PSL será o dono da maior fatia pública de verbas se Congresso aprovar
Nanico até o ano passado, o PSL de Jair Bolsonaro será o dono da maior fatia pública de recursos eleitorais e partidários no ano que vem, chegando a quase meio bilhão de reais caso o Congresso aprove a ampliação prometida para o fundo destinado aos candidatos.
As eleições para prefeitos e vereadores de todo o país, que ocorrerão em outubro de 2020, terão provavelmente o maior financiamento público da história. Se o Congresso aprovar neste segundo semestre o valor de R$ 3,7 bilhões para o fundo eleitoral —que em 2018 foi de R$ 1,7 bilhão—, os gastos públicos com as campanhas e os partidos vão ultrapassar R$ 5,6 bilhões.
Isso porque, além do fundo eleitoral, sairão dos cofres públicos verbas do fundo partidário —superior aos R$ 928 milhões deste ano—, além de deixarem de entrar no caixa da União impostos de emissoras de TV e rádio devido à isenção fiscal pela veiculação da propaganda eleitoral —algo em torno de R$ 1 bilhão.
Desde 1998, quando foi criado, até o ano passado, o PSL figurou como sigla nanica, de baixíssima representação parlamentar e popular. Com o ingresso de Jair Bolsonaro e aliados na legenda, no início de 2018, a sigla obteve estrondoso resultado nas urnas, tendo eleito o presidente e obtido a maior votação nacional para a Câmara dos Deputados.
Como o desempenho dos partidos na eleição para deputado federal é o que mais influencia o rateio das verbas públicas, o PSL sai de um financiamento público de R$ 17,5 milhões em 2018 (fundo eleitoral e partidário) para uma projeção de R$ 480 milhões em 2020 —crescimento de 2.644%.
O partido de Bolsonaro está no centro de investigações da Polícia Federal e do Ministério Público após a Folha revelar um esquema de candidaturas laranjas em Minas Gerais, estado do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, e em Pernambuco, terra do presidente nacional da sigla, Luciano Bivar.
A suspeita é a de que o partido tenha lançado candidatas de fachada (devido à cota feminina de 30%) com o intuito de desviar essas verbas para outros candidatos ou para proveito próprio.
A sigla também está entre as que mais elevaram o número de filiados, proporcionalmente, conforme a Folha mostrou em junho —entre janeiro e abril de 2019, o PSL ganhou 31 mil novos filiados (crescimento de 13%).
Pelas regras atuais, a destinação de praticamente todo o dinheiro dos fundos eleitoral e partidário (dessa segunda verba, nem tudo vai para as eleições) ficará a cargo da cúpula do partido.
Em 2018, o diretório nacional do PSL delegou a decisão sobre a distribuição ao então presidente interino da sigla, Gustavo Bebianno, que em 2019 virou ministro da Secretaria-Geral da Presidência.
Bebianno acabou demitido em fevereiro em meio à repercussão do caso dos laranjas do PSL —ele discutiu publicamente com Bolsonaro e com um de seus filhos, o vereador Carlos (PSC-RJ), ao dizer que o episódio não havia gerado uma crise no governo.
O PSL teve pouco menos de 10 mil candidatos a prefeito e vereador em 2016. Caso repetisse o número, e a distribuição do dinheiro projetado para 2020 fosse igualitária, cada um receberia R$ 48 mil para fazer campanha no ano que vem.
Em 2016, quase 500 mil pessoas se inscreveram como candidatas a um cargo eletivo. Caso esse número se repita e o financiamento público (exceto a isenção fiscal) chegue a R$ 4,6 bilhões, o custo público ficará em R$ 9.313 por candidato.
Os valores para os fundos eleitoral e partidário de 2020 serão definidos no segundo semestre deste ano na votação pelo Congresso da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e, depois, na do Orçamento para o ano que vem.
O relator da LDO, deputado Cacá Leão (PP-BA), propôs aumentar o fundo eleitoral dos R$ 1,7 bilhão de 2018 para R$ 3,7 bilhões em 2020. A medida conta com a simpatia do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
“Antes de discutir o financiamento das campanhas, é necessário buscar um modelo que reduza o custo da propaganda eleitoral”, afirma Henrique Neves, ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral.
Ele cita como exemplos a adoção de circunscrições menores ou voto apenas nos partidos, como acontece no modelo distrital misto.
“De qualquer forma, a propaganda eleitoral também deve ser vista pelo lado do eleitor, que tem o direito de saber quem são os candidatos e o que propõem. A ausência do financiamento faria com que apenas os candidatos ricos pudessem expor sua propaganda. Este, aliás, é um outro problema a ser enfrentado, para impor limite ao autofinanciamento”, diz Neves.
Ele faz referência a uma das brechas da legislação, a que permite aos candidatos financiar toda a sua campanha até o limite estabelecido para o cargo que disputam, o que desequilibra a pretendida igualdade na disputa.
Até 2014 o financiamento dos candidatos era bancado, em sua maioria, por grandes empresas, como empreiteiras e bancos.
Naquele ano, a gigante de carnes JBS foi a campeã de repasse de recursos para os candidatos, seguida pela construtora Odebrecht. Ambas foram, depois, foco de escândalos de corrupção que envolveram a suspeita de repasse de propina a agentes públicos travestida de ajuda eleitoral.
Em 2015, o STF (Supremo Tribunal Federal) proibiu que empresas financiem as campanhas sob o argumento de que a prática viola os princípios democráticos da igualdade de forças na disputa, representando captura do processo político pelo poder econômico.
Daí em diante os candidatos tiveram que recorrer a recursos públicos, dinheiro próprio (autofinanciamento) ou doações de pessoas físicas, prática que ainda não decolou no país.
Em 2018, o financiamento público ficou em cerca de R$ 3,6 bilhões (incluindo R$ 1 bilhão de renúncia fiscal).
Um ministro do STF que falou com a Folha sob a condição de anonimato afirmou considerar perene o debate sobre o financiamento das campanhas, até porque o caso dos laranjas mostra, segundo ele, que a proibição das doações empresariais não estanca os casos de corrupção.
Da FSP