilegalmente usurpada da ex-presidenta Dilma Rousseff pelo ignominioso Michel Temer por meio de um golpe jurídico, midiático e parlamentar, levado a cabo pelos serviçais dos banqueiros, empresários e rentistas, nacionais e internacionais”, afirmou, em nota.
“A política de conciliação nos trouxe até aqui e me pergunto, estarrecido, até quando o povo brasileiro irá tolerar a construção da Bastilha nazista em nosso País, a qual está em curso, sem resistir à altura. Todo repúdio às declarações ignominiosas do fascista agressor”, acrescentou Silva.
Até mesmo um aliado do presidente da República, o governador paulista, João Doria (PSDB), criticou as declarações de Bolsonaro. “É inaceitável que um presidente da República se manifeste da forma que se manifestou em relação ao pai do presidente da OAB, Felipe Santa Cruz. Foi uma declaração infeliz”, afirmou, durante evento no Palácio dos Bandeirantes. “Não posso silenciar diante desse fato. Eu sou filho de um deputado federal cassado pelo golpe de 1964 e vivi o exílio com meu pai, que perdeu quase tudo na vida em 10 anos de exílio pela ditadura militar.”
Da RBA